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Despretensiosos e singelos: é assim que vejo minhas crônicas e meus contos. As crônicas retratam pedaços da minha vida; ora são partes da ...

sexta-feira, 31 de maio de 2019

Crônica - Padres, freis e freiras


Miguel Hidalgo y Costilla era acadêmico, estudioso do iluminismo e defensor dos pobres e explorados. Ordenou-se padre da igreja católica e participou ativamente da guerra travada contra os colonizadores espanhóis. Liderou grande parte do exército mexicano na luta pela Independência do seu povo.

Outro bravo guerreiro foi o também mexicano Maria Morelos. Quando jovem, ganhava a vida como negociante de animais; só mais tarde se ordenou padre pela igreja católica. Comandou e ganhou ao menos três grandes batalhas, libertando muitos territórios do jugo real. Declarou o catolicismo como religião oficial do seu país e decretou a igualdade entre espanhóis e mexicanos, entre índios e mestiços.
Hidalgo e Morelos tiveram em comum algo mais do que a batina e a luta pela Independência da América: ambos foram presos e fuzilados pelo exército realista. Morelos, em 1811; Hidalgo, em 1815.
No Brasil, tivemos ao menos um padre que queria a independência de Portugal, José da Silva Oliveira e Rolim. Vivendo entre Diamantina e o Serro Frio, foi companheiro de Tiradentes. Levado de cambulhada na delação de Joaquim Silvério dos Reis, Padre Rolim livrou-se da forca e foi deportado para Lisboa, onde ficou por 15 anos.
Outros religiosos viriam depois dele. Uns, no campo ou em pequenas cidades, no norte do país; outros, em grandes metrópoles.
Padre Josimo Tavares era Coordenador da Pastoral da Terra, no Bico do Papagaio, no Pará: tombou com dois tiros nas costas, em 10 de maio de 1986. Irmã Doroth Stang, norte-americana, fazia trabalhos missionários junto aos pequenos agricultores em Anapu, também no interior paraense: alvejada com seis tiros, morreu em 12 de fevereiro de 2005. Ambos defendiam trabalhadores, denunciavam a opressão dos latifundiários e pregavam pela reforma agrária. Ambos foram assassinados por fazendeiros, ou a mando deles.
Conheci Frei Betto, da Ordem dos Dominicanos, em 1979, em uma entrevista para um trabalho na Universidade. Frei Betto nos recebeu com amabilidade no Convento da Rua Caiubi, nas Perdizes, capital paulista. Foi econômico nas palavras; simpático e bem receptivo, não quis responder algumas perguntas para não perder o impacto da obra que estava escrevendo, Batismo de Sangue.
Mesmo assim Frei Betto falou sobre as desventuras vividas com seus companheiros de hábito, Frei Tito, Frei Ivo e Frei Fernando. Todos foram presos e torturados no DOPS de São Paulo, pelas mãos do violento delegado Fleury; quinze meses de cárcere e de torturas.
Frei Tito foi o mais castigado e jamais se esqueceria das torturas que lhe foram dispensadas. Destroçado física e psicologicamente, sofrendo de alucinações constantes, foi levado pelos seus confrades ao interior da França. Em Lyon, numa manhã de agosto de 1974, encontraram o seu corpo, balançando na copa de um álamo: esse cearense, então com 29 anos de idade, encontrou no enforcamento um modo eficaz de, enfim, se livrar do torturador.
Frei Fernando morreu recentemente, em março de 2019. Morreu de morte natural, mas sou capaz de apostar que também carregou seus fantasmas até o túmulo.

3 comentários:

  1. Triste fim dos que negam a si mesmos em favor de uma causa!!
    Mas não se acovardaram diante dos seus ideais, por isso estão presentes e são constantemente lembrados!
    Parabéns pelo texto

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  2. Ezio uma delícia conhecer através de suas palavras um pouco mais da história de pessoas tao importantes que vão ficando invisíveis pelo meio do caminho da história... Obrigada !

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    1. Obrigado, Kátia. Um grande abraço para você. Apareça sempre.

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