XADREZ LEGAL
O lúdico no aprendizado
do processo civil
NOTAS DO AUTOR
Este texto foi produzido
no correr de 2018 e ficou engavetado até agora, por absoluta falta de tempo
para as revisões que se faziam – e algumas ainda se fazem – necessárias.
Resolvi agora, enfim, compartilhar a ideia de juntar duas ciências amplamente difundidas na história da humanidade, o xadrez e o direito, com finalidades pedagógicas e didáticas. Aqui está o projeto intitulado Xadrez Legal: nasceu simples e despretensioso, nos saguões da PUC Minas/Poços de Caldas, e se mostra viável como método para aprendizagens várias.
Entendo que, com as
peças e um tabuleiro de xadrez, mais um exemplar da Constituição Federal e do
Código de Processo Civil, é possível trabalhar e entender todo o conjunto de
atos que são necessários para as atividades enxadrísticas e para a criação e
manuseio do processo judicial. É possível compreender a realização de atos
enxadrísticos e atos processuais, cada um de per si, bem como compreender a
formação do conjunto desses mesmos atos, que vão formando fases distintas e
sequenciais, seja no xadrez, seja no processo, em busca de um fim único: a
vitória sobre o oponente.
A partir de uma
atividade lúdica, como é o enxadrismo, fica fácil entender e exercitar as artes
processuais, com a compreensão das estratégias e das táticas que serão
empregadas pelo jogador, ou pelo advogado, conforme o caso.
Deixo agradecimentos aos
meus alunos, que deram vida ao projeto; são muitos e não teria como nominá-los
sem cometer injustiças por eventuais esquecimentos. Também agradeço meus colegas da PUC Poços de Caldas, especialmente ao Professor
Iran Calisto Abrão, Pró-reitor, pelos incentivos que impulsionaram o projeto, e
à Professora Teresa Alvisi, que não mediu esforços para a sua divulgação nos
eventos de extensão.
Ezio Frezza Filho, em
Poços de Caldas, 30 de agosto de 2022.
SUMÁRIO
1. XADREZ E
PROCESSO
2.
GLOSSÁRIO, MATERIAL, DISPOSIÇÃO E MOVIMENTAÇÃO DE PEÇAS
3. SISTEMAS
DE NOTAÇÃO DE PARTIDAS
4.
GLOSSÁRIO, FORMAÇÃO E FORMALIDADES DO PROCESSO
5.
FUNDAMENTOS TEÓRICOS
6.
DEFINIÇÕES
7.
SINGULARIDADE OU PLURALIDADE DE PARTES
8. ÁRBITRO
E JUIZ
9.
VIRTUALIDADE
10. TEMPO,
XADREZ E PROCESSO
11. ATOS
PROCRASTINATÓRIOS
12.
INDUMENTÁRIA E CONDUTA
13.
OBJETIVOS
14. AUTOCOMPOSIÇÃO
15.
CONVENÇÕES E NEGÓCIOS
16. FASES
DO JOGO, FASES DO PROCESSO
17.
PLANEJAMENTO, ESTRATÉGIAS E TÁTICAS
18.
GEOMETRIA E CÁLCULOS
19. CRIAÇÃO
CIENTÍFICA
20.
APONTAMENTOS FINAIS
21. SOBRE O
AUTOR
1. XADREZ E
PROCESSO: paralelos e pontos de contato
Entre estas duas
instituições milenares, Xadrez e Processo, é possível encontrar pontos de contato,
com semelhança conceitual e procedimental, bem como pontos em paralelo. Procurar
esses pontos é uma tarefa divertida e instrutiva, que a tanto podem se dedicar
os amantes do xadrez e os estudiosos do processo. Uns e outros encontrarão, neste
fazer, verdadeiras e agradáveis surpresas.
Entender o xadrez,
compreender suas estratégias, seus cálculos, a harmonia das peças, as táticas
empregadas em busca das vitórias, tudo isso colabora com o aprendizado do
processo. De outro lado, entender o processo, compreender suas estratégias,
seus cálculos, a harmonia dos seus atos e as táticas empregadas pelo operador
do direito em busca do sucesso na decisão final, tudo isso colabora com o
aprendizado do xadrez. Estudos e teorias constroem e aprimoram o xadrez e o
processo. Ambos se inter-relacionam: amantes do xadrez haverão de se lembrar do
processo; estudiosos do processo haverão de se lembrar do xadrez.
Ambos devem seguir regras
rígidas, sob pena de não se praticar nem o xadrez e nem o processo. Composição
do tabuleiro, disposição e movimentação das peças, atos lícitos e ilícitos,
tudo isso é regulado pela legislação da FIDE – Federação Internacional de
Xadrez; petição inicial apta, citação, respostas do réu, enfim, todos os atos
do processo são disciplinados pela legislação constitucional e
infraconstitucional processual. Doutrinas, manuais práticos e partidas anotadas
auxiliam os estudiosos do xadrez, enquanto que as doutrinas, os manuais e os
repositórios de jurisprudência auxiliam os processualistas. São ferramentas que
ajudam a compreender os fundamentos teóricos do xadrez e do processo.
Princípios, regras e normas, eis os fundamentos e as fontes legais para essas
duas ciências milenares.
Entre os contendores, no
processo e no xadrez, não há hierarquias; uns e outros, juntamente com o juiz,
no processo, e com o árbitro, no xadrez, são essenciais para a obtenção de
resultados democráticos e justos, mediante a prática de atos bilaterais,
observados o contraditório, a ampla defesa e o tratamento isonômico entre todos
os personagens de cada uma dessas atividades.
Diante do tabuleiro e do
processo, é essencial o raciocínio concentrado e cuidadoso; o conhecimento das
terminologias próprias, a prática de atos e movimentos solenes e corretos, como
frutos de prévia reflexão, são quesitos importantes a serem observadas por
enxadristas e processualistas. Praticado o ato, efetuada a jogada, ou, como
queira, protocolada a petição e praticado o ato judicial, não mais se volta
atrás, com raras e especialíssimas exceções.
As partidas podem envolver
dois jogadores, o que é mais costumeiro. Mas, também ocorrem partidas entre
três ou mais jogadores ao mesmo tempo: são as partidas de duplas, dois contra
dois, ou, então, partidas em que as duplas usam dois tabuleiros, como ocorre no
xadrez australiano. Também são comuns as simultâneas, em que um jogador, hábil
e de força superior, enfrenta vinte, trinta ou mais adversários, realizando os
lances sucessivos em tantos tabuleiros quantos são os adversários – e, claro,
vencendo todos (ou quase todos) oponentes. Assim também ocorre no processo:
normalmente envolvendo duas partes, autor e réu, o processo por vezes apresenta
litisconsórcios, ativos e passivos, em que grupos de contendores se opõem entre
si, em múltiplas relações jurídicas simultâneas, por economia processual e
racionalidade dos atos judiciais.
Terceiros, como
assistentes e analistas, podem, conforme as circunstâncias, participar de uma e
de outra atividade. São pessoas que auxiliam os jogadores, nas partidas
suspensas, a encontrar os melhores lances de continuação do jogo; são, de outro
lado, pessoas que, por sua especialidade, auxiliam as partes e o próprio juiz
ou tribunal, como verdadeiros amicus
que contribuem para a realização da justiça, em sentido mais amplo.
Posturas adequadas são
exigidas de jogadores, juízes e árbitros, assim como das partes e de todos os
que operam no âmbito do poder judiciário e no âmbito do xadrez. Nestas duas
esferas de relações humanas, é necessária conduta profissional e ética, com
respeito ao adversário e boa-fé na prática dos atos; cada qual com seus
direitos e deveres, com suas obrigações e prerrogativas, sempre em busca de uma
solução final adequada aos interesses de cada um: seja uma sentença de mérito
favorável, seja uma vitória e a conquista de um título numa competição
enxadrística.
Tal como ocorre no
processo eletrônico, em que os três personagens, juiz – autor – réu, se
relacionam virtualmente, também o xadrez vem sendo praticado virtualmente, sem
o tête-a-tête dos contendores. Cada
vez mais justiça e direito são realizados à distância, bens de vida são protegidos
por meios virtuais; torneios e campeonatos são disputados, igualmente, à
distância, em competições nacionais ou internacionais, que contam com grandes
mestres ou iniciantes.
Tanto nas artes enxadrísticas
quanto nas artes processuais, o que se quer é a duração razoável do evento, de
modo a se evitar partidas e processos intermináveis. O objetivo final do
processo é a sentença de mérito, que ampare o direito da parte, seja como
remédio para o ato lesivo, seja como prevenção, de modo a evitar a lesão que se
avizinha; no xadrez, luta-se pela vitória final, que ocorre por xeque-mate ou
por abandono do adversário que se acha em posição desfavorável. Em um e em
outro campo, a luta se desenvolve com objetivos claros e pré-determinados. Todavia,
não raro ocorrem empates: no xadrez, por mútuo consentimento ou pela situação
das peças; no processo, por mútuo consentimento ou por sucumbência recíproca,
em que as partes são parcialmente e, ao mesmo tempo, vencedoras e vencidas.
Enfim, uma partida de
xadrez é composta de fases distintas, que se realizam em sequência lógica, umas
em relação às outras que as antecedem. Assim é que vamos encontrar uma fase
inicial, de abertura, em que os jogadores desenvolvem as peças e procuram o
domínio do centro do tabuleiro; depois, uma fase de meio jogo, em que as peças
são dispostas harmonicamente em busca do xeque-mate; por fim, uma fase de final
de jogo, momento em que o rei adversário é ferido de morte e a partida se
encerra. Tais fases também são encontradas no processo: uma fase inicial, de
abertura, em que as partes apresentam suas postulações, expondo a causa de
pedir e o pedido; depois, as respostas do réu para, em sequência, haver o
saneamento dos vícios eventualmente presentes; depois, uma fase de
desenvolvimento, com a realização das provas, com as partes sedimentando os
caminhos para a vitória final. Por fim, uma fase decisória, em que a sentença
de mérito é proferida pelo juiz, que a produz conforme o conjunto probatório
dos autos, solucionando o conflito de interesses.
A vitória final quase
nunca vem por mero acaso ou por acidente, senão que depende de um bom
planejamento estratégico e tático, da boa prática de atos cronológicos e
lógicos entre si. Os primeiros lances do xadrez são efetuados conforme o
planejado pelo jogador, que inicia já sabendo qual é a abertura que vai realizar
e, mais, qual é a defesa que vai utilizar em face das pretensões do adversário;
no decorrer da partida, as estratégias vão se transformando em lances
sequenciais, conforme estudos adrede realizados. Por vezes, lances táticos,
inovadores, são realizados, para surpresa do adversário. Assim também ocorre no
processo: autor e réu atuam conforme planejamentos prévios, tanto para dedução
das pretensões, quanto para as defesas que o réu vai apresentar; também a
produção de provas e as contraprovas são frutos de ações cuidadosamente
planejadas pelo advogado. São atos praticados em obediência a um plano prévio;
porém, não raro, algumas táticas são apresentadas, como, por exemplo, a
dispensa desta ou daquela prova, a adoção deste ou daquele procedimento, enfim,
situações de momento que podem surpreender o ex adverso.
Processualistas e
enxadristas muito contribuem com as ciências processuais e enxadrísticas. Novas
teses são constantemente encontradas, através das práticas, dos exercícios e
dos estudos cotidianos. Uns e outros exercem atividades criativas, são
fundamentais para a renovação do pensamento e para o desenvolvimento do mundo
que os cerca. Novas estratégias vão sendo criadas em substituições àquelas que
se mostram defasadas, tendo como objetivo uma maior eficácia de cada um desses
eventos de que tratamos aqui.
Nossa proposta é, pois,
trabalhar cada um desses aspectos, acreditando que a interação entre o lúdico e
o científico pode viabilizar uma melhor compreensão dessas duas ciências.
2. GLOSSÁRIO, DISPOSIÇÃO E MOVIMENTAÇÃO DAS PEÇAS: noções gerais de xadrez
O xadrez é praticado com
um tabuleiro quadrado, com oito casas de cada lado, num total de 64 casas, de
cores brancas pretas, alternadas. Esse tabuleiro deve ser montado com a
primeira casa branca à mão direita dos jogadores, para permitir a correta
colocação das peças. Cada jogador faz uso de oito peões e de oito peças, ou
seja, duas torres, dois cavalos, dois bispos, um rei e uma dama. Peões não são
chamados de peças, expressão que serve para torres, cavalos, bispos, dama e
rei; as ideologias dominantes e excludentes da nossa sociedade explicam essa
terminologia.
O tabuleiro se compõe de
FILEIRAS e COLUNAS (figura 1):
as fileiras são formadas pelas oito casas horizontais imediatamente à frente do
jogador, identificadas de 1 a 8, sempre a partir do jogador de brancas; as
colunas correspondem ao conjunto oito casas verticais, identificadas da letra a
até a letra h, da esquerda para a direita, também a partir do jogador de
brancas. Usando as coordenadas, cada casa terá identificação própria, conforme
a1, b2, c3, d4 e assim sucessivamente.
|
Figura 1 |
Observe as DIAGONAIS que se formam da casa h1 até
a casa a8, chamada de grande diagonal branca, e da casa a1 até a h8, a grande
diagonal preta. A partir destas diagonais é possível visualizar dois triângulos
grandes e vários menores, a partir das diagonais para a casa do ângulo reto.
ARRANJO DO TABULEIRO: Olhando o tabuleiro pela ótica do jogador de
brancas, as peças serão dispostas da seguinte maneira: a torres ocupam as casas
angulares da primeira fila; ao lado delas, vêm os bispos, seguidos dos cavalos;
rei e dama ocupam as duas casas que restam nesta primeira fila: a dama ocupa a
casa da sua cor e o rei se acomoda na última casa restante: em resumo, dama
branca na casa branca, rei branco na casa preta. Logo adiante destas peças, na
segunda fila, encontram-se os peões.
Do outro lado do
tabuleiro, as peças e peões pretos são dispostos em correspondência com o
material das brancas: torres, cavalos, bispos, damas, reis e peões ficam frente
a frente. Dividindo hipoteticamente o tabuleiro ao meio, vamos encontrar duas alas
distintas, que formam dois retângulos de 4 por 8 casas, a partir da primeira
fileira: do lado direito, a ALA DO REI;
do lado esquerdo, a ALA DA DAMA.
As fileiras são contadas a partir da perspectiva do jogador de brancas, da primeira até a oitava fila; as peças brancas ficam na primeira fila, os peões brancos ficam na segunda fila, os peões pretos ficam na sétima fila e, por fim, as peças pretas ficam na oitava e última fila, conforme figura 2:
Figura 2
MOVIMENTAÇÕES: com exceção do CAVALO, peças e peões não saltam sobre
outra; apenas caminham pelas casas vazias. O PEÃO, apenas para frente, casa por casa, com exceção do seu
primeiro movimento: da casa inicial, pode andar uma ou duas, conforme queira o
jogador. Todas as peças vão e voltam, menos o peão, que pode marchar até a 8ª
casa da sua coluna, sempre em frente, como indica a seta verde na figura 3, abaixo; peões e peças na sua frente, na mesma coluna, apenas
bloqueiam sua passagem:
O CAVALO é a única peça que pode saltar sobre outras, adversárias ou não. Saltam em forma de “L”, um “L” de duas casas por três, ou de três casas por duas, conforme figura 4, abaixo
Figura 4
Nos diagramas abaixo estão os movimentos de rei, torre, bispo e dama. A TORRE anda para a frente e para trás,
de um lado e do outro, até a casa vazia escolhida; o BISPO transita pelas diagonais do tabuleiro. A DAMA reúne os movimentos da torre e do bispo, caminhando tantas
casas quantas se acharem livres a sua frente; por isso, é a peça mais poderosa
de cada exército. O REI tem a mesma
movimentação da dama, porém, de modo restringido: caminha apenas de casa em
casa, lentamente, tal como um lento monarca. Os diagramas apresentados na figura 5, abaixo, ilustram estas movimentações:
Figura 5
Ainda sobre o rei:
jamais essa peça poderá se colocar sob ataque de peça ou peão adversário. Rei
jamais poderá ficar sob ataque e nem se colocar sob ataque. Rei jamais poderá
encostar no rei adversário, pelas razões que serão vistas mais abaixo, quando
tratarmos do xeque e do xeque-mate.
Bispos de casa branca
jamais alcançam casas pretas; os de casas pretas, jamais alcançam casas
brancas. Cavalos sempre passam a ocupar casas de cor diferente daquelas de
origem. Torres, damas e reis, ao contrário, podem, a critério de cada jogador,
alcançar casa de cor diferente da de origem, nos limites de sua movimentação. Bispos,
torres e damas jamais se movimentam em curva: ou bem andam pelas diagonais, ou
bem andam por colunas e fileiras.
A captura, ou tomada de
peças (nunca use “comer” peças) se dá pela retirada da peça adversária que se
encontrava na casa de destino daquela que se movimentou – recordando que peão
anda para a frente, mas captura em diagonal).
A par desses movimentos
comuns obrigatórios, existem MOVIMENTOS
ESPECIAIS, que podem acontecer durante o jogo: o roque, a captura en passant e a promoção do peão. O ROQUE consiste na movimentação do rei e
da terra num mesmo lance – é a única ocasião em que o mesmo jogador move duas
peças: primeiro o rei caminha duas casas para o lado direito ou para o lado
esquerdo, na mesma fileira, enquanto que, ato contínuo, a torre, passando sobre
ele, ocupa a casa imediatamente ao seu lado.
O roque só pode ser
efetuado quando: rei e torre ainda não foram movimentados; entre o rei e a
torre não houver qualquer outra peça; o rei não estiver em xeque; o rei não
passar por casa sob ataque de peão ou peça adversária. O roque efetuado na ala
do rei é chamado de ROQUE PEQUENO,
ou MENOR, enquanto que o efetuado na
ala da dama é chamado de ROQUE GRANDE,
ou MAIOR, por conta do espaço menor
ou maior existente entre rei e torre.
O roque é uma proteção
que se faz para o rei, funcionando com um verdadeiro escudo real, deixando-o
menos exposto aos ataques do exército adversário. No diagrama abaixo, figura 6, vemos o
roque maior, à esquerda do rei; a partir dele, concluímos que o roque menor é
feito do lado oposto, à direita do tabuleiro.
Figura 6
O peão, que pode avançar duas casas, no primeiro movimento e a partir da
casa inicial, poderá ser capturado de passagem por um peão adversário. EN PASSANT significa de passagem, que
pode ocorrer por opção do jogador que faz a captura, não sendo lance
obrigatório. Nesse caso, o peão que captura passa a ocupar o lugar que o peão
inimigo ocuparia se tivesse caminhado apenas uma casa. Todavia, essa opção só pode ser exercida na
imediata sequência de lances; passada esta oportunidade, não mais se admite a
captura en passant. Não fosse esse
movimento especial, o peão que avança duas casas não poderia ser capturado pelo
peão adversário que está na coluna do lado, em diagonal. Justamente para evitar
essa impossibilidade de captura é que foi criado esse movimento, conforme
abaixo, figura 7:
Figura 7
O peão também é
protagonista de outro lance excepcional: tendo em vista que não pode se
movimentar para trás (relembrando, é a única peça que não pode voltar), ao
atingir a oitava fileira, fatalmente estaria imobilizado se não houvesse a sua PROMOÇÃO, quer dizer, se não pudesse se
transformar em qualquer outra peça, com exceção do rei. É isso: ao alcançar a
oitava fila, o peão deve se transformar em torre, bispo, cavalo ou dama. Dada a
sua importância, normalmente o jogador prefere promover o peão a dama, mas nem
sempre isso é recomendável, conforme a posição das peças sobre o tabuleiro.
XEQUE E XEQUE MATE:- a palavra xeque deriva do árabe xãh e
do persa xah, de onde vem xeique, líder ou governante de um povo, de uma
cultura ou tribo. No xadrez significa ataque direto ao rei, perpetrado por peça
adversária; nesse caso, é obrigatório que se retire o rei da mira do atacante,
ou seja, é obrigatório que o rei saia do xeque, seja se deslocando para outra
casa não atacada pelo adversário, seja pela colocação de uma peça que se lhe anteponha,
protegendo-o do ataque direto. Rei nunca pode permanecer em xeque, e nem,
jamais, pode se colocar em xeque – sob pena de cometimento de lance irregular. Quando
não for possível retirar o rei do ataque, por falta de casa para se mover ou porque
nenhuma peça se lhe pode antepor, então dizemos que o rei está morto, por ter
recebido o xeque-mate – morte ao rei, em suma, é o que se pretende com esse
jogo. Lembre-se, também: rei nunca, jamais, pode ser capturado; rei é morto!
Dentre os enxadristas mais experimentados, o xeque-mate é antevisto, cinco,
oito ou dez lances antes do desfecho fatal – e então o jogador reconhece a
derrota, derruba simbolicamente o seu rei e cumprimenta, educadamente, o
adversário; é desse modo que se evitar o constrangimento do xeque-mate.
Em relação ao VALOR DAS PEÇAS, cada qual recebe uma
pontuação, a partir de suas casas iniciais: o cavalo e o bispo valem 3 pontos
cada um; a torre vale 5 pontos e a dama, peça mais importante da partida, por
seu maior raio de ação, vale 10 pontos. Por fim, cada peão vale 1 ponto. Essa
pontuação é muito relativa, sofrendo mudanças ao longo da partida: conforme a
configuração das peças, por vezes é mais importante um peão do que uma torre,
ou um bispo, ou, ainda, uma dama. Basta pensar na possibilidade de imediata
promoção do peão que, transformado em dama, certamente compensará a perda de
outro material. Também há divergência acerca do valor de cavalo e bispo: há
quem afirme que o bispo vale 3,5 pontos, ou seja, um pouco mais do que o cavalo,
porque tem maior raio de ação em seus movimentos.
Por fim, muito
importante é dominar a terminologia enxadrística para evitar o uso indevido de
palavras. Exemplificando, no Brasil não se usa Rainha, mas DAMA, para que não se faça confusão das abreviaturas: R para REI e D para Dama.
Também, relembrando, não se a expressão “comer” peça do adversário, mas se faz
a sua captura, ou tomada; jamais se captura o Rei adversário, ele simplesmente
é morto por impossibilidade de se safar de ataque inimigo. Assim também
Rei não dá xeque, jamais, pois nunca pode se encostar no Rei adversário; XEQUE PERPÉTUO leva ao empate, por
repetição de ataques, e não à vitória do atacante. No xadrez, não sendo jogo de
azar, não se deseja boa sorte ao adversário, pois a vitória depende, acima de
qualquer coisa, de estudos e de reflexões. Enfim, o jogo de xadrez não é igual
o jogo de damas; são jogos absolutamente diferentes – aliás, a melhor coisa é
simplesmente esquecer o jogo de damas, sem nenhum demérito, mas apenas para que
não se façam confusões prejudiciais ao desenvolvimento do enxadrismo.
SISTEMA DE CAPTURAS:- a captura de peças adversárias, ou tomada de
peças (nunca use “comer” peças) se dá pela retirada da peça adversária que se
encontrava na casa de destino daquela peça que fez a captura – recordando que
peão anda para a frente, mas captura em diagonal. Isso ocorre porque as peças
atacam umas às outras, conforme se colocam no caminho do seu movimento; a ideia
é ganhar peças do adversário e conquistar território, em busca do xeque-mate. Observe, na figura 8, abaixo, que a dama branca pode capturar o cavalo preto, assim como as torres podem capturar uma à outra, conforme seja a vez de quem joga; o bispo pode branco pode capturar a torre preta. Observe, também, que se a dama branca capturar o cavalo preto, de sua vez poderá ser capturada pela torre preta, e assim sucessivamente.
3. SISTEMAS DE NOTAÇÃO DE PARTIDAS: descrição dos lances e simbologia
O xadrez é um jogo que
permite notação das partidas, através de vários sistemas, e por isso podemos
reproduzir e estudar jogadas que foram feitas há centenas de anos atrás. Aliás,
cada jogador poderá, a seu critério, anotar as partidas que joga para,
posteriormente, estudá-las a fim de corrigir eventuais erros praticados,
aprimorando, assim o seu desempenho particular.
Os dois sistemas de anotação mais conhecidos são
o SISTEMA DESCRITIVO e o SISTEMA ALGÉBRICO. O sistema descritivo
deixou de ser usado atualmente, mas é encontrado em abundância nos livros mais
antigos e fora de catálogo.
Para entender o SISTEMA
DESCRITIVO, é necessário recordar o tema do capítulo 2, que traz as noções
de colunas, fileiras e alas. Feito isso, veremos que cada coluna recebe um nome
conforme disposição inicial das peças no tabuleiro: coluna da torre do rei, ou TR, coluna do Cavalo do Rei, ou CR, coluna do bispo do rei, ou BR, coluna do rei, ou R, coluna da dama, ou D, e assim sucessivamente, até a coluna
da torre da dama, ou TD. Agora basta
agora numerar, mentalmente, cada uma das casas de cada coluna, de 1 a 8, a
partir de cada jogador: e então teremos 1TR,
2TR, 3TR, até a 8TR. Como
cada jogador faz isso a partir do seu ponto de vista, a casa 1TR das brancas corresponderá à casa 8TR das pretas.
A partir daí, a movimentação será indicada pelo nome da
peça, abreviado, e a casa de destino, conforme diagrama:
Por esse diagrama vemos
que as brancas movimentaram o seu peão do rei (PR) e os dois cavalos, enquanto que as pretas movimentaram o peão
do rei (PR), o peão da dama (PD) e o cavalo da dama (CD), nessa ordem. Assim,
teremos a seguinte descrição:
1.
P4R P4R
2.
C3BR P3D
3.
C3B C3BD
No caso do lance 3 das
brancas, não houve necessidade de indicar o nome completo da casa de destino
pois só pode ser mesmo a do bispo da dama, em vista de que a do bispo do rei já
estava ocupada anteriormente.
Já no SISTEMA ALGÉBRICO, cada casa recebe denominação única, para os dois
jogadores, considerando o sistema de coordenadas que se faz entre a numeração
das colunas e a indicação de letras para as fileiras, conforme diagramas antes
expostos. Por esse sistema algébrico, as movimentações do tabuleiro anterior
seriam anotadas do seguinte modo:
1.
e4 e5
2.
Cf3 d6
3.
Cc3 Cc6
No caso de lance de peão não é necessário apontar a letra inicial,
bastando apenas dizer para onde vai o peão; observe que também não é necessário
dizer de onde vem a peça, a menos que duas peças, de locais distintos, possam
ocupar a mesma casa de destino. Todavia, como se trata de aprendizado mais
complexo, nossa sugestão é que o leitor inexperiente busque ajuda nos manuais
que serão fartamente indicados neste texto.
Ainda quanto às anotações, há que destacar
a simbologia usada em comum pelos diversos sistemas para fins de notação
gráfica das partidas:
++ e # significam xeque-mate ep significa en
passant ! significa lance bom !! significa lance excelente ? significa lance ruim ?? significa lance muito ruim !? significa lance interessante ?! significa lance duvidoso X significa captura de peça |
0-0 significa
roque pequeno 0-0-0 significa roque maior ½ e = significam empate 1-0 significa vitória das brancas 0-1 significa vitória das pretas anotação de lance peão seguido do sinal
= significa promoção do peão; nesse caso, há que se acrescentar a inicial da
peça a que o peão foi promovido, como g8=D |
4. GLOSSÁRIO, FORMAÇÃO E FORMALIDADES DO PROCESSO: noções
gerais do processo civil
No processo de
conhecimento, que é destinado à cognição e julgamento da causa, as partes são
denominadas AUTOR (polo ativo) e RÉU (polo passivo). O processo nasce,
se abre, através de uma PETIÇÃO INICIAL
(art. 319), ou seja, uma petição que inicia as atividades jurisdicionais.
Esta petição será, em regra, escrita e subscrita por um advogado, o que detém a
CAPACIDADE POSTULATÓRIA, isto é, o
que está inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil. Por exceção, é possível
petição inicial oral e sem a presença de advogado: é o caso das ações propostas
nos Juizados Especiais, em causas cujo valor não ultrapasse 20 salários
mínimos, quando o próprio interessado deduzirá suas pretensões verbalmente.
Um alerta de suma
importância: todos os dispositivos legais que vamos encontrar no presente
trabalho se referem ao Código de Processo Civil instituído pela Lei 13.256/15; quando for o caso,
indicaremos nominalmente uma ou outra legislação que seja necessária, para evitar
equívocos.
Os arts. 319 e 320 do Código de Processo Civil trazem requisitos
específicos e indispensáveis para a redação da petição inicial: no art. 319, estão os REQUISITOS INTRÍNSECOS, enquanto que no art. 320 estão os requisitos EXTRÍNSECOS, os que vêm fora da petição,
consubstanciados nos documentos indispensáveis para a propositura da ação.
Cabe ao advogado manusear adequadamente cada
um desses requisitos legais, de maneira a que a petição se torne apta a
produzir os efeitos desejados, qual seja, o de levar o conflito de interesse ao
conhecimento e julgamento do Poder Judiciário. Observar-se-ão, um a um, os
requisitos em comento: endereçamento da petição pra o juízo desejado, conforme
a COMPETÊNCIA (art. 42) do órgão
para solucionar o conflito; a indicação do nome completo das partes, autor e
réu, com suas qualificações e endereços respectivos; a indicação do pedido e da
causa de pedir, quer dizer, a indicação da pretensão deduzida em juízo e os
fundamentos, as causas, desse pedido; a indicação das PROVAS (art. 369) que serão feitas pelo autor, em abono dos fatos
que alega em juízo; o VALOR DA CAUSA
(art. 291), que não é necessariamente o valor do pedido; por fim, a
indicação do desejo de participar, ou não, da audiência de conciliação ou de
mediação, em que as partes terão oportunidade de buscar solução amigável para o
conflito judicializado.
Esta petição inicial,
acompanhada do comprovante de pagamento das custas judiciais, passará pela DISTRIBUIÇÃO (284) e será encaminhada
ao juízo respectivo, que fará a análise os requisitos dos arts. 319 e 320,
citados – esse é o chamado JUÍZO DE
ADMISSIBILIDADE, cabendo ao magistrado determinar EMENDA (art. 321) da petição caso um deles não seja encontrado.
A parte autora poderá,
ainda, fazer ADITAMENTO (art. 329) da petição inicial,
acrescentando fatos, fundamentos jurídicos e pedidos, enquanto o réu não for
citado; depois da citação, o autor só poderá fazer esses aditamentos se o réu
assim consentir. Por aditamento também se entende a retirada, ou supressão, de
fundamentos ou de pedidos.
O PEDIDO (art. 322) nada
mais é do que a pretensão que o autor deduz em juízo, é o objeto da lide; por
pedido se entende o bem de vida que o autor quer ver protegido em juízo, bem de
vida esse que foi ofendido, lesado, pelo réu. Há uma variada gama de pedidos a
serem feitos, conforme o caso concreto, inclusive a cumulação deles em uma
única petição inicial.
Na sequência, o réu
recebe a CITAÇÃO (art. 238), que é o
ato pelo qual se lhe dá conhecimento da ação proposta pelo autor e que completa
a RELAÇÃO JURÍDICA entre os três
personagens do processo: autor, juiz e réu. Junto com a citação, ocorre também
a INTIMAÇÃO (art. 269) do réu para
que compareça à AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO
OU MEDIAÇÃO (art. 334), evento destinado à autocomposição das partes. Não
havendo autocomposição, aberto estará o prazo de 15 dias para o réu apresentar,
se quiser, RESPOSTAS: em outras
palavras, poderá apresentar CONTESTAÇÃO
(art. 335), impugnando as pretensões do autor, bem como RECONVENÇÃO (art. 343), deduzindo suas
próprias pretensões em face do autor.
Não apresentada qualquer
das respostas previstas, o réu será declarado REVEL (art. 344), caso em que poderá sofrer derrota logo no início
do processo. Findo o prazo para apresentação das respostas do réu, o processo
seguirá para as PROVIDÊNCIAS
PRELIMINARES E SANEAMENTO (art. 347), ocasião em que o juiz abrirá
possibilidades para o autor impugnar as alegações trazidas pelo réu em suas
respostas e eventualmente corrigir, ou sanar, os vícios que se apresentam na
relação jurídico-processual – é que se chama de BILATERALIDADE DO PROCESSO.
O Código de Processo
Civil, privilegiando os PRECEDENTES
(art.927, § 5º), permite que o juiz, nas causas em que não é necessária a
fase probatória, julgue liminarmente improcedência o pedido, sem citação do
réu. Isso quer dizer que os pedidos que se referem a temas já decididos
anteriormente pelos tribunais não terão nova cognição plena; receberão julgamento
de IMPROCEDÊNCIA LIMINAR (art. 332),
com derrota do autor já na abertura do processo. Trata-se de medida capaz de
gerar economia de atos processuais e de conferir agilidade às decisões do
Judiciário; ademais disso, permite integridade e uniformização das decisões
judiciais.
A esse conjunto de atos
que nos referidos até aqui se dá o nome de FASE
POSTULATÓRIA, ou de ABERTURA do
processo, que nada mais é a fase de abertura do processo, em que as partes
deduzem das suas pretensões e indicam os caminhos que o processo haverá de
seguir, na sequência. É uma fase extremamente delicada do processo na medida em
que a própria atividade jurisdicional estará condicionada a ela; quer dizer, as
providências e as decisões do juiz deverão vir em consonância com o que as partes
postularam nesta fase. Assim, é correto dizer que a postulação condiciona a
atividade jurisdicional, tanto quanto é correto dizer que a sentença do juiz
deve espelhar as postulações das partes, decidindo o conflito nas linhas em que
as partes pediram inicialmente.
Passada essa fase, o
processo se desenvolve com a realização das provas, pelas partes, conforme a
necessidade que cada polo tem de demonstrar a existência dos fatos alegados na
petição inicial (do autor) e nas respostas (do réu). É a chamada FASE DE DESENVOLVIMENTO do processo,
intermediando a abertura e o fim, que advirá com a SENTENÇA, que é o fenômeno pelo qual o juiz julga o pedido que lhe
foi posto. Poderá haver SENTENÇA SEM RESOLUÇÃO
DE MÉRITO (art. 485), em que o processo é estancado sem solução do
conflito; isso acontece por questões meramente processuais, quer dizer, em
situações em que vícios procedimentais impediram a cognição plena do
magistrado; também poderá haver SENTENÇA
COM RESOLUÇÃO DE MÉRITO (art. 487) quando, ao contrário, o conflito de
interesses é decidido pelo juiz: esta resolução pode conferir o direito a quem
o postulou, através de uma sentença de PROCEDÊNCIA
do pedido, assim como pode ser uma resolução negando esse direito, como é o
caso da sentença de IMPROCEDÊNCIA do
pedido.
A esta fase que acaba de
ser descrita se dá o nome de FASE
DECISÓRIA, a qual comporta, ainda, os RECURSOS
(art. 994) que estão presentes em nosso ordenamento jurídico processual. Em
síntese, os recursos são ferramentas à disposição das partes que não se
conformam com as derrotas obtidas em juízo e que permitem, por isso mesmo, a
busca de uma nova cognição e um novo julgamento do tema proposto. Os recursos
também têm a finalidade de corrigir erros do judiciário.
Em se tratando de
sentença que imponha obrigações, necessário será o CUMPRIMENTO DA SENTENÇA, o que pode se dar voluntariamente ou de
forma coercitiva, nos moldes dos arts.
513 e seguintes. Essas, em síntese, as linhas do processo de conhecimento
pelo procedimento comum.
A codificação processual
também estabelece uma série de regras para EXECUÇÃO
de títulos extrajudiciais, a partir do art.
771: tais regras serão utilizadas quando o jurisdicionado quiser forçar o
devedor a cumprir uma obrigação posta num título que contenha três requisitos
básicos: LIQUIDEZ, que significa a
extensão, ou quantidade, do que é devido; CERTEZA,
que indica quem é credor e quem é devedor, assim como a natureza jurídica
da obrigação; por fim, EXIGIBILIDADE, que
indica a data de vencimento da obrigação não cumprida.
Por fim, é importante
fazer uso adequado das terminologias jurídicas e processuais, para evitar o
desagradável vício das simplificações e equívocos em relação aos diversos e
inúmeros fenômenos do mundo das leis. O estudante não pode se acomodar com as
reduções linguísticas e deve se adaptar, o quanto antes, ao vocabulário próprio
do processo.
No texto que
apresentamos até esse momento, uma infinidade de expressões foi usada, sempre
procurando respeitar o rigor técnico da legislação processual vigente; mas
existem outros, que oportunamente vão aparecendo. Por exemplo: no processo de
conhecimento temos AUTOR e RÉU, e não demandante, postulante, ou,
o que é abominável, “suplicante” (sim, no estado democrático de direito,
ninguém suplica absolutamente ao judiciário; ao contrário, exige do
juiz/servidor público a prestação da tutela jurisdicional). No processo de
execução, as partes são chamadas de EXEQUENTE
e de EXECUTADO, ou de CREDOR e de DEVEDOR, em vista das próprias funções específicas desse processo.
Ademais, REQUERENTE é o termo usado para toda e
qualquer pessoa que faz requerimentos no processo, por isso é que não pode ser
sinônimo de AUTOR ou de RÉU; CITAÇÃO é ato que dá ao réu notícia sobre a abertura do processo,
permitindo, dentre outras atividades, a apresentação de respostas, garantindo o
contraditório e a ampla defesa; portanto, não há que se confundir esse evento
com a INTIMAÇÃO, que é ato pelo qual
são comunicados atos em geral para qualquer das partes e para eventuais
terceiros que devam colaborar com o judiciário. Mais: juiz não opina, não
solicita, mas decide, determina, impõe regras de conduta; quem opina é o membro
do MINISTÉRIO PÚBLICO, ou seja, o
Promotor de Justiça, que, de seu turno, não decide nada no processo.
Jamais deveremos fazer
confusão entre os atos praticados pelo juiz no processo: DESPACHO é ato que regula a marcha processual, sem carga decisória;
SENTENÇA é ato pelo qual o juiz
encerra a cognição de primeira instância, com ou sem resolução de mérito; por
fim, DECISÃO INTERLOCUTÓRIA é o nome
que se dá a qualquer decisão praticada pelo magistrado, no curso do processo, e
que não se enquadre na definição de sentença – conforme art. 203.
5. FUNDAMENTOS TEÓRICOS: doutrinas e manuais, súmulas e
precedentes
Por muito tempo
se considerou que havia, no mundo, muito mais obras escritas sobre xadrez do
que sobre qualquer outra área do conhecimento humano, incluindo as ciências
médicas e jurídicas. Ressalvados eventuais exageros, o fato é que o enxadrismo
goza de ampla divulgação e conta com o número impressionante de escritos e
publicações. Em Xeque
mate, a aventura do xadrez, o polonês Edward
Lasker traz um aprofundado estudo sobre as origens do xadrez, afirmando que
o primeiro livro contendo as regras do jogo foi escrito no fim do século XV
pelo espanhol Lucena; na sequência, vieram, ainda segundo Lasker, uma obra do
português Damiano, publicada em 1512; depois, uma outra, de Ruy Lopes, padre
espanhol que realizou estudos que até hoje são utilizados em torneios, publicada
em 1559. Em sequência, vieram as obras de Boi, Sálvio, Greco e Stamma, no
Século XVI. André Philidor, francês, ganhou fama
internacional em 1747, ao derrotar Stamma; ele foi o primeiro grande mestre de
renome internacional e nos legou uma série de estudos, incluindo uma famosa
defesa que leva o seu nome – Defesa Phillidor. Ludek
Pachman, nascido na antiga Tchecoslavaquia, nos deixou uma interessante
obra, Ajedrez y comunismo, em que
analisa o desenvolvimento do enxadrismo na cortina de ferro. É uma obra que
também vale pelo seu teor histórico, mas peca pelas críticas ao sistema
socialista por um viés oportunista e capitalista. Eugênio
Znosko-Borovsky, russo, escreveu uma série de obras importantes, com
análises de partidas e de fundamentos gerais, dentre elas El médio juego em ajederez. Nesta obra, Borovsky faz interessantes
estudos sobre a passagem da abertura para o meio jogo propriamente dito,
crucial para o iniciante. Idel
Becker, que nasceu na Argentina e depois se naturalizou brasileiro, foi um
médico e também enxadrista de destaque. Escreveu sobre diversos temas, mas os
destaques ficam para duas obras: Manual
de Xadrez, de 1948, e Aberturas e
Armadilhas no Xadrez, de 1969, que são amplamente utilizadas pelos que se
iniciam nas artes enxadrísticas. Becker faleceu no dia 12 de junho de 1994,
coincidentemente na data em que parte da comunidade enxadrística comemora o Dia
do Enxadrista. Vassily
Vassilievitch Smylov, russo, escreveu excelentes obras, das quais
destacamos Partidas selecionadas, em
analisa com profundidade suas melhores partidas. É considerada uma obra séria
porque ele não deixa de lado as partidas em que foi derrotado, não se furtando,
pois, de mostra-las ao público em geral. Aliás, interessante notar que Roman Toran, nascido em Gijon, na
Espanha, produziu excelente obra com análises das partidas de V. V. Smylov, de
grande valia para os enxadristas em geral. Entre as literaturas mais atualizadas,
merecem destaque os escritos de Garry
Kasparov, nascido no Azerbaijão e que foi campeão mundial da categoria
máxima entre os anos de 1985 até 1993; considerado por muitos como um dos dez
melhores jogadores de todos os tempos, Kasparov deixou inúmeras contribuições,
dentre elas o conhecido Aprenda xadrez
com Garry Kasparov, em que combina uma série de artigos teóricos e
conceituais com estudos práticos de aberturas, meio de jogo e finais de
partida. É um livro muito bem recomendado. O
russo Yuri Averbach produziu excelentes textos em Lecturas de ajedrez, com lições
sobre princípios gerais do enxadrismo. Na mesma linha, estão as Lições elementares de xadrez, do cubano
José Raul Capablanca; é uma
deliciosa leitura deste que foi um dos maiores jogadores de todos os tempos. Dentre os brasileiros natos, destacamos a
imortal obra de Gilberto Orfeu
D’Agostini. O seu Xadrez Básico
é um clássico, sempre citado como o primeiro livro de quase todos os nossos
enxadristas, que o consideram como o melhor livro brasileiro da modalidade. Por
isso mesmo, merece ser estudado por todos quantos se interessem por esta
atividade. Por ele aprendemos desde a montagem do tabuleiro, valor e
movimentação das peças, até os segredos de uma enorme quantidade de aberturas;
aprendemos, também, didaticamente, a desenvolver o meio de jogo e direcionar o
ataque para uma vasta gama de xeques; na parte final da obra, temos
oportunidade de contemplar um excelente tópico destinado aos finais teóricos.
Tudo isso, recheado de uma infindável coleção de partidas dos grandes mestres
de todos os tempos, devidamente analisadas e comentadas, uma por uma, com as
variantes possíveis. Os enxadristas e professores Gerson Peres Batista e Joel Cintra Borges, ambos mineiros de
São Sebastião do Paraiso, escreveram excelente obra, O espírito da abertura, em que analisam, de modo brilhante e
didático, as diversas aberturas do jogo de xadrez. Recomendadíssima para todos
os enxadristas. Um pouco mais complexa, já para os
jogadores experimentados, indicamos Peões
mágicos, dos holandeses Herman
Claudius van Riemsdijk e Willem
Diederik Hajenius. Herman se radicou no Brasil há muitos anos e fez parte
da assessoria do maior jogador brasileiro de todos os tempos, Henrique da Costa
Mecking; escreveu, durante muitos anos, uma famosa coluna semanal, sobre
xadrez, no jornal O Estado de São Paulo. Nesta obra, de profunda reflexão,
ambos fazem estudos originais sobre a movimentação dos peões no final de jogo,
com proposições refinadas e de difícil compreensão – por isso mesmo é uma obra
indicada para, repetimos, jogadores de maior traquejo. Na internet
e no canal YouTube, inúmeras são as
lições enxadrísticas, desde a movimentação das peças até finais teóricos,
passando por meio jogo e análise das partidas mais famosas de todos os tempos;
os iniciantes não podem, jamais, deixar de lado essas excelentes ferramentas,
ao alcance praticamente de todas as pessoas. Citamos, por fim, interessante lista feita pelo campeão brasileiro Rafael Leitão, na internet; cada enxadrista tem seus autores preferidos. A propósito, Rafael Leitão indica, como melhor de todos os tempos, a Coleção School of Chess Excellence, de Dvoretsky, para os jogadores de nível avançado. |
A quantidade de
livros à disposição dos estudantes e operadores de direito é quase que infinda.
Trata-se de um seguimento editorial que floresceu especialmente no Brasil, mas
que, no presente, se encontra em fase de profundas modificações em face livro
eletrônico, virtual. Seja como for, o certo é que o nosso país
é pródigo na formação de formação de juristas e doutrinadores, que enriquecem
continuamente as ciências de um modo geral. Nossos juristas são de variadas
épocas e idades: algumas doutrinas, pelo seu brilhantismo, permanecem atuais e
em uso mesmo depois da morte do seu autor, e isso não prejudica, absolutamente,
o surgimento, cada vez em maior número, de novos estudiosos do direito. Particularmente no que se refere ao
processo civil, EDUARDO JUAN COUTURE,
nascido no Uruguai e reconhecimento mundialmente pelo seu saber jurídico, foi
um dos pilares do processo civil brasileiro. Sua obra Fundamentos do Direito Processual Civil é uma inesgotável fonte da
teoria processual e ainda muito referenciada entre nós. Outro estrangeiro que
muito contribuiu com o nosso processo civil foi ENRICO TULIO LIEBMAN, ucraniano que morou e estudou na Itália e
depois, por volta de 1940, veio para o Brasil, atraído pelas novidades do
Código de Processo Civil de 1939, que então entrava em vigor. Liebman é autor
de vasta obra conceitual, com destaque para Manual de Direito Processual Civil e, ainda, outra, sob o nome Execução. Mauro
Cappelletti, italiano, professor de direito da Universidade de Florença,
trata de um tema de capital importância no livro O acesso à justiça. Esta obra, escrita em parceria com Bryant Garth, norte-americano de San
Diego, Califórnia, é de leitura obrigatória, sobretudo para que se compreenda a
garantia constitucional de acesso à justiça em sua plenitude, com todas as
facetas e nuances que envolvem essa expressão.
Um dos meus livros de cabeceira é o
volume 1 do Primeiras Linhas de Direito
Processual Civil, de Moacyr Amaral
Santos; professor da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, em São
Paulo, foi ministro do STF, deixou uma excelente obra, que ainda hoje, apesar
dos avanços da processualista, nos é de grande ajuda em termos de teoria geral.
Ao lado de Amaral Santos, está sempre ao
meu alcance a imortal Teoria Geral do
Processo, de Cândido Rangel
Dinamarco, Anda Pellegrini Grinover e Antonio Carlos Cintra, que muito vale
em termos de instrumentalidade do processo. Humberto
Theodoro Júnior, mineiro de Ituiutaba, é o mais renomado de quantos ainda
estão na ativa. Autor de diversas obras
clássicas, tem o seu carro chefe no consagrado Curso de Direito Processual Civil, atualizado com rara competência
e profundidade. Indispensável para qualquer pessoa que queira entender um pouco
do intrincado processo. É de se mencionar, também, uma nova safra
de pensadores do processo civil que, apesar da pouca idade, já influenciam os
rumos desta área do direito. Nascido no Paraná, Luiz Rodrigues Wambier é autor uma extensa e respeitada obra, com
destaque para o seu Curso Avançado de
Processo Civil. É uma obra que prima pela clareza sem perder a profundidade
necessária para o adequado aprendizado, escrito em parceria com o também
advogado Eduardo Talamini. Alexandre
Freitas Câmara, do Rio de Janeiro, figura dentre os grandes pensadores do
processo civil. Desembargador do TJ carioca, é autor de diversas obras, dentre
as quais a atualizada O novo processo
civil brasileiro. Também é de ser listado o mestre Misael Montenegro Filho, gaúcho radicado em Pernambuco, autor de
Direito Processual Civil. Exímio conferencista, é também professor da
Universidade Federal de Pernambuco. Da Bahia vem Fredie Didier Júnior, com o seu Curso de Direito Processual Civil, com contribuições inovadoras
para a processualística, merecidamente festejado por um novo público formador
de opinião. Cássio
Scarpinella Bueno, paulista, formado pela PUC São Paulo, é sempre lembrado
pela excelente obra Manual de Direito
Processual Civil; o autor foi membro da Comissão nomeada pelo Senado
Federal para escrever o projeto do novo Código de Processo Civil e, portanto,
escreve sobre o tema com propriedade e conhecimento profundo. Do paranaense Luiz Guilherme Marinoni são o Novo
Curso de Direito Processual Civil e o Código
de Processo Civil Comentado, duas referências para o curso de direito.
Nesta mesma seara de comentários ao CPC, vamos encontrar o indispensável e
sempre referenciado Theotônio Negrão,
paulista de Piraju, com o seu Código de
Processo Civil e legislação processual em vigor. É uma obra que contém uma
refinada e minuciosa interpretação da codificação processual, à luz da
jurisprudência dos tribunais pátrios, por isso é sempre citado pelos advogados,
juízes, desembargadores e ministros país afora. O paulista José Rogério Cruz e Tucci escreveu a obra Tempo e Processo no ano de 1997, por ocasião das primeiras reformas
que se verificaram, em 1994 e 1995, no revogado CPC de 1973. Apesar da idade da
obra, ela continua mais atual do que nunca porque trata justamente das agruras
e dos sofrimentos que o passar do tempo ocasiona aos jurisdicionados, se a
solução do conflito. A par das doutrinas, também vamos
encontrar preciosas respostas para nossas dúvidas nos enunciados do FPPC – Fórum Permanente de Processualistas
Civis, que se apresenta como um espaço adequado para a construção de algum
consenso sobre as regras processuais que estão sendo reiteradamente aplicadas, e
que podem ser encontrados em http://fpprocessualistascivis.blogspot.com/,
da internet. Nesta mesma linha, os
Tribunais de Justiça também criaram os seus próprios enunciados, que se encontram nos respectivos sites da internet; assim também seguem os enunciados do FONAJE – Fórum Nacional dos Juizados Especiais, voltados, no caso,
para a interpretação da Lei 9.099 – Juizados Especiais. A jurisprudência e as súmulas são alçadas à categoria de fonte do direito processual. Jurisprudência é a coletânea das diversas decisões dos tribunais acerca de determinado tema, enquanto que as súmulas são os resumos das decisões dominantes nos tribunais acerca de determinados tema, condensando, pois, num verbete ou numa frase aquilo que vem sendo decidido de modo uniforme e contínuo. |
6. DEFINIÇÕES:
xadrez e processo como jogo, arte e ciência
Xadrez é jogo.
Xadrez é arte. Xadrez é ciência. Xadrez é tudo isso junto. JOGO:
o xadrez é um jogo milenar, que se desenvolve através de lances seguidos e
alternados entre dois jogadores. O primeiro jogador, que joga com as brancas,
faz o seu lance; em seguida, o segundo jogador maneja uma das peças,
completando o lance. Ao conjunto de lances iniciais se dá o
nome de abertura; são mais ou menos cinco
ou seis lances em que os jogadores desenvolvem as peças do seu exército em
busca das estratégias preferidas para obtenção da vitória. São lances cuidadosos
e que normalmente definem os rumos da partida. Depois disso, entramos no meio de jogo, em que são as peças são
dispostas de em harmonia umas com as outras, em busca do objetivo final; é
nessa fase, que tem duração variável, mais ou menos do sétimo ou oitavo lance
até o momento em que se descortinam os ataques finais ao rei adversário, que
ocorrem mais amiúde as trocas e combinações artísticas do jogo. Por derradeiro,
vem o final, em que se efetivam os
ataques emocionantes, precisos e letais, direcionados à solução da partida com
a vitória. Todas essas fases são estudas pelos
especialistas, que atuam conforme teses e experiências anteriores do mundo
enxadrístico. As origens desse jogo são incertas. A
história mais repetida é que um rei, triste, entediado e sem o que fazer no
tempo livre de que dispunha, pediu a um súdito que inventasse um jogo diferente
e atrativo, que, enfim, pudesse lhe distrair durante o tempo que tinha de
lazer. Daí teria nascido o chatrang,
ou chaturanga, que veio passando por
uma série de alterações até chegar aos nossos tempos tal como conhecemos. O súdito inventou um jogo de tabuleiro,
com sessenta e quatro casas, pretas e brancas, alternadamente, sobre o qual se
movimentavam dois exércitos, compostos de elefantes, carroças, vizires,
infantaria, artilharia, vizires e os próprios reis, que comandavam suas tropas.
Com o tempo, essas peças foram substituídas por torres, cavalos, bispos,
rainhas (mais propriamente chamadas de damas) e peões. E esse invento foi o
suficiente para satisfazer e divertir o rei que o encomendara. Da Índia, o xadrez (originalmente shah, que significa rei; depois scachi na Itália e escaque em Portugal e na Espanha, palavras que significam quadrado,
casa quadrada) passou para a China e para Pérsia, para então ganhar o mundo
moderno durante as grandes navegações europeias. Pero Vez de Caminha, na Carta
de Achamento do Brasil, menciona as pinturas que viu nos corpos dos indígenas
com a palavra escaque, que era comum à época para designar o jogo de xadrez.
Tudo indica que Cabral e sua trupe navegaram com um tabuleiro de xadrez às mãos,
como era o costume europeu; a eles se dá o crédito da entrada desse jogo no
Brasil. As regras também sofreram modificações
profundas, sendo que as atuais derivam das que foram introduzidas no século XV,
pelos europeus, provavelmente da Itália ou da Espanha. O xadrez é um jogo de diversão, é um
passatempo; com ele, fazemos amigos e nos alegramos. Preenchemos nossas horas,
sozinhos ou com parceiros, tête-a-tête ou, mais moderno, virtualmente, pela
rede mundial de computadores; pode ser jogado em praças, em colégios, em clubes
e em casa. Com o xadrez, fazemos competições acirradas, amadoras ou
profissionais, de âmbito local e de âmbito mundial, com grande repercussão de
mídia e com partidas que entraram para história, por sua beleza e criatividade. O jogo pode terminar com vitória de um
dos contendores, assim como pode terminar empatado, conforme seja a posição das
peças ou conforme seja a vontade dos jogadores. Felipe, o Rei Católico da Espanha,
Shakespeare. Napoleão Bonaparte, Benjamin Franklin, Voltaire, Tolstoi, Karl
Marx, Lenin, Machado de Assis, Chaplin, Fidel Castro, Che Guevara e Jhon Lennon
estão entre os grandes personagens da história mundial que muito se divertiram
com as atividades enxadrísticas; consta que nunca foram senão medianos
jogadores, que viam esta atividade apenas como passatempo. O xadrez também é ARTE. Já mais recentemente, por volta de 1930, Marcel Duchamp,
pintor, poeta e escultor francês, foi exímio jogador, disputando torneios
internacionais e olimpíadas da modalidade pelo seu país natal, atuando quase
que de modo profissional. É dele a frase: “nem todo artista é um enxadrista;
mas todo enxadrista é um artista”, que define bem esse aspecto da modalidade. No enxadrismo nós vamos encontrar o
registro de partidas que são verdadeiras obras de, em que as combinações entre
as peças são artisticamente elaboradas pelo jogador em busca do xeque-mate. São
partidas que mexem com o lado emocional de quem joga, de quem a presencia e de
quem, depois, a reproduz. Embora finito, o número de combinações
possíveis no manejo das trinta e duas peças se situa entre chamados os números
absurdos, quase que impronunciáveis, de modo que o cérebro humano não tem capacidade
para armazenar senão uma pequeníssima parcela do total dessas variantes. É isso
que faz com que a criatividade seja essencial para a condução de um jogo
vencedor. O correto uso das colunas e das linhas do
tabuleiro, assim como das diagonais, é tarefa difícil de ser realizada. Porém,
uma realizada essa tarefa, seu resultado é, no mais das vezes, fascinante,
permitindo um final artístico e maravilhoso, tanto para o jogador que executou
quanto para os expectadores que se reúnem em volta do tabuleiro. As colunas estão dispostas verticalmente
no tabuleiro, e são abstratamente numeradas de um a oito, a partir da primeira
casa do território das peças brancas; já as fileiras são identificadas, também
de modo abstrato, por oito letras, de a até h, no sentido horizontal,
da esquerda para a direita do primeiro jogador, que atua com as brancas. Desse
modo, encontraremos as coordenadas que permitem a identificação particularizada
de cada casa do tabuleiro. Pois bem: o domínio de colunas, com
torres e dama, e de diagonais, com bispos e damas, é fundamental. Isso exige
visão completa e constante do tabuleiro, em toda a sua inteireza. E, por vezes,
sacrifícios de peões ou de peças são
realizados para permitir domínio sobre o exército adversário ou para permitir o
xeque-mate. Sacrifício significa a entrega de material sem perspectiva de
captura posterior de peça adversária, em busca de posição ou de xeque-mate. Eis
aqui a verdadeira e sublime arte do xadrez, sobremodo quando o sacrifício
acontece com a movimentação harmônica e combinada das peças pelas colunas e
diagonais ao mesmo tempo. ´ É a entrega de um bispo, de uma torre ou
até mesmo da dama, e dessa entrega vem a surpresa geral: xeque-mate! É o
suprassumo da arte enxadrística, é o deleite de todo enxadrista. Por isso é que
a ganância e o apetite voraz pela captura de peças não são recomendadas nesse
jogo. Enfim, xadrez também é CIÊNCIA: seu desenvolvimento se deve a
constantes estudos e inovações teóricas, cujos resultados, de seu turno, se
submetem a novos parâmetros e novos estudos, num constante e eterno
aprimoramento. Novas aberturas e novas estratégias são criadas de tempos em
tempos, depois de muitas pesquisas e de experimentos diversos. É uma atividade
que exige muitos estudos e muita concentração da parte de quem os pratica;
livros, palestras, artigos de jornal e revista, enfim, muitos textos de
reflexão são produzidos diariamente no mundo todo, envolvendo matemáticos e
jogadores, homens e mulheres, de modo incessante, o que faz com que a atividade
enxadrística não caia em rotinas e mesmices. Os estudos de xadrez, realizados por
grandes especialistas, partem, normalmente de posições encontradas em partidas
memoráveis, que são analisadas em suas variantes mais prováveis; dessas
variantes, o que se quer é encontrar possíveis soluções vencedoras e, por isso
mesmo, são experimentadas publicamente, em partidas posteriores. Desses
experimentos sobressaem debates da comunidade enxadrística sobre as novas
soluções e variantes apontadas, que colocam em crise a teoria posta pelos
analistas. É desse modo que, cientificamente, na base da experimentação, da
teorização e do debate público que o xadrez vai avançando e se modernizando ao
longo dos tempos. Por fim, xadrez exige cálculos
matemáticos, que são feitos pelo jogador antes de efetuado o lance desejado; é
necessário saber contar e comparar o número de defesas e de ataques sobre
determinadas peças, sobre determinadas casas do tabuleiro, enfim, os cálculos
são uma constante durante os jugos, incluindo aqueles que se relacionam às
figuras geométricas (quadrados, retângulos e triângulos que os escaques vão
formando), visíveis ou apenas imaginárias. Alguns cálculos só podem ser feitos
através de fórmulas matemáticas, manuseadas por especialista, na medida em que
os números da modalidade se contam à base de números estratosféricos, ou
absurdos. Somente o primeiro lance da partida pode ser feito por aproximadamente
cem combinações; com apenas 10 lances, poderemos encontrar perto de 160
quatrilhões de posições diferentes. Esses números alucinantes só podem ser
estuados de modo científico, portanto. Enfim, xadrez é PROFISSÃO, na medida em que muitas pessoas vivem dele. Sim, é até
de certo modo comum encontrar profissionais do enxadrismo, pessoas são
professores em escolas públicas ou particulares, que dão aulas de xadrez para
uma clientela variada, entre crianças, jovens e adultos, ou, então, são exímios
jogadores que correm o mundo, em busca de torneios que paguem bons prêmios em
dinheiro para os primeiros colocados. Há enxadristas que se exibem em eventos públicos e fechados, que fazem palestras e jogam apenas como demonstração, atraindo plateias que pagam ingressos para ver de perto um ídolo. Há também jogadores que cobram para se exibir em simultâneas; enfim, o enxadrismo é uma profissão como outra qualquer, que exige aprimoramento, estudos, técnica, treinos, concentração e, acima de tudo, disciplina, cumprimento de horários e de regras. É mais do que justo que estes profissionais sejam adequadamente remunerados pelo trabalho investimentos. |
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7. SINGULARIDADE OU PLURALIDADE DE PARTES: jogos em duplas e
litisconsórcios
No xadrez
tradicional, são dois os adversários, um frente ao outro, com ou sem a presença
do árbitro. Um dos jogadores se apresenta com as peças brancas e faz o primeiro
lance da partida, enquanto o outro, com as peças pretas, imediatamente responde
o movimento feito pelo primeiro jogador. Todavia, algumas outras composições são
possíveis, de modo que, não raras vezes, vamos encontrar disputas de um jogador
contra dois ou vários adversários, até mesmo dezenas deles, assim, como
partidas disputadas em duplas, dois de um lado do tabuleiro e dois do outro
lado, dentre outras variações possíveis. No xadrez amadorístico, sobremodo em
dinâmicas de fim de aula, algumas variações são adotadas pelo professor para
fortalecer o trabalho em grupo e permitir, ao mesmo tempo, que os alunos relaxem
e se divirtam no encerramento de atividades que exigem fortes doses de
concentração. SIMULTÂNEA:
a simultânea é um evento em que um enxadrista experimentado, que normalmente
joga de brancas, enfrenta uma grande quantidade de adversários (ao mesmo tempo,
claro). Muito comum é a simultânea contra vinte ou trinta adversários, mas há
registros históricos de jogadores famosos que enfrentaram oitenta ou cem
adversários, vencendo-os todos. Nessa modalidade, as mesas são dispostas
em forma de retângulo, com o jogador especialista dentro dele, movendo-se em
sentido horário ou anti-horário, conforme previamente combinado; ele faz o seu
primeiro lance no primeiro tabuleiro e passa para a mesma do lado, onde faz o
segundo lance e, assim, sucessivamente, até o último. É somente quando volta ao
primeiro tabuleiro que o adversário, que está posicionado fora do retângulo, dá
a sua resposta, quer dizer, faz o seu lance, à vista do adversário; então,
imediatamente o especialista faz o seu segundo lance, e parte para os demais
tabuleiros, numa cansativa sucessão de idas e vindas. A simultânea é coisa de especialistas,
pessoas de bom nível enxadrístico, pois a ideia é ganhar de todos os
adversários, que vão sendo derrotados um a um; quando muito, admite-se que ceda
um ou outro empate; em raros casos, pode haver uma derrota, não mais que isso.
Entretanto, é vexaminoso dar uma simultânea e sofrer várias derrotas: melhor
mesmo seria, nesse caso, não fazer exibição alguma e deixar a pretensão de
lado. Nesta modalidade, não se admite
interferência externa e nem comunicação entre os jogadores postados lado a lado. DUPLAS:
consiste numa partida jogada entre duas duplas, diante de um único
tabuleiro. Os lances devem ser efetuados alternadamente entre cada jogador de
cada dupla, como: em A e B jogando contra C e D, o primeiro lance
é de A e a resposta é dada por C; depois o segundo lance é de B e a resposta é dada por D, e assim sucessivamente, até o
encerramento da partida. Nesta modalidade, as duplas não se comunicam, pois
cada jogador tem que pautar o seu jogo pelo jogo do colega, sem palpites de
qualquer ordem. O jogador apenas torce, silenciosamente, para que o colega faça
esse ou aquele lance, nada mais do que isso. PARTIDA
AUSTRALIANA: por certo é a mais divertida de todas as modalidades
alternativas; nela se confrontam duas duplas, mas em dois tabuleiros distintos,
preferencialmente com controle de tempo para cada um dos quatro jogadores.
Funciona da seguinte maneira: por hipótese, dupla A e B jogando contra a
dupla C e D; A, de brancas,
enfrenta C, de pretas, enquanto B, de pretas, enfrenta D, de brancas. Observe que cada
companheiro joga com uma cor diferente, e por um simples motivo: as peças
pretas que o jogador A captura do
adversário, C, que está de brancas,
é passada para o seu companheiro B, que
poderá coloca-la no seu próprio exército e com ela continuar o jogo. É isso
mesmo, as peças que seu colega captura do outro vêm para o seu tabuleiro,
tornado essa modalidade enxadrística um tanto anárquica e, por isso mesmo,
altamente desgastante, sob o ponto de vista mental e psicológico. É comum,
entre crianças, e mesmo entre adultos que ainda se divertem como aquelas, uma
certa farra, gritaria: companheiro, preciso de um cavalo; preciso de um peão,
de um bispo. Enfim, é um jogo muito descontraído e agitado, próprio para
incentivar a prática magistral e descontrair pessoas com algum grau de
inibição. Certas regras são essenciais: não se
coloca nenhuma peça nova que já entre dando xeque, mas pode ser colocada para
cobrir o xeque do adversário; também não se colocada qualquer peça após a
quarta fila do tabuleiro (ou após a quinta) conforme seja convencionado entre
as duplas. Nessa modalidade é possível vitória de A
e de B, que venceriam por 2-0; ou, então, empate, 1-1, conforme a vitória de
cada uma das duplas; ou, por fim, 1,5-0,5, conforme uma vitória e um empate. UM
CONTRA DOIS: nesta modalidade, um jogador, de melhor qualidade técnica,
confronta dois, que se comunicam entre si para a escolha do melhor lance. Não
tem maiores segredos na sua execução e é pouco vista entre os praticantes, pois
pode parecer sinônimo de soberba e exibicionismo do jogador solitário – ao
contrário do que ocorre com a partida australiana, que é exibição séria e
desafiadora para os grandes especialistas. Seja qual for a modalidade do xadrez praticado, uma coisa é certa: palpites daqueles que estão assistindo não dão boa coisa; geralmente tumultuam a disputa, gerando reclamações de parte a parte. Seja pelo desequilíbrio de forças que provoca, seja pelo incômodo que sente aquele que está sendo “ajudado”, já que a interferência atrapalha o curso do seu pensamento. Assim, é absolutamente necessário que se evite esse tipo de coisa, extremamente desagradável e prejudicial ao espetáculo. |
No processo
tradicionalmente se confrontam duas partes, uma no polo ativo e outra no polo
passivo; todavia nada impede que várias pessoas atuem no polo ativo ou no polo
passivo, formando litisconsórcio ativo ou litisconsórcio passivo. Litisconsórcio nada mais é do que a
associação, o consórcio, que dois ou mais litigantes fazem entre si para
enfrentar um ou mais adversários. Esse litisconsórcio pode ser ativo, quando se
apresenta como autor, ou passivo, quando se apresenta como réu. Regulado pelas disposições contidas nos
artigos 113 e seguintes do Código de Processo Civil, o litisconsórcio pode ser inicial ou ulterior, facultativo ou
necessário, assim como pode ser unitário ou não unitário, conforme diversas nuances que se apresentam no
processo. Não obstante essas variações, o certo é que existe processo único,
quer dizer, numa única relação jurídica são vários litigantes que se acham
presentes no polo ativo e/ou no polo passivo, havendo evidentes ganhos de
economia processual e de racionalização dos serviços judiciários. No entanto, é preciso observar que o
referido ART. 113 exige que entre os
litisconsortes haja ao menos um dos seguintes fatores: a) comunhão de direitos
ou de obrigações; b) conexão entre pedidos ou de causa de pedir, consideradas
as causas de cada colitigante; c) afinidade de questões de fato ou de direito.
Dito em outras palavras, a formação do litisconsórcio não é aleatória, antes se
submete a algumas regras mínimas de ordem processual. INICIAL
é o litisconsórcio que já vem foi estabelecido na petição inicial, quer dizer, logo
na abertura do processo, enquanto que ULTERIOR
é aquele que foi constituído já com o processo em curso; as hipóteses para
a formação do litisconsórcio ulterior são várias: a) pela intervenção de
terceiros; b) pela reunião de duas ou mais ações; c) pela sucessão processual;
d) pela determinação do juiz. O litisconsórcio também pode ser BILATERAL, ou seja, esse fenômeno pode
ocorrer no polo ativo e no polo passivo, e não apenas num dos polos da relação
jurídica. Por fim, pode ser MULTIDUDINÁRIO,
que é aquele formado por uma multidão de pessoas, normalmente no polo ativo. LITISCONSÓRCIO
FACULTATIVO: é a hipótese em que duas ou mais pessoas se associam
voluntariamente, sem obrigatoriedade de assim procederem, para determinada ação
judicial; fazem esse consórcio por vontade própria, sem imposição de qualquer
origem ou natureza, simplesmente pela vontade de litigarem em conjunto. Observados
os critérios do artigo 113, adotam essa faculdade para a divisão despesas, ou,
então, para facilitar a coleta de documentos e provas. Tal como voluntariamente
podem se consorciar, por certo poderiam litigar individualmente, cada qual com
o seu próprio advogado e em ação separada – é tudo uma questão de vontade e
interesses subjetivos. LITISCONSÓRCIO
NECESSÁRIO: é a associação imposta pela legislação ou pela natureza
jurídica da relação material em litígio; já não se trata de uma faculdade,
portanto. No caso de ação anulação de casamento proposta pelo Ministério
Público, obrigatoriamente virão, no polo passivo, ambos os cônjuges; outra
hipótese se dá com a ação de usucapião, para a qual se exige a presença do
proprietário e de todos os confrontantes do imóvel, também no polo passivo. O litisconsórcio poderá ser, enfim, NECESSÁRIO UNITÁRIO, caso em que,
conforme o exemplo da anulação de casamento, a sentença deverá conter idêntico
comando para os dois réus, por evidente, ou NECESSÁRIO SIMPLES, também chamado de NÃO UNITÁRIO, que é o caso do segundo exemplo acima, em que a
sentença poderá albergar comandos diferentes para uns e outros confrontantes do
imóvel a ser usucapido, conforme os motivos de fato e de direito inerentes a
cada um deles de per si. Os exemplos são inúmeros, como inúmeras
são as combinações das modalidades indicadas. Desse modo, encontramos o litisconsórcio
facultativo e o litisconsórcio necessário como litisconsórcio inicial ou
ulterior, bilateral ou não, com pluralidade de partes no polo ativo ou passivo. Seja como for, o litisconsórcio apresenta
um conjunto de lides, de pretensões resistidas, autônomas entre si, que devem
ser solucionadas dentro de um mesmo e único processo. É aceito tanto na Justiça
Comum como nas especializadas, inclusive nos Juizados Especiais, regrados pela
lei 9.099/95. Em relação especificamente ao LITISCONSÓRCIO MULTIDUDINÁRIO, que é
aquele composto por uma grande quantidade de pessoas, o Código de Processo
Civil autoriza o juiz a limitar sua composição, de modo a impor a divisão dos
litigantes em grupos menores, em processos desmembrados, isso quando se tratar
de litisconsórcio facultativo. Essa hipótese legal é acertada na medida
em que a experiência mostra que o exagerado acúmulo de litigantes num dos polos
leva a uma morosidade na tramitação do processo, com tumultos de toda a ordem,
contrariando, assim, a própria razão de ser do litisconsórcio facultativo. Tal
fenômeno nocivo ocorre principalmente quando se constata a presença de
advogados diferentes para as partes, embora essa nocividade também se faça
presente em ocasiões em que apenas um advogado representa a multidão de
litigantes. De outro lado, o CPC/2015 trouxe regra nova, admitindo o AMICUS CURIAE (ART. 138), cuja função é a esclarecer ao juiz e às partes sobre os efeitos de determinada decisão. Diferentemente do perito, o amicus não recebe honorários e não se sujeita às regras de impedimento e suspeição e pode requerer seu ingresso no processo a qualquer momento, o que não pode ocorre com o perito, que é nomeado como auxiliar do juízo. |
8. ÁRBITRO E JUIZ: arbitragem enxadrística e juiz togado
O árbitro é
aquele que está encarregado de fazer cumprir e respeitar as leis do xadrez,
durante os jogos dessa atividade humana. Ele é nomeado pela organização de cada
evento enxadrístico, independentemente de concurso público e de prévia nomeação
oficial. O árbitro é escolhido e indicado pela
organização do torneio, ou do jogo, conforme seja o grau de dificuldade do
evento. Em outras palavras, o árbitro é conhecido, normalmente, nas vésperas do
encontro enxadrístico, sem necessidade de prévia nomeação. O que se quer do árbitro é que conheça
minimamente as regras do xadrez e que tenha equilíbrio emocional suficiente
para dirimir as polêmicas que eventualmente possam surgir nos confrontos. Cabe
a ele, inicialmente, esclarecer as regras da competição e indicar o
comportamento esperado dos jogadores. Também cabe ao árbitro fazer o controle
de tempo – ritmo – das partidas, assim como aplicar as punições previstas nas
regras da modalidade e nas eventuais regras específicas da disputa. O árbitro não está, portanto, sujeito a
um concurso público para assim ser nomeado e nem tem, previamente, regras de
competência para a sua atuação. Assim, será indicado pela organização para
atuar nos eventos em que a sua presença seja mais conveniente, sobremodo em
termos de experiência de arbitragem. Outro fator que conta muito é a
sobriedade do árbitro, que deve ser rígido na aplicação das regras e, ao mesmo
tempo, ser equilibrado emocionalmente na sua conduta. A FIDE – Federação Internacional de
Xadrez – tem seu próprio quadro de arbitragem, dentre eles diversos
brasileiros. A CBX – Confederação Brasileira de Xadrez – e as federações
estaduais promovem, periodicamente, cursos para formação de árbitros,
certificando-os para participarem das diversas competições que organizam. Enquanto o juiz de direito, para
exercício da jurisdição, atua para dirimir conflitos de interesse, o árbitro de
xadrez atua para fazer cumprir as regras previamente postas, independentemente
de conflito entre os enxadristas. Aliás, raros são os conflitos durante as
competições e confrontos: normalmente, o árbitro não tem maiores trabalhos e
nem polêmicas a decidir. Todavia, quando ocorre um conflito entre
dois ou mais jogadores, deve o árbitro, imediatamente, decidir a contenda e
aplicar a punição cabível, que vai desde a simples advertência ou acréscimo de
tempo para o jogador que sofreu a ofensa até a exclusão do jogador faltoso. De fundamental importância para o árbitro
é o conhecimento das ferramentas de informática, sobremodo para equacionar
adequadamente os emparceiramentos e as pontuações no sistema suíço. Este
sistema foi criado por Julius Muller e permite a realização disputas
enxadrísticas com um grande número de participantes em poucas rodadas,
normalmente seis, sem eliminação de jogadores. O sistema suíço é aplicado através de um software de computar, o que exige do árbitro um razoável conhecimento das técnicas respectivas. |
A expressão “juiz de direito” é usada nos
meios jurídicos, com uma acepção própria e distinta da de árbitro. Juiz é todo
aquele que está autorizada a administrar a justiça, no Brasil, por nomeação do
estado e após a aprovação em concurso público de provas e títulos. Também chamado de magistrado, é aquele
que está autorizado a dizer e a realizar o direito, ou seja, aquele que está
autorizado a exercer as funções jurisdicionais, encarregando-se do dever de
prestar as tutelas pedidas pelos jurisdicionados. O juiz atua em nome da lei e de acordo
com a lei, somente sendo autorizado a decidir conforme os costumes e por
equidade quando houver expressa autorização legal ou quando houver lacuna na
lei. Exemplo típico de decisão por equidade é
o que encontramos nos procedimentos de jurisdição voluntária, em que o juiz não
está obrigado a decidir de acordo com critérios de estrita legalidade e, assim,
poderá adotar, em cada caso, a solução que entender mais conveniente ou oportuna,
conforme redação do ART. 723 do CPC. Há, também, quem entenda
que, no âmbito dos juizados especiais, regidos pela lei 9.099/95, há
autorização para que o juiz decida por equidade, enquanto que, outros, entendem
o contrário, valendo lembrar que essas duas correntes partem da interpretação
do artigo 6º, da referida lei, segundo o qual o juiz “adotará, em cada caso, a
solução que reputar mais justa e equânime”. No mais, o juiz exerce as suas funções
obedecendo a um conjunto de regras constitucionais e não tem liberdade ampla
para tomar as suas decisões. Tal como qualquer outro cidadão, também ele se submete
ao ordenamento jurídico vigente, encontrando, portanto, limitações ao seu
direito de interpretar a lei vigente. A ideia embutida no conceito de juiz
advém do princípio constitucional do juiz natural, que se acha presente no art.
5º, incisos XXXVII e LII: da conjunção desses dois dispositivos, é correto
concluir que não haverá juízo ou tribunal de exceção e que ninguém será
processado senão pela autoridade competente, respectivamente. Nessa linha é que encontramos as
diferenças básicas entre árbitro e juiz. No âmbito da jurisdição, temos a
garantia, constitucionalmente prevista, de que não poderá haver juízo e nem
tribunal que sejam nomeados exclusivamente para o um caso específico. Em outras
palavras, o juízo e o tribunal apenas conforme as competências previamente
estipuladas, evitando-se, desse modo, a indicação de surpresa para decidirem
casos específicos – é a proibição dos tribunais de exceção. Também, já conforme o inciso LIII do
mesmo art. 5º da Constituição Federal, a lei deve indicar, previamente, o
sistema de competências, segundo o qual ninguém será julgado a não ser por
aquele órgão previamente designado para os casos da espécie. O juiz de direito é aquele, portanto, que exerce a judicatura conforme as regras legais vigentes e nos casos previamente indicados na legislação, não podendo ser indicado aleatoriamente para cuidar desse ou daquele caso em particular. |
9. VIRTUALIDADE:
xadrez virtual e Processo Judicial eletrônico – PJe
Os números,
claro, não são exatos. Mas estima-se que haja, atualmente, aproximados 500
milhões de praticantes de xadrez, o que coloca esta atividade entre as mais
praticadas no mundo. Segundo o site chess.com, 185 nações e
estados estrangeiros são filiados à FIDE – Federação Internacional de
Xadrez. Aliás, este site especializado
conta com aproximados 20.000.000 (vinte milhões) de jogadores atuantes, em
todos os pontos da terra. Dentre vários outros sites da rede mundial de
computadores, o chess.com permite que jogadores de distintos pontos da terra
meçam forças virtualmente. Tudo indica que nunca houve, no mundo, tantas
facilidades para se jogar xadrez como hoje. Todavia, por mais paradoxal que
possa parecer, nunca os clubes estiveram tão vazios como atualmente, levando-se
em conta a proporção de jogadores por habitante. Essa aparente contradição se explica pela
facilidade que a rede mundial de computadores oferece para a prática de jogos
em geral; através da internet, é
possível jogar, de dentro da sua própria casa e sem se deslocar, com
adversários gabaritados de diversas nacionalidades, a qualquer hora do dia ou da
noite. Em vista disso, é comum vermos clubes
tradicionais de xadrez fechando suas portas, pela frequente diminuição de
sócios e frequentadores. Alguns não conseguem arrecadar mensalidades
suficientes para pagar o aluguel de suas dependências; outros não conseguem
pagar despesas comuns, de água e de energia elétrica. De outro lado, é assente entre os
praticantes que a internet permitiu
uma maior evolução das estratégias e táticas enxadrísticas, tornando este ramo
do conhecimento humano cada vez mais desenvolvido. Antes disso, os estudiosos
aprimoravam seus conhecimentos através dos livros especializados – normalmente
caros e de difícil acesso pela barreira a língua. Partidas realizadas entre os Grandes
Mestres chegavam ao nosso conhecimento depois de alguns dias, ou semanas, com
análises precárias e superficiais. Hoje, ao contrário, podemos acompanhar as
partidas em tempo real, com análises simultâneas aos lances praticados pelos
jogadores. Além disso, o estoque de estudos na rede
mundial de computadores é absurdamente maior do que os livros comportavam,
permitindo não apenas o conhecimento e estudo mais atualizados, mas, também,
mais variados e ecléticos. Excelentes aulas virtuais estão à disposição dos
interessados, a partir de um simples apertar de botão. Tudo isso contribui para uma maior
evolução da modalidade, o que nem sempre é benéfico para o enxadrismo. Sob o
meu ponto de vista, isso contribui para uma maior cientificidade do jogo e, em
consequência, uma menor criatividade e improvisação na frente do tabuleiro.
Exemplo disso é a disputa do título mundial, entre Magnus Carlsen e Fabiano
Caruana, em novembro de 2018. Neste match,
realizado em Londres, todas as 12 partidas em ritmo clássico, quer dizer, de
xadrez pensado, terminaram empatadas, num enfadonho e frio confronto sem riscos
e sem grandes emoções. Somente no critério de desempate, com partidas rápidas,
é que o norueguês Carlsen se mostrou superior, vencendo o ítalo-americano por
3-0. Convenhamos, nada parecido com o que
aconteceu na disputa do título mundial entre soviético Boris Spassky e o
americano Bob Fischer, em 1971, na cidade de Reikjavik: com várias vitórias de
cada lado, ambos alternando a liderança em momentos diferentes da disputa, o
americano finalmente venceu por 12,5 a 8,5, naquela que foi considerada uma das
mais emocionantes de todos os tempos. Talvez, com as facilidades e avanços das
ciências da computação, a época romântica do xadrez já, definitivamente, coisa
do passado. Mas, enfim, vale a pena conhecer, além do site acima mencionado, alguns outros, como o brasileiro https://www.cxssp.com.br/ e outros dois internacionais, www.buho21.com e www.lichess.org. Não apenas para estudos: também torneios e competições acontecem no mundo enxadrístico virtual. |
A ideia é
acabar com o uso do papel nas atividades judiciais, eliminando os autos físicos
do processo. A lei 9.800/99 foi a primeira a tratar do
assunto, ao permitir a prática de atos judiciais através do uso de fac-símile, que nada mais era do que uma
avançadíssima técnica de transmissão de dados e de imagens: popularmente conhecido
como fax, a transmissão do documento
ou da petição, ou de ambos, era feita por via telefônica. Cabia, segundo essa
lei, à parte interessada juntar aos autos o documento original em até cinco
dias da data da transmissão. Foi uma verdadeira revolução em termos de
dinâmica processual, pois permitia o peticionamento de urgência, de grande
utilidade nos meios forenses para a conservação de direitos e de bens de vida. Em 2001, a lei 10.259 veio a introduzir,
de modo mais efetivo e disciplinado, o uso dos meios eletrônicos para a prática
dos atos processuais, mas no âmbito dos juizados especiais federais. Por essa
lei, ficou dispensada a apresentação do documento, ou da petição, fisicamente,
sendo eliminado o meio papel. Em 2006, a lei 11.419 estendeu o uso dos
meios eletrônicos para os processos em geral, deixando a cargo dos tribunais
locais o disciplinamento da comunicação dos atos, como
intimação e citação, através da rede mundial de computadores. Essa lei também previu
o uso da assinatura eletrônica, individualizada e realizada com senha própria
do usuário. Hoje, o PJe – Processo Judicial
Eletrônico, é uma realidade em uma imensa quantidade de juízos. Os processos
são visualizados virtualmente, pelo advogado, a partir do seu escritório;
também os juízes, mesmo fora do juízo, acessam os autos eletronicamente e
praticam os atos que lhes competem, sem manuseio físico das já antiquadas
autuações. O CPC de 2015 consagra, em definitivo, a
prática dos atos judiciais virtuais: os ARTS.
236, § 3º, 385, § 3º, 453, § 1º, e 461, § 2º, contemplam o uso da
viodeoconferência para a prática de diversos atos, como o depoimento pessoal, a
oitiva e a acareação de testemunhas. Ademais disso, os advogados podem fazer
sustentação oral, no âmbito dos recursos processados nos tribunais,
virtualmente, sem a necessidade de se deslocarem para as capitais, sedes desses
órgãos da jurisdição. A questão maior que se coloca, hoje, é a
integração de todos os juízos e tribunais num único e interligado sistema de
dados, tarefa que foi atribuída ao CNJ – Conselho Nacional de Justiça, desviado
das suas funções primevas. Tarefa árdua, diga-se, considerando-se as dimensões
continentais do nosso país. Os reflexos da informatização do Poder
Judiciário são vários, com destaque para a celeridade e economia processuais.
Com menor dispêndio de tempo, a ideia é que se obtenham melhores resultados da
atividade jurisdicional. Algumas atividades do judiciário tendem a
desaparecer, como é o caso dos funcionados do Cartório do Distribuidor. Com o
processo virtual, quem faz a distribuição do feito é o próprio advogado,
acessando a rede mundial de computadores, sem necessidade da intervenção física
de servidores, que podem ser alocados para outras funções. Em termos de logísticas, haverá de chegar
o momento em que os grandes e suntuosos prédios dos juízos e tribunais serão
desnecessários, assim como será desnecessário o grande número de servidores em
geral. Quanto aos procedimentos, lembramos que a
Ação de Restauração de Autos, prevista nos ARTS.
712 e seguintes, do CPC, certamente cairá em desuso: hoje servível para
restauração de autos desaparecidos total ou parcialmente, é bem provável que
tais eventos não mais ocorram, tendo em vista a grande quantidade de arquivos
eletrônicos de todos os atos do processo. Por fim, é interessante observar que o próprio jurisdicionado pode ter acesso ao atos do seu processo em particular, visualizando os atos nele praticados – e, diga-se, por vezes antes mesmo do próprio advogado, que certamente poderá ser cobrado sobre determinadas ocorrências. |
10.
TEMPO, XADREZ E PROCESSO: ritmo de jogo, prazos e duração razoável do processo
Um
dos mitos reinantes no mundo enxadrístico e que alguns ainda insistem em
afirmá-lo é aquele relacionado ao excesso de tempo que uma partida de xadrez
exigiria. Dizem, alguns desinformados, que uma partida é longa, interminável e
tediosa. Nada mais equivocado do
que esse raciocínio: uma partida de xadrez pode durar o tempo que os jogadores
convencionarem, seja ele qual for, pouco ou bastante, partida longa ou rápida,
conforme o gosto dos jogadores. Claro, esse raciocínio vale para as partidas
amistosas, porque, em se tratando de partidas oficiais, em torneios e
campeonatos, será o regulamento respectivo que vai tratar da duração da
partida. O tema, em xadrez, é
tratado sob o nome de RITMO DE JOGO, que nada mais é do que o controle de tempo
para cada jogador. Os jogos, tanto os
amistosos quanto os de competição, são dividas conforme o tempo convencionado: XADREZ PENSADO, XADREZ RÁPIDO E BLITZ.
Mas, claro, já houve uma época em que os jogadores de menor qualidade abusavam
do tempo para fazer suas jogadas, sendo célebres algumas partidas que duravam
dias para ser concluída, o que exasperava o opositor mais gabaritado. O ritmo de jogo pode
ser dado de várias maneiras, com destaque para as duas mais usuais: tempo para
que se efetue um determinado número de jogadas e tempo para que se conclua a
partida. Esse ritmo de jogo é marcado por um relógio especial, com dois
mostradores, que registram o tempo de cada contendor, separadamente. Feita a
jogada, aperta-se um botão que trava o relógio de um e destrava o relógio de outro,
havendo, desse modo, contagem separada para cada um. Esse relógio pode ser
mecânico, analógico, ou mais modernamente, digital, que traz maiores vantagens:
além da maior precisão na contagem do tempo, o relógio digital emite sinais
visuais e sonoros em relação ao fim da partida, afastando dúvidas sobre quem
sofreu a derrota pelo decurso de tempo. Raras, hoje em dia, são
as partidas de tempo livre, justamente para se evitar abuso de parte a parte. XADREZ PENSADO: nesta modalidade, o tempo mínimo fixado para cada
jogador concluir a partida é de no mínimo 60 minutos. Normalmente, o que vemos
são partidas com duração de uma hora e meia para cada jogador ou, então, duas
ou três horas, conforme os regulamentos próprios da competição ou o que for
convencionado nas partidas amistosas. Enfim, um tempo mais do que razoável para
a reflexão dos jogadores e conclusão da partida. Nessa modalidade de
xadrez pensado também encontramos tempo para que se realize um número mínimo de
lances e, depois, outro tempo, geralmente menor, para conclusão da partida. Em
disputas de títulos mundiais da FIDE, até recentemente, a coisa funcionava
assim: três horas para cada jogador efetuar pelo menos 40 lances, sob pena de
derrota, com suspensão da partida se ainda não houvesse um vencedor; depois, no
dia seguinte, a partida era retomada, tendo cada jogador mais uma hora para
concluir a partida. Enfim, muito tempo de reflexão e muito tempo para finalizar
a partida adiada. Mesmo assim, vários
jogadores de alto nível se viram em apuros neste ritmo, perdendo partidas
memoráveis justamente por falta de tempo. XADREZ RÁPIDO: nesse ritmo, a partida é jogada com tempo variando
entre mais de 10 minutos até menos de 60 minutos. Trata-se de modalidade em que
o tempo de reflexão é consideravelmente menor, exigindo agilidade de raciocínio
e presteza nos movimentos. Justamente por isso, as partidas são jogadas por
pessoas com um pouco mais de experiência de tabuleiro e com algumas noções de
abertura, meio jogo e final de jogo. BLITZ: ritmo que também é
conhecido como RELÂMPAGO, em que
cada jogador dispõe de no máximo dez minutos para concluir a partida, não
sobrando tempo para nenhuma reflexão mais apurada. Exige, por isso mesmo, uma
ampla e precisa visão conjunta do tabuleiro e das peças em jogo; o adequado é
que o jogador tenha um plano para a partida desde o primeiro lance e nele se
apegue com firmeza, desferindo ataques enérgicos contra o monarca adversário. É
muito comum encontrarmos campeonatos de prestígio, disputados por verdadeiros
artistas do retângulo quadriculado, em jogos com tempo máximo de dois minutos
para cada contendor: nesse caso, somente pessoas de bom nível enxadrístico é
que conseguem acompanhar o desenvolvimento da partida, dado que os lances são
efetuados como se fossem verdadeiros raios disparados a todo instante. Mesmo nestas partidas
relâmpagos, existem partidas de absoluto brilho e de alta criatividade, jogadas
por grandes mestres internacionais. Também as blitzes provocam fortes emoções, por isso são apreciadas pelo
público clubístico. Um lance equivocado, e isso é comum acontecer, pelo ritmo
imprimido, muda radicalmente a sorte da partida em algumas frações de segundo,
decretando a derrota de quem estava até então certo da vitória. As blitzes proporcionam um rápido
revezamento nas mesas, permitindo que mais pessoas joguem sem longas esperas;
de outro lado, têm o inconveniente de provocar, nos jogadores de menor
qualidade, lances automáticos e de pouca ou nenhuma reflexão, que jogam sem
qualquer técnica pela falta de tempo – e isso pode criar vícios que, depois,
serão levados para as partidas rápidas ou pensadas. Nos últimos torneios de importância mundial, os empates vêm sendo decididos na modalidade armageddon, na qual o jogador de brancas tem que vencer o adversário para ganhar o ponto; empate conta como ponto do jogador de pretas. O jogador de brancas tem 6 minutos no relógio e o de pretas tem 5 minutos. Esses
ritmos estão previstos nos regulamentos da FIDE, válidos para 2018, mas nada
impede que, em torneios diversos, sejam adotadas outras marcações de tempo, ao
gosto dos jogadores e dos organizadores. A propósito, o match pela coroa máxima do xadrez, disputado em Londres em novembro
de 2018, foi decidido, depois de uma série de 12 empates em partidas pensadas,
através de partidas rápidas, em que Magnus Carlsen se saiu vitorioso sobre o
ítalo-americano Fabiano Caruana. Em suma, o que se pratica é o xadrez com prazo determinado, conforme as hipóteses acima, para que o jogo não se arraste indefinido, sem fim. Importante:- uma vez praticado o lance, não há mais que se falar na sua repetição. De outro lado, acionado o relógio para começo da partida, enquanto não se esgotar o tempo estabelecido previamente, o jogador que, por exemplo, chegou atrasado para o começo da partida, pode realizar o lance – mas não pode ter a torna do tempo passado. Esgotado o tempo do relógio, nada mais há que se feito – é derrota na certa. |
O tempo, dizem
alguns, é o senhor da razão. O decurso do tempo nos permitiria as necessárias
reflexões para amadurecimento de ideias e de decisões a serem tomadas; contrariamente,
a rapidez de atitudes poderia ocasionar dissabores em vista da falta de
reflexão necessária para a tomada de decisões, o que equivale a dizer que a
pressa é inimiga da perfeição. Pode ser que sim, e, por vezes, o é. Em
tempos cibernéticos, de muita informação e de pouca, ou nenhuma reflexão, as
imperfeições são visíveis. Todavia, em termos de processo, o tempo é
um fenômeno que traz desgastes e prejuízos irreparáveis e para o
jurisdicionado; o decurso do tempo é que provoca esses dissabores. O tempo não
é mero fenômeno cronológico; provoca desgastes naturalmente, corrói nossa
própria vida. Quem ingressa com uma ação
precisa de proteção jurisdicional, precisa de proteção para um bem de vida que
foi violado ou que se acha em vias de o ser e, portanto, não pode ficar à mercê
do tempo que se escoa sem que a solução do magistrado lhe seja posta. As
agruras que o jurisdicionado experimenta ao ver o tempo se escoando enquanto os
processos dormem nos escaninhos da justiça e a solução não vem, é algo indescritível.
Saber que o direito está perecendo, que o
bem de vida pretendido está se deteriorando, saber que a relação jurídica que
se busca proteger está se esgarçando e se perdendo no tempo e no espaço, é
verdadeira tortura física e psicológica para o jurisdicionado. Há infinitos
casos de pessoas que morreram ao longo do tempo, cansados de esperar a tutela
jurisdicional – que, quando finalmente veio, foi para beneficiar os netos do
falecido contendor. Longe de ser um mito, essa é a realidade
da justiça brasileira, que enfrenta inegável colapso, de toda ordem: ausência
de estrutura física, ausência de magistrados, carente de operadores minimamente
preparados e imbuídos de espírito democrático, desvinculados da realidade
nacional. Despregados da vida pública e pregados às garantias constitucionais
que protegem cargos dessa esfera de poder. Verdadeiro caos, em regime de
falência, nas acertadas palavras de um alto Ministro da nossa Suprema Corte. Triste
realidade: cinco, dez, quinze, vinte anos de tramitação processual para que,
enfim, determinada decisão seja proferida, mas que, em vista do tempo que escoa
inexoravelmente, é decisão que já nenhum proveito traz para a parte. Nesse sentido é que a Constituição
Federal, em seu artigo 5º, inciso LXXVIII, prevê o direito que o jurisdicionado
tem de ver suas pretensões conhecidas e julgadas em tempo razoável, sem
dilações desnecessárias. Foi preciso que o legislador constitucional erigisse
esse direito basilar na categoria de princípio para despertar, ou menos para
tentar despertar a atenção dos magistrados para as agruras do tempo. Ledo
engano, pois absolutamente nada mudou, mesmo depois de passados catorze anos da
previsão constitucional. É interessante notar que, em tempos de
morosidade processual, um ditado foi enraizado em nossa sociedade: a justiça
tarda, mas não falha. Como se disséssemos: vamos tomar cuidado com nossos atos,
com nossas decisões, pois a justiça vai agir, ainda que não agora, mas vai agir
de modo drástico, seguro e sem falhas de qualquer espécie ou natureza. Ora, nada mais falso do que isso: Ruy
Barbosa, há uma centena de anos, já dizia exatamente o contrário: justiça
tardia nada mais é que injustiça institucionalizada. E não há que se dizer que a pressa é
inimiga da perfeição; não é correto dizer que a rapidez causa insegurança
jurídica, ou que provoca decisões equivocadas. Bobagem, não há como colar
automaticamente uma coisa na outra. Assim como é errado dizer que a justiça
tardia é justiça segura, também é errado dizer que a justiça rápida é insegura.
Bobagens que se dizem impensadamente. Segurança e rapidez podem e devem andar
juntas; ambas são necessárias para aquele que tem um bom direito em disputa.
Dito em outras palavras, a morosidade somente socorre quem não tem um bom
direito em disputa, só ajuda aquele que não quer ver a decisão judicial, porque
sabe que será sucumbente. Um
código de processo civil constitucionalizado e democrático não é suficiente
para a solução desse tipo de problema; uma Constituição Federal moderna e avançada
para os padrões internacionais também não é, por si só, capaz de provocar as
mudanças necessárias em termos jurisdicionais. Uma boa Constituição e um bom
código processual exigem um bom operador do direito; o novo perfil do processo
civil exige um novo perfil de operador do direito. Um bom a moderno ordenamento
jurídico depende de juízes, promotores, procuradores e outros servidores da
justiça que sejam bons, modernos e atualizados. Sem isso e sem tribunais com
logísticas modernas e atualizadas, não há esperança de que esse triste quadro
mude; pelo contrário, o inexorável passar do tempo só faz piorar as coisas. É bem verdade, diga-se, que o atual
código processual traz mecanismos suficientes para, por exemplo, permitir
cognição e decisão sumária, rápida, célere, para casos de urgência. São as
chamadas tutelas provisórias de urgência, de natureza acautelatória ou
antecipatória. Protegido o direito ou o bem de vida, então é que se passa ao
contraditório e a ampla defesa. Assim, nos casos em que o direito, ou o bem de vida, ou a relação jurídica, pode perecer em instantes, rapidamente deve o advogado agir e buscar tutelas imediatas, para evitar o efeito danoso do transcurso do tempo. Mas, para isso, é necessário que o magistrado resulte convencido basicamente da urgência e dos perigos da morosidade jurisdicional. Sem esses requisitos, os processos se prologam pela vida forense e se eternizam, sem solução para o jurisdicionado. Assim, nos
casos em que o direito, ou o bem de vida, ou a relação jurídica, pode perecer
em instantes, rapidamente deve o advogado agir e buscar tutelas imediatas, para
evitar o efeito danoso do transcurso do tempo. Mas, para isso, é necessário que
o magistrado resulte convencido basicamente da urgência e dos perigos da
morosidade jurisdicional. Sem esses requisitos, os processos se prologam pela
vida forense e se eternizam, sem solução para o jurisdicionado. DA PRECLUSÃO: no processo vigora a ideia das preclusões, ou seja, da perda do direito de praticar o ato judicial. Isso se dá justamente para que o processo não se arraste infinito, sem a solução desejada. A preclusão é chamada de lógica quando a parte pratica um ato incompatível, incongruente, em relação a um ato anterior (por exemplo, quem cumpre a sentença voluntariamente e em seguida contra ela apresenta recurso); também é chamada de preclusão consumativa, que ocorre quando o ato está praticado, impedindo, pois, que seja praticado novamente; por fim, chama-se preclusão temporal a que se verifica pelo esgotamento do tempo definido em lei ou pelo juiz sem a prática do ato. Em qualquer dos casos, prazo precluso significa impedimento à prática do ato. |
11. ATOS PROCRASTINATÓRIOS: iniciativa, perda de tempo e duração
razoável do processo
No xadrez,
obrigatoriamente o jogador de peças brancas é quem inicia a partida; é ele quem
abre o jogo, faz a movimentação de sua peça e fica aguardando o oponente, que
joga de pretas, fazer a resposta. Então, novamente o jogador de brancas
movimenta uma peça e aguarda a resposta do oponente, e assim sucessivamente,
com o desenvolvimento da partida até o seu final. O que é importante fixar é que, tendo as
brancas a oportunidade de começar a partida e de continuar jogando sempre antes
do seu adversário, logicamente terá aquilo que em xadrez se chama de
iniciativa. Assim, a abertura, o meio de jogo e o final de jogo são conduzidos,
conformados, moldados, pela iniciativa das brancas – ou, pelo menos, é o que em
tese deveria acontecer. Abstratamente falando, as peças pretas
estariam sempre respondendo a um lance das brancas, estariam movimentando suas
peças para se defender dos ataques adversários; em suma, o movimento das pretas
estaria sendo feitos em conformidade com o que foi, antes, jogado pelas
brancas. Todavia, não é bem isso o que ocorre numa
partida de xadrez, pois é um muito comum, mormente entre os jogadores menos
experimentados, aquilo que chamamos de perda
de um tempo, quer dizer, o jogador de brancas cede a iniciativa para o oponente,
invertendo o quadro. Essa perda de tempo ocorre, quase sempre,
por dois motivos: ou o jogador de brancas movimenta a mesma peça duas vezes na
abertura ou, então, movimenta uma peça sem qualquer objetividade, dando
oportunidade para que seu adversário tome a iniciativa da partida, com
movimentos precisos que exigem e condicionam as respostas da branca. Um dos postulados básicos do xadrez é o
domínio do centro do tabuleiro. Isso quer dizer que os jogadores lutam, na
abertura, pelo domínio das quatro casas centrais do campo de guerra, cada qual
instalando ali as suas peças. Lógico que são as brancas que tem a oportunidade
de conseguir isso primeiro, antes das pretas. Portanto, que o faça, sem demoras
e sem perda de tempo, sob pena de o adversário, de pretas, dominar primeiro as
casas centrais. Outras hipóteses vão surgindo durante a
partida, que bem ilustram a importância da iniciativa: por exemplo, é
fundamental que o jogador domine as colunas abertas no tabuleiro; quem primeiro
instalar ali uma torre, ou uma dama, dominará a coluna e terá melhores
condições de ataque; se esse domínio ocorre com torres dobradas, melhor ainda.
Enfim, o jogador que tiver o domínio da coluna terá maiores chances de sair
vitorioso. Para que isso aconteça, é necessária a iniciativa, fazer o primeiro
lance nesse sentido, privando o adversário desse importante domínio. Também pode servir de exemplo outra
máxima do xadrez: quando os adversários fizerem o roque de lado oposto, ou
seja, um faz o roque menor e o outro faz o roque maior, o jogador que primeiro
atacar o roque adversário certamente ganhará a partida. E, claro, chegará
primeiro à fortaleza adversária aquele que mantiver a iniciativa. A isso se dá
o nome de ataque cruzado, considerando a posições dos roques efetuados. Portanto, as noções sobre iniciativa de jogo
são elementares para o xadrez. O que se recomenda, então, é que jogador das
brancas não perca tempo, para não perder a iniciativa do jogo. Que não se deixe
perder por lances inexpressivos e sem objetividade, e que evite movimentar a
mesma peça duas vezes, sobremodo na abertura do jogo. Se, pelas regras do jogo,
é do jogador de brancas, é dele o lance inicial, então ele deve manter essa
iniciativa, sem ceder o passo para o adversário. Outra ideia difundida é a de que,
iniciado um ataque, que o faça com firmeza e decisão, sem recuos, sem perdas de
tempo, para não permitir a reorganização do exército adversário. Claro, para
isso, há que se pensar bem sobre a conveniência de se atacar, avaliar as posições,
fazer o cálculo dos movimentos, contar as quantidades de ataques e de defesas,
para só então partir para a execução do plano. Em xadrez isso faz uma diferença muito
grande para a conclusão da partida. Todavia, em algumas situações específicas, o jogador deverá, ao contrário, efetuar um lance de espera, para saber a conduta do adversário ou para vê-lo efetuar um lance que lhe sirva; também haverá ocasiões em que um recuo tático de uma peça é mais conveniente, fugindo à regra geral. Em outras palavras, por vezes uma espera ou um recuo ajuda muito. |
O processo será
aberto, necessariamente, pelo autor, por aquele que é detentor do direito
lesado ou em vias de o ser. Será sempre dele, portanto, o “lance de abertura do
processo”. E isso será feito através da petição inicial, produzida nos moldes
do art. 319 e seguintes do CPC. Todavia, diferentemente do que ocorre no
jogo de xadrez, no processo não será o réu a fazer o imediato “segundo lance”:
vezes há em que o próprio autor o pratica, ADITANDO (art. 329) a sua petição inicial, por exemplo. Ou, então, será o juiz a
praticar o segundo ato do processo, exercendo JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE (ar. 321); no caso de haver juízo
negativo de admissibilidade, o juiz deverá determinar EMENDA (art. 321) da petição, ocasião em que caberá a prática do
ato ao próprio autor. Enfim, somente depois dessas hipóteses é
que o réu, se deferida a petição inicial, irá praticar atos no processo, de
maneira que não há a mesma sequência prevista para o jogo de xadrez. De todo modo, é certo que a iniciativa
para abertura do processo cabe ao jurisdicionado, ao autor, conforme PRINCÍPIO DISPOSITIVO (art. 2º), o que
significa dizer que o processo apenas se inicia por provocação da parte
interessada, com as exceções da lei. Entretanto, uma vez iniciado o processo,
caberá ao juiz determinar as providências necessárias para o regular andamento
do feito, até final julgamento, o que é chamado de impulso processual. Na hipótese de o autor abandonar o
processo, sem praticar os atos que lhe competirem, para o regular
desenvolvimento da atividade jurisdicional, o processo poderá ser encerrado sem
julgamento de mérito, conforme prescrições do art. 485, II e II. No que diz respeito ao réu, cabe a ele se
defender, apresentando CONTESTAÇÃO (art.
355), através da qual impugnará as pretensões do autor. O réu não é
obrigado a apresentar defesa, de modo que poder poderá, ao longo do processo,
manter-se inativo, sem praticar qualquer ato; todavia, se isso ocorrer, por
certo sofrerá consequências danosas, com provável sucesso do autor em seus
pedidos. A falta de contestação já levará à
decretação da REVELIA (art. 344), o
que permitirá ao juiz reputar verdadeiros os fatos alegados pelo autor na sua
petição inicial, com evidentes prejuízos para o réu. A par disso, é necessário esclarecer que
a parte ré também pode fazer pedido em face do réu, movimentando a RECONVENÃO (art. 343); nesse caso,
caberá a ele a praticar os atos necessários para o andamento do processo, ao menos
no que é pertinente ao seu pedido reconvencional. No mais, no processo todos têm prazo para
a prática dos atos que lhe competem; os prazos destinados às partes são
chamados de PRÓPRIOS, enquanto que
os destinados ao juiz e aos demais servidos são chamados de IMPRÓPRIOS. A desobediência dos prazos
próprios leva à perda da oportunidade de praticá-lo, com consequências que
podem ser danosas para a parte; já o não cumprimento dos prazos impróprios pode
levar, quando muito e ao menos em tese, a consequências administrativas – o que
é extremamente raro de se ver. Diferentemente do xadrez, em que há um
prazo marcado para o término da partida, no processo o que encontramos são
prazos para a realização dos atos de per si. Como tal, encontramos o prazo de
15 (quinze) dias para: aditamento (art.
329) e emenda (art. 321) da
petição inicial; apresentação de respostas pelo réu (art. 335); apresentação de recursos pelas partes, com exceção dos
Embargos de Declaração (art. 1003, § 5º);
cumprimento de sentença de pagar quantia certa (art. 523), dentre outras hipóteses. Também há prazos menores, como, por
exemplo: o prazo de 5 (cinco) dias para apresentação de Embargos de Declaração (art. 1.003, § 5º). Por fim, destaque
também para o prazo menor ainda, de 3 (três) dias, para pagamento de quantia
certa na execução de título extrajudicial (art.
829) e pagamento de alimentos na execução respectiva (art. 528). Aqui estão listados só os principais
prazos do cotidiano forense. Quanto aos prazos impróprios, o juiz tem o prazo
de 5 dias para proferir os despachos, 10 dias para as decisões interlocutórios
e 30 dias para as sentenças, prazos que normalmente não são cumpridos por
alegado acúmulo de serviço, conforme art.
226. No mais, as regras processuais coíbem a LITIGANCIA DE MÁ-FÉ (art. 79), impondo multas e outras sanções para quem impedir ou atrapalhar a marcha do processo. |
12. INDUMENTÁRIA E CONDUTA: silêncio, posturas e roupas
adequadas
Silêncio
absoluto, por favor, pois o xadrez é um jogo de reflexão, é jogo pensado e
raciocinado. Exige planejamento e é executado mediante cálculos matemáticos
efetuados durante a partida. Concentração absoluta, pois, é necessária para
ambos os contendores. Algumas regras básicas devem ser seguidas
pelos aficionados, seja em torneios e campeonatos, seja em salões, em encontros
amadores, para permitir o bom andamento das partidas. Como já foi dito acima, palpites nas
partidas alheias são imperdoáveis, geram aborrecimentos e exaltam os ânimos.
Quem está de fora, assistindo, normalmente enxerga melhor os lances, vê mais
longe, porque não está afetado pelo aspecto psicológico e emocional do jogo;
mesmo assim, melhor ficar quieto, não interferir na partida e espera a sua vez
de jogar. Fumaça e cheiro de cigarro são
insuportáveis para algumas pessoas, sobremodo em ambientes fechados. O grande
mestre internacional Victor Korchnoi, russo de nascimento, cachimbava durante
as partidas de torneios oficiais, com os jogadores dentro de verdadeiros
aquários de vidro, que os separava do público. Isso era socialmente aceito,
hoje, não mais. O que dizer, então, do maldito telefone
celular? Não, absolutamente não combina com o xadrez: ou você pensa e joga, em
respeito ao adversário, ou sai da mesa. Intolerável! Trejeitos e manias particulares devem ser
repensados; coçar a cabeça, cutucar espinhas, mexer no nariz e na boca, enfim,
são situações extremamente desagradáveis. Imagina que você, depois disso tudo
ainda vai tocar as peças do tabuleiro, as quais, de sua vez, também serão
tocadas pelo adversário. E vai, ao final da partida, esticar a mão para o
adversário, causando repulsa e asco. Muita atenção nisso! Atenção também para o
modo de sentar na cadeira: postura ereta em relação ao espaldar, para sua maior
comodidade; mantenha o rosto afastado do tabuleiro, para não incomodar o
adversário; pernas dobradas adequadamente e não escanchadas; sem batuques na
mesma ou no chão, com o sapato. Outros cuidados básicos: não fale com o
adversário, a não ser para lhe cumprimentar e desejar um bom jogo. Nada mais;
se, porém, for arrumar uma peça que esteja mal colocada numa casa, antes peça
licença para isso. Também não fale com o árbitro, a não ser quando estritamente
necessário e sem criar tumultos: trave o relógio e erga o braço e, então, ele
virá até você. Desagradável é ver o adversário
derrubando peças e desarranjando o tabuleiro. Cuidado, pois, com o movimento
das mãos e dos dedos. Transporte a peça de uma casa para a outra com energia e
segurança, não a deixe cair. Reflita antes de fazer o movimento e só o faça
quando estiver seguro sobre a melhor jogada. Não retenha a peça em sua mão sem
depositá-la de imediato na casa de destino. Pense antes de tocá-la: peça tocada
é peça jogada, o adversário tem o direito de exigir que jogue a peça que tocou.
Também não fique com a mão sobre a peça: é deselegante e atrapalha o raciocínio
do adversário. A história enxadrística registra alguns
casos curiosos: certa feita, um jogador teria reclamado para o árbitro sobre a
roupa que sua adversária usava: a moça, bonita e atraente, exibia um generoso
decote, que distraia a atenção do jogador reclamante. Apesar de sua superior
qualidade, o homem estava em desvantagem na partida e não demorou a encontrar a
razão dessa inesperada inferioridade posicional: pediu a interferência do
árbitro para que a moça se cobrisse melhor. Consta, também, que o mesmo Victor
Korchnoi, que já mencionei, ficou irritado, durante match (série de partidas contra um mesmo oponente) de que participava:
a razão é que o seu adversário o fitava constantemente, de modo constrangedor;
efetuava o lance rapidamente e encarava Korchnoi, olhos nos olhos,
profundamente, impassivelmente. Desconcertado com o peculiar acontecimento,
Korchnoi resolveu o problema de modo bem original: para as próximas partidas,
passou a usar óculos de lentes grandes e espelhadas, que eram novidades na
época. É
incrível como alguns jogadores demonstram fisicamente os abalos emocionais que
sofrem durante as partidas. É interessante observar as reações de quem está
perdendo ou de mesmo de quem está ganhando. Caretas, esgares de olhos,
movimento dos dedos, dos pés, enfim, os jogadores dão uma série de sinais que
indicam o seu estado de espírito, principalmente entre os aficionados amadores. Alguns bufam, correm as mãos pelo rosto e
pelos cabelos, estalam os dedos; outros riem, de nervoso, certamente; outros
estalam a língua, balançam as pernas, movimentam-se constantemente na cadeira.
Conheci um que, em situação de apuro e sem se decidir sobre o melhor lance,
olhava o tabuleiro e o relógio; se afligia com tempo se escoando e então, sem
saber que peça jogar, batucava o Bolero de Ravel: ia num crescendo bonito e
ritmado, e essa era a deixa para todos saberem da sua situação desesperadora. Os grandes jogadores, todavia, não se
abalam. Estão mentalmente preparados para o jogo e encaram impassíveis as mais
diversas situações do tabuleiro. Não demonstram aflição, nem alegria e nem
tristeza; absortos e sem mexer um músculo sequer, pensam e movem as peças.
Concentrados, são de uma frieza polar, ganhando ou perdendo, em boa ou em má
situação posicional, tanto nas partidas amadoras como nas que valem títulos
oficiais. Impressionam os assistentes. Xadrez é jogo de cavalheiros; os
adversários se cumprimentam antes da partida e desejam, reciprocamente, que
façam um bom jogo. Não desejam boa sorte, pois que não é um jogo de azar, e sim
de conhecimento, de estudos e de reflexão. Ao final da partida, o vencido
reconhece a vitória e parabeniza o vencedor, apertando-lhe a mão. E, mais, o derrotado não arranja
desculpas para a derrota. Coisas do tipo: perdi porque não estava num bom dia;
perdi porque o barulho de não sei o que me atrapalhou; perdi porque isso ou
aquilo. Essas falas nunca são bem vindas. Na verdade, perdi porque o adversário
jogou melhor, perdi porque ele tem mais conhecimento enxadrístico do que eu. É
simples assim. José Raul Capablanca, o grande e imortal mestre cubano, dizia que nós aprendemos mais com as derrotas do que com as vitórias. Sábio pensamento, esse. Por fim, nada de soberba com as vitórias: segundo um provérbio italiano, no fim do jogo, rei e peão voltam juntos para a mesma caixa. |
Fumar em
ambientes fechados, nunca mais; em ambientes abertos, o uso de fumígeros já vem
encontrando sérias limitações. Celular, jamais, salvo raríssimas exceções. Trejeitos,
palavras, gestos, vestimentas, enfim, para tudo há um limite. Na advocacia, existe um Código de Ética
e Disciplina, que estabelece regras de conduta e que consta da Resolução
02/2015, do Conselho Federal da OAB. Ali estão traçadas as condutas éticas
exigidas para os advogados e estagiários, incluindo relações com os clientes,
com os colegas, autoridades e servidores públicos em geral. Também as questões atinentes ao sigilo
da profissão, à publicidade do advogado e aos honorários se acham disciplinadas
no referido Estatuto, cabendo ao advogado o dever de zelar pelo cumprimento das
suas prerrogativas, em juízo ou fora dele. Além das prerrogativas próprias do
advogado, existe também uma necessidade de cumprimento das regras a ele
imposta; havendo conduta inadequada, o profissional estará sujeito às apurações
administrativas que podem levar a diversas punições: advertência, suspensão
temporária do exercício da profissão ou, conforme a gravidade dos fatos,
exclusão dos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil. Dentre as situações mais comuns, é
interessante mencionar que o advogado não pode conversar diretamente com a
parte contrária, quando esta for assistida por outro advogado. Nesse caso,
eventuais conversas devem se dar apenas entre os que representam as partes, de
modo a se evitar constrangimentos desnecessários e incabíveis. Também é necessário o uso de linguagem
escorreita e polida, através das técnicas processuais adequadas, não se
admitindo participação em eventos de mídia para promoções pessoais e nem
manifestações sobre condutas de outros colegas de profissão. No decorrer das audiências,
deverá tratar as partes e os demais partícipes do evento com polidez, de modo
compatível das regras de urbanidade e boa convivência, respeitando a boa-fé
processual. Roupas adequadas nas salas de audiência
são obrigatórias. Muitas vezes já ocorreu de o juiz determinar a saída da sala
de audiência daquele ou daquela que se apresenta com vestimenta imprópria, o
que causa desconforto para todos. Apesar de vivermos em um país tropical,
com fortes temporadas de calor intenso, ainda adotamos, por herança de
colonizado, vestimentas europeias, como paletó e gravata, impróprios para o
nosso clima. Já houve casos em que o Judiciário permitiu o uso de mangas curtas
no recinto forense, em virtude de forte onda de calor, mas, na ocasião, os
próprios advogados, em sua maioria, se negaram ao uso da benesse, preferindo a
transpiração à flexibilização do costume. Camisas regatas, abertas ou decotadas,
bermudas, bonés e chapéus, jamais – nem estagiários e nem as partes litigantes.
No ambiente forense, ainda se exige o uso de paletó e de gravata, para homens,
e de vestido, ou saia, para mulheres – se bem que, em relação a elas, já se
toleram as calças compridas, o que é mais do que razoável. O advogado deve sempre lembrar que o
litígio é do seu cliente, e não seu. Os fatos é que devem ser debatidos na
ação, e não a pessoa do réu ou do advogado ex
adverso. Apaixonar-se pela causa pode não ser uma boa
opção, sob pena de tornar passional a atuação do advogado. Aliás, é por isso
que não se recomenda o patrocínio de interesses próprios em juízo, e nem de
parentes ou de amigos íntimos. Não há vedação legal para tanto; todavia, é
muito difícil separar as paixões e interesses próprios ou próximos da correta
conduta profissional. E essa mistura de canais não traz, por certo, bons
resultados. O processo, enfim, é um jogo de
cavalheiros. Saber jogá-lo com ética e profissionalismo é condição essencial
para a boa advocacia. Por isso, as derrotas, ou sucumbências, são inevitáveis,
fazem parte do cotidiano forense. Saber perder talvez seja até mais importante
do ganhar: é das derrotas que tiramos os proveitos e conhecimentos necessários
para as próximas vitórias. Entretanto, há que haver cuidado com a
responsabilização civil: o advogado exerce uma atividade de meios e não de
fins. Quer dizer, o advogado não se obriga a conseguir um resultado y ou z,
não se obriga a ganhar a ação, mas se obriga a empregar todas as técnicas
processuais necessárias para obtenção do melhor resultado possível para o seu
cliente. Derrotas são admissíveis e acontecem em
todo momento; todavia, derrotas advindas do mau uso ou do não uso das técnicas
processuais levam, no mais das vezes, à responsabilidade civil do advogado, que
terá, em ação própria, ressarcir ao cliente os danos que provocou com sua
negligência. Trejeitos e manias particulares devem ser
repensados. Em sala de aula, em sala de concursos e exames, na sala de
audiência, com o cliente ou, enfim, em qualquer momento da atividade jurídica,
muito cuidado com os pequenos atos, que por vezes nem percebemos. Coçar a cabeça, cutucar espinhas, mexer
no nariz e na boca, enfim, são situações extremamente desagradáveis. Imagina
que você, depois disso tudo ainda vai tocar nos autos do processo, em
documentos ou objetos, os quais, de sua vez, também serão tocados e manuseados pelo
adversário. Por fim, ainda vai esticar a mão, em cumprimentos, aos demais
circunstantes, causando repulsa e asco. Muita atenção nisso! Atenção também para o modo de sentar na
cadeira: postura ereta em relação ao espaldar, para sua maior comodidade;
mantenha o rosto afastado da mesa de trabalho para não incomodar o cliente, o
juiz, o promotor, enfim, aqueles que o cercam; mantenha as pernas dobradas
adequadamente e não escanchadas; sem batuques na mesma, com os dedos e mãos, ou
no chão, com os sapatos. Cigarros, nem pensar nisso! Celulares,
apenas e tão somente com autorização prévia de quem preside o ato; no
escritório, apenas para consultas jurídicas, com o cliente já sabendo o que
você vai fazer.
Enfim, são regras básicas comportamentais
que tornam os contatos mais agradáveis e sadios, seja nas reuniões de grupos de
estudo, seja nos trabalhos forenses ou no escritório, nas salas de aulas e
demais ambientes públicos. |
13. OBJETIVOS: o xeque-mate e a sentença de mérito
Olhando o
xadrez como um jogo, tem que ficar assentado, pois, que o objetivo final do jogador
é a obtenção da vitória. Sempre. Xadrez é jogo para sobrepujar o adversário
e se tornar vencedor, é jogo de ataque, é jogo de ameaças, que se executa
através de estratégias e de táticas. Não se joga xadrez por jogar, não se joga
apenas para passar o tempo; joga-se para ganhar, para vencer, para derrotar o
adversário, mediante lances previamente estudados em busca da meta final. A apatia e a falta de dinamismo não combinam
com o enxadrismo; coisa chata é a movimentação de peças aleatoriamente, sem
objetividade e sem ataque. É modorrento e desanima. A ideia do jogo é impor a morte do rei
adversário, através do xeque-mate. Há que se ter espírito regicida, vontade de
matar o rei. Quando me deparo com aluno com passividade e sem agressão, costumo
pedir para que ele fale, em voz alta e em bom som: quero matar o rei! Quero
matar o rei! Grite: QUERO MATAR O REI!!! Entretanto, uma nota necessária e
oportuna: é um jogo que se joga com extremo respeito ao adversário, é um jogo
de fidalgos e de espíritos esportivos elevados. Subjuga-se o rei adversário, e
não o adversário. Mata-se o rei adversário, e não o adversário. Nesse sentido, a primeira lição que se
aprende é a necessidade de cumprimentar o adversário com um aperto de mão,
desejando bom jogo. Só depois disso é que se executa o primeiro lance. Ao
final, o derrotado reconhece a derrota e cumprimenta o vencedor, com respeito e
educação. Dito isto, voltemos. Xadrez é jogo de ameaças
ao exército adversário. Cada movimento é feito com vistas a atacar o território
adversário e, tanto quanto possível, uma peça do inimigo. Feito isto, o
adversário se sentirá obrigado a defender seu território, a defender a peça
atacada – e com isso, o jogo vai ganhando dinamismo e emoção. Há jogadores que preferem jogar com o par
de bispos e evitam, tanto quanto possível, mantê-los sobre o tabuleiro; assim
também há jogadores que não gostam de jogar contra bispos adversários – e esses
são os que têm espírito episcopalicida, quer dizer, os que têm vontade de
eliminar o bispo adversário. De outro lado, vamos encontrar situações
em que se joga para empatar. Isso acontece quando um jogador se vê com
desvantagem material, ou seja, com menos peças que o adversário; então, para
fugir da derrota, procura situações de empate, para minimizar os prejuízos. Outra situação em que isso acontece é na
rodada final de alguns campeonatos, em que aqueles que já não têm chances de
boa classificação jogam pela igualdade; nesses casos, é muito comum vermos a
realização de apenas um lance de cada lado e já ambos se manifestam pela
igualdade, sem luta. Esta última situação, embora muito criticada porque subverte os objetivos do jogo, acontece com muita frequência, mesmo em disputas de maior prestígio. |
Processo não
tem finalidade consultiva; aliás, a jurisdição, que é o poder/dever do estado
de dizer e de realizar o direito em face do qual se encontra resistência, tem
finalidades típicas, visando à solução dos conflitos de interesses. Desse modo, o processo é uma relação
jurídica de caráter instrumental para realização de direitos. A parte que sofre
lesão a direitos ou que está em vias de sofrer essa lesão, tem o direito
constitucional de ação, isto é, tem a garantia de livremente acionar o
judiciário em busca da reparação da lesão ou em busca de uma medida preventiva,
que impeça lesão de ameaça. Não se faz uso, pois, das vias
jurisdicionais para outros fins que não seja a tutela, ou proteção, de
direitos. Dito isto, já é de se ver que o processo
é usado para atacar as posturas e condutas do adversário, pelo qual o autor
deduz uma pretensão que deve ser albergada pela sentença de mérito. Pelo menos
é isso que o autor espera; é por essa finalidade que ele empreende uma luta aguerrida
e continuada, até a vitória final. Não se imagina, pois, processo sem luta,
sem contenda, ao menos por parte do autor – isto porque o réu poderá, sem
dúvida, quedar-se inerte, sem apresentar respostas, com o que estará sujeito à
derrota quase certa. Uma exceção a essa afirmativa se encontra
na jurisdição eleitoral, em que se permite, além da busca de solução para
conflitos eleitorais, também o fazimento de consultas relacionadas ao tema. A finalidade do processo, portanto, é a
obtenção de um provimento final vitorioso, através da sentença de mérito (ART.
487). Sendo o pedido do autor julgado procedente, terá ele experimentado uma
vitória sobre o réu; do contrário, sendo o pedido julgado improcedente,
experimentará ele uma derrota. A luta, pois, no curso do processo, é pela
vitória, é a busca da tutela jurisdicional. Entretanto, também aqui vale lembrar que
a luta é pelo direito. A propósito, vale lembrar a obra de Ihering, A luta pelo direito,
em que o autor alemão discorre sobre a necessidade de se lutar para a garantia
dos nossos direitos. Através do processo se luta em favor dos
direitos, contra, portanto, os abusos e contra as ilegalidades. Não se luta
propriamente contra o adversário, contra o réu. Sim, o conflito é pessoal, mas
a contenda é jurídica, e não física. Sobremodo em relação ao advogado, este
lembrete é importante: a causa, o conflito, é do seu cliente; os interesses em
disputa são do cliente e não seus. Não é ele, pois, que litiga, mas o seu
cliente. Assim, não há que se admitir confronto
entre o advogado e a parte contrária – antes, pelo contrário, a cordialidade e
educação devem de reinar entre ambos. Por fim, umas rápidas palavras sobre a jurisdição voluntária, art. 719: ali não há sequer processo, não há conflito de interesses e nem pretensão resistida. Trata-se de função jurisdicional atípica. |
14. AUTOCOMPOSIÇÃO: empates legais ou convencionados e
solução negociada dos conflitos
O xadrez, como
jogo, é competição, é disputa, com cada um dos contendores buscando a vitória
final. É luta, é batalha, em que os contendores dispõem e movimentam suas peças
de modo agressivo, partindo impiedosamente para cima do exército adversado,
acirrando a disputa e causando constante tensão no centro da arena. O objetivo final é a morte do rei
adversário. Para se jogar xadrez é preciso ter vontade ganhar, de buscar a
vitória, de acordo com um sistema de jogo, com um bom planejamento e uma boa
execução de lances. Mais que tudo, é preciso ter ímpeto, vontade de agredir e
de vencer o exército adversário. Não é um jogo passivo, não é para
apáticos. No xadrez, o espírito regicida
é fundamental e imprescindível! Morte ao rei, pois! É
uma atividade que dá nos nervos e faz derramar adrenalina em todo nosso sistema
corporal. Tal como nas artes, o xadrez também teve sua fase romântica,
filosofia que predominava por volta do Século XVIII e que se contrapunha ao
Iluminismo e ao racionalismo científico e cartesiano. Os enxadristas românticos pouco se
preocupavam com a estrutura teórica de peões e com o desenvolvimento harmônico
e cauteloso das peças pelo tabuleiro; ao contrário, desferiam ataques
lancinantes ao rei adversário com base na criatividade e na alegria de jogar,
desprezando métodos científicos mais apurados. Com isso, as reviravoltas
durante o jogo se verificavam mais amiúde e vitórias aparentemente certas se
transformavam rapidamente em derrotas. Empates dificilmente ocorriam. Para alguns jogadores, entretanto, essa
atitude impetuosa cede lugar para o xadrez mais científico, mais moderado, em
que a reflexão e a cautela, a segurança das posições e a sobriedade de
movimentos são os elementos basilares da vitória final. O xadrez científico vem
tomando o lugar, gradativamente, do xadrez romântico. Nos últimos cem anos, aproximadamente,
o estudo do xadrez muito se aprofundou e se exige, cada vez mais do jogador
competitivo, um profundo conhecimento de estratégias e de desenvolvimento
harmônico de peças, a partir de um bom plano de jogo. Um pequeno erro cometido
logo na fase de abertura será habilmente explorado pelo adversário e será o
suficiente para decretar a derrota do jogador desatendo. Com o advento das
ferramentas de informática, cada vez menos se pratica o xadrez romântico. De outro lado, essa mudança de perfil dos
jogadores leva a que muitas partidas terminem em empates, sem vitória deste ou
daquele, principalmente no xadrez de alto nível, praticado por mestres
nacionais e internacionais. Algumas técnicas foram desenvolvidas para permitir
esse tipo de resultado, levando o desenvolvimento das peças para o empate
forçado. Sim, o empate pode advir do comum acordo entre os jogadores, quer
dizer, por mútuo consentimento, ou, então, pode advir da colocação das peças
sobre o tabuleiro. O empate por mútuo consentimento depende
única e exclusivamente dos jogadores. Basta que ambos optem por esta solução e
a partida terminará sem um vencedor, situação em que cada um deles será
agraciado meio ponto. Para que isso ocorra, basta que seja feito apenas um
lance e a partida já poderá ser encerrada com empate. Em xadrez, usa-se
frequentemente a palavra tablas, de
origem espanhola, para se referir a esse acontecimento. Por certo esse final é sem graça, pois
que despreza o essencial do xadrez: a luta contra o rei adversário. Muitas
vezes isso acontece nas últimas partidas de um longo torneio em que os
jogadores já não têm mais condições de obter boa colocação e nada mais aspiram
em termos de premiação ou destaque. E não é raro acontecer de esse tipo de
empate prejudicar outro jogador que depende da derrota deste ou daquele para
conquistar um título. Já aconteceu de dois jogadores chegarem à última rodada
de um campeonato com diferença de apenas um ponto entre eles, um na primeira
colocação e o outro na segunda. Como o segundo colocado dependia da sua vitória
e da derrota do rival, suas expectativas de dividir o primeiro lugar foram
frustradas pelo empate de comum acordo que na outra partida. De outro lado, também há diversas
situações em que o empate decorre da posição das peças no tabuleiro ou, então,
exatamente pela falta de peças suficientes para que a partida termine em
vitória de um dos exércitos. É tecnicamente impossível o xeque-mate
quando restarem apenas: rei contra rei; rei e um cavalo contra rei; rei e dois cavalos
contra rei; rei e um bispo contra rei. Quando remanescem sobre o tabuleiro rei
e dois bispos contra o rei adversário, ou rei, bispo e cavalo contra rei, o
mate é perfeitamente possível: com dois bispos, a tarefa é até razoavelmente
simples; já no segundo caso, rei, bispo e cavalo devem ser manejados com
precisão e maestria pelos grandes jogadores para obtenção da vitória. Outras situações também levam ao empate: REI AFOGADO, XEQUE PERPÉTUO, REPETIÇÃO DE
LANCES e 50 JOGADAS. REI
AFOGADO: o afogamento do rei ocorre nas situações em que, não estando sob
xeque, o rei não pode se movimentar para qualquer outra casa, tendo que
permanecer fixo onde se encontra; ao mesmo tempo, o adversário não tem qualquer
outra peça para movimentar, porque estão bloqueadas pelas peças adversárias ou
porque, ao se movimentarem, colocarão o seu próprio rei em xeque. Não havendo,
pois, movimentos lícitos a serem feitos, a partida terminará por empate. Alguns
jogadores, vendo-se em situação de inferioridade e diante de iminente derrota,
manejam suas peças de modo a provocar o afogamento e, assim, salvar pelo menos
meio ponto. XEQUE
PERPÉTUO: esta modalidade de empate ocorre quando um adversário repete o
mesmo xeque por no mínimo três vezes seguidas; o rei toma xeque, se afasta para
outra casa, onde também recebe novo xeque; então volta para a casa primitiva e
novamente recebe xeque, e assim sucessivamente. Essas manobras impedem a
sequência da partida e a realização do mate. REPETIÇÃO
DE LANCES: a partida também terminará empatada quando os dois jogadores
repetirem as mesmas jogadas três vezes seguidas. Quer dizer, a mesma peça de um
e de outro jogador vai e volta para a mesma casa três vezes seguida, sem
seguimento objetivo da partida. Pode ocorrer de propósito, quando um não quer
pedir o empate para o outro, por receio de recusa. A REGRA DAS 50 JOGADAS pode ser aplicada quando para um jogador restar apenas o rei, solitário: nesse caso, ele pode exigir que o adversário, que maneja o rei e outras peças mínimas para tanto, lhe dê mate em 50 jogadas. Se assim não fizer, a partida estará empatada. |
O processo é
palco para pequenas e para grandes batalhas. É disputa de intensas e doloridas
disputas. É instrumento para solução de conflitos de interesses em relação a
bens de vida. Processo é meio para realização de pretensões resistidas. Nele o
estado atua, na sua função jurisdicional, para obtenção da paz social, para
equilíbrio das relações sociais. No processo se busca a vitória, se busca
a decisão de mérito, pela qual o estado concede a tutela para um dos
litigantes, acolhendo a pretensão, no todo ou em parte. Este é o objeto final
da parte litigante. Também no processo é necessária a vontade de vencer, de
sair vitorioso da demanda, até porque o processo não serve para meras consultas
ao judiciário, senão que é imprescindível demonstrar a pretensão resistida e a
postulação de um determinado bem de vida; assim, também não adequado fazer uso
do processo para postulações descabidas ou não fundamentadas, ou seja, para
exposição de lides temerárias, litigância pela litigância. O que o autor pretende, enfim, no
processo de conhecimento, é a obtenção de uma sentença com resolução de mérito,
conforme previsto no art. 487, do CPC, através da qual o juiz acerta as
relações jurídicas duvidosas e impõe, depois, o cumprimento de obrigações.
Assim é que se pensa o processo, para isso é que os jurisdicionados fazem uso
do processo. É certo que o julgamento de mérito nem
sempre ocorre pela cognição exauriente, aprofundada do magistrado. Com efeito:
em algumas ocasiões encontraremos a chamada autocomposição, fenômeno que leva à
solução do litígio por comum acordo. O ordenamento jurídico privilegia a
autocomposição e obriga o magistrado a marcar uma audiência especificamente
para que os litigantes, frente a frente, solucionem o conflito como melhor lhes
convier. A ideia é de que o estado-judiciário somente solucionará, como ato de
império, aquelas lides para as quais as partes não encontraram, elas próprias,
uma melhor solução. O que se quer é que o conflito seja apaziguado, ou
superado, pelas próprias partes. Para isso, as partes são convocadas para
uma audiência para conciliação ou mediação, que são duas formas alternativas
para a solução do conflito. A autocomposição pode ocorrer extrajudicialmente,
através da conciliação ou da mediação, patrocinada pelos advogados, defensores
públicos ou defensores privados; mas quando isso não ocorre, deverá o juiz, ao
deferir a petição inicial, marcar audiência para tanto, conforme art. 334 do
CPC: no evento, autor e réu comparecerão para a tentativa de autocomposição. A AUTOCOMPOSIÇÃO
é obtida, no mais das vezes, através de concessões de parte a parte; a ideia é
que assim cheguem a bom termo, cada um abrindo mão de alguns direitos e de
prerrogativas em nome da pacificação de conflitos. Em tempos de notória e
paquidérmica morosidade do nosso Poder Judiciário, mais do que nunca é válido o
antigo ditado: é melhor um mau acordo do que uma boa demanda; até porque, e não
raras vezes, a decisão juiz acaba desagradando as duas partes do processo. CONCILIAÇÃO:
é feita por pessoas capacitadas, não necessariamente por juízes togados, que
vão indicando os caminhos e as soluções que sejam mais adequadas para as
partes; nesse sentido, vai propondo alternativas e esclarecendo dúvidas,
visando à solução amigável do conflito. De outro lado, na MEDIAÇÃO, em sua forma mais pura e primitiva, o mediador cria um
ambiente físico próprio e adequado para a solução do conflito, porém sem fazer
propostas e sem indicar alternativas; o destaque, nesta modalidade, fica por
conta do afastamento que se impõe ao mediador: não deve interferir com palpites
e nem aventar soluções, limitando-se a esclarecer os pontos de atrito e a restabelecer
o diálogo entre os contendores. Todavia, é forçoso concluir que, no
cotidiano judicial ou extrajudicial, essas duas modalidades de autocomposição
já não guardam mais suas características anteriores, de modo que as diferenças
entre elas acabam se atenuando no mundo real. A Lei 13.140/15 regula, entre nós, os
procedimentos da mediação, assim como o faz o art. 165, do Código de Processo
Civil. Somente depois de frustrada a tentativa de conciliação ou mediação é que
ao réu estará aberto o prazo para apresentação de respostas. É certo, porém, que nem sempre será
realizada audiência para essa finalidade: quando as duas partes manifestarem
expressamente o desinteresse na autocomposição ou quando não se admitir a
autocomposição, como por exemplo, nos casos que versarem sobre direitos
indisponíveis. Também é possível falar-se em solução
extrajudicial do conflito através da ARBITRAGEM:
nesse caso, conforme regras da Lei 9.307/96, as partes convencionam a solução
de eventual conflito através de árbitro, que não é juiz togado; através de
procedimento próprio e observado o devido processo legal, com isonomia e
bilateralidade de atos, o profissional escolhido pelos contratantes encontrará
a solução do conflito. Sua decisão tem força de sentença judicial e não pode
ser revista pelo Poder Judiciário, a não ser quanto aos aspectos meramente
formais; tanto assim é que a decisão arbitral se constitui em título executivo
judicial e está sujeita à execução forçada. Nesse campo, também é importante
mencionar a SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA:
entendendo-se a sucumbência como sendo a derrota experimentada em juízo pela
parte, bem pode ocorrer de autor e réu saírem reciprocamente ganhadores e
derrotados. Isso acontece quando apenas e tão somente parte, ou parcela, do
pedido for julgada procedente. O autor foi vitorioso apenas em parte, porque
não conseguiu todos os bens de vida pretendidos; de outro lado, o réu, foi
derrotado apenas em parte, pois conseguiu minimizar a derrota total. O processo também poderá ser encerrado,
extinto, sem que a solução do litígio seja alcançada: assim ocorrerá quando
presentes vícios de ordem formal, capazes de impedir a marcha processual. Nesse
caso, o juiz deverá, antes de tudo, dar oportunidade às partes para que corrijam
os vícios apresentados, saneando, assim, o processo, quer dizer, afastando seus
vícios e cumprindo as formalidades procedimentais. Neste particular, ganha importância a assertiva segundo a qual o direito processual civil pertence ao ramo do direito público; significa dizer, é um ordenamento de ritos e solenidades, que devem ser cumpridos por todos os personagens do processo (autor – juiz – réu), sob pena de anulação do quanto foi processado. Por isso é que os vícios formais devem ser alegados pelas partes e devidamente corrigidos, enquanto que o juiz, de ofício, quer dizer, independentemente de requerimento da parte, deverá conhecer desses vícios adotar as providências que o caso impõe, extinguindo o feito sem resolução de mérito, consoante art. 485 do CPC. |
15. CONVENÇÕES E NEGÓCIOS: alteração de regras de comum acordo
A FIDE – Fédération Internationale de
Échecs, fundada em 1924, tem sede em Lausanne, Suíça, é a entidade
internacional que regulamenta as atividades enxadrísticas no mundo. É dela que
provêm as regras do jogo e a organização e validação dos campeonatos das
entidades a ela associadas. No Brasil, é a CBX – Confederação Brasileira de
Xadrez, fundada também em 1924 e filiada da FIDE, quem cuida do nosso
enxadrismo. Algumas REGRAS BÁSICAS e universais são exigidas: tabuleiro com 64 casas,
brancas e pretas, alternadas, cada uma delas com, preferencialmente, cinco
centímetros de cada lado; a posição correta do tabuleiro sobre a mesa se
verifica pela correspondência da casa branca junto à mão direita de cada
jogador. O jogo se desenvolve com 16 peças brancas de um lado e 16 peças pretas
de outro lado; cabe às brancas, sempre, o início da partida. Cada lance da partida é composto por um
movimento das brancas seguido imediatamente pelo movimento das pretas, e assim
sucessivamente. PEÇA
TOCADA, PEÇA JOGADA: por esse jargão, regiamente observado nos torneios,
vê-se que o jogador não pode tocar numa peça sem a movimentação respectiva.
Tocou, jogou. Se tocou na sua peça, o adversário pode exigir que ela seja
movimentada; se tocou na do adversário, este pode exigir que essa peça seja capturada;
por fim, se a peça tocada não puder ser movimenta e nem capturada, então o árbitro
da partida aplica uma penalidade (diminuição do tempo, por exemplo) para o
jogador faltoso. Nada, portanto, de pensar com as mãos!
Todavia, é possível que ocorra algum toque acidental na peça, o que deverá ser
perdoado pelo árbitro; por vezes, algumas peças são derrubadas durante o jogo,
por puro acidente, em vista do apuro de tempo em que se encontram os jogadores
– e isso também deverá relevado, sem punição alguma, bastando a recomposição
adequada. MÃO
ÚNICA: usa-se apenas uma das mãos, tanto para fazer os lances, quanto para
acionar o relógio; a mesma mão que joga é a que aciona o relógio. Mesmo o
roque, a captura de peças e a promoção do peão, em que se manuseiam duas peças,
devem ser feitos com mão única. RELÓGIO:
o acionamento do relógio só pode ocorrer depois de completado o lance, nunca
antes: além de irregular, é deselegante. CELULAR:
aparelhos celulares e eletrônicos em geral devem ser desligados e guardados na
bolsa. É regra, a menos que seja para acionar o relógio virtual, baixado através
de aplicativos disponibilizados na internet. PONTUALIDADE:
se a organização do torneio estabelecer tolerância para eventuais atrasos para
o começo da partida, a impontualidade será perdoada até o limite; todavia, se
nada foi previsto sobre isso, considerar-se-á derrotado aquele jogador que
chegou depois do horário aprazado para início da partida, sem qualquer
tolerância. POSIÇÃO
ERRADA DAS PEÇAS: as peças devem ser dispostas sobre o tabuleiro de modo
correto, cada uma em sua casa de origem. Caso se verifique que uma ou outra
estava fora de lugar, haverá duas possibilidades: verificada a irregularidade
antes dos 10 primeiros lances, a partida será cancelada e outra será iniciada;
caso já tenham sido completados 10 ou mais lances, continuará a partida – sim,
certamente será esquisito jogar com peças fora do lugar de origem, mas, enfim,
essa é a regra. Cabe ao árbitro verificar qual é a
punição adequada para cada caso, conforme a sua gravidade; as punições vão da
advertência até a exclusão do jogador da partida ou de outras rodadas
posteriores. Também é correto punir o faltoso em relação ao tempo de jogo, com
o árbitro acrescentando dois minutos para o adversário. São regras da FIDE e que são aplicadas
nos torneios a ela vinculados. Todavia, nada impede que Confederações,
Associações e Clubes façam suas próprias regras, incluindo as punições desta ou
daquela natureza. No xadrez amadorístico, os jogadores negociam as condições da partida. Ambos estabelecem o ritmo da partida, toleram toque na peça sem movimentação, admitem a volta do lance impensado, especialmente quando se trata do xadrez de passatempo. Porém, tanto quanto possível, que sejam seguidas as regras, para evitar vícios que geram problemas nos torneios oficiais. |
Interessantes regras
apareceram no Código de Processo Civil de 2015, mais especificamente nos
arts. 139, inciso VI, 190 e 191, e no que diz respeito à rigidez das regras
procedimentais. Por esses dispositivos, é permitido às partes a negociação nas
regras de procedimento, nas ações que versarem sobre direitos disponíveis. Não se trata propriamente de uma
novidade, na medida em que o CPC de 1973 já trazia tal permissão, embora em
limites mais tênues e comedidos. Assim é que, exemplificando, as partes
podiam negociar o foro competente para dirimir os conflitos, fazendo opções no
bojo de contratos particulares, nos casos de competência relativa, bem como
podiam distribuir entre si o ônus da prova de modo distinto do que previa a
revogada codificação. A doutrina processual indica que, no
regime anterior, os negócios processuais admitidos eram típicos das relações
particulares, que não modificavam regras de direito público. O que ocorre agora, com o CPC de 2015, é
a ampliação do leque possibilidades negociais, que invadem, inclusive, algumas
matérias que anteriormente não admitiam qualquer espécie de convenção; por isso
é que alguns doutrinadores afirmam que, agora, também algumas negociações
atípicas são admitidas na legislação vigente. Desse modo, a doutrina e enunciados têm
admitido que as partes negociem a duração dos prazos processuais, mesmos os
preclusivos, redistribuam entre si os ônus da prova, permitam a presença da
parte contrária no depoimento pessoal, retirem ou atribuam efeito suspensivo
aos recursos, delimitem as questões de fato e de direito na organização do
processo (art. 357, § 2º), escolham o perito que vai funcionar como auxiliar do
juízo, estabeleçam calendário para a prática de atos, enfim, há uma vasta
possibilidade de negócios jurídicos que podem ser feitos pelas partes. Não podemos olvidar, entretanto, que
esses negócios devem ser fiscalizados pelo magistrado, que haverá de impedir
negociações que privilegiem uma parte em detrimento da outra que,
eventualmente, seja vulnerável. Para negociar, as partes devem ter
capacidade civil plena e representação processual adequada, e desde que se
trate de causa em que se admita a autocomposição. De outro lado, não se admite negociação
de normas cogentes, de ordem pública e que possam afetar a organização
judiciária ou impedir a prestação da tutela jurisdicional. Assim, não será possível às partes
modificar as regras de competência absoluta e nem afastar as regras de
impedimento e de suspeição do juiz e do promotor de justiça; também será objeto
do negócio jurídico a supressão de instância e nem a criação de novos recursos,
em vista do princípio da reserva legal. Quanto à PONTUALIDADE, esta é imprescindível, para o juiz, o promotor de
justiça, o advogado e para as partes. Datas e horários previamente marcados
devem ser cumpridos à risca. Na hipótese, por exemplo, de o advogado não
comparecer à audiência, o juiz poderá dispensar a produção das provas por ele
requerida (art. 362, § 2º). O CUMPRIMENTO
DE PRAZOS, pelo advogado, nos prazos próprios, é de imperiosa necessidade,
não havendo justificativa para a perda da oportunidade de se manifestar nos
autos. Ainda que se trate, eventualmente, de ato de menor importância, ainda
assim é necessário se manifestar, quando menos para não passar a ideia de incúria
ou desatenção do profissional. De outro lado, caso o juiz não compareça
ao ato, poderá o advogado se retirar do recinto da audiência (art. 7º, XX, do Estatuto da OAB),
munindo-se de certidão, passada pelo escrevente do feito, sobre o ocorrido. é importante frisar que tão só o atraso
na realização do ato é aceitável, quando justificável, o que acontece muitas
vezes pelo atraso de outros atos anteriores do juízo. A propósito, no referido estatuto estão elencados as obrigações e os deveres do advogado, que estará sujeito, quando transgredir estas regras, às sanções impostas pelo Tribunal de Ética: conforme o caso e a gravidade da falta, poderá ser advertido, suspenso do exercício da advocacia e, por fim, até mesmo sofrer exclusão dos quadros da Ordem |
16. FASE DO JOGO, FASES DO PROCESSO: abertura,
desenvolvimento e fase final
O xadrez é um
processo que se desenvolve através da prática de atos sucessivos e lógicos
entre si, cronologicamente marcados e controlados, no tempo e no espaço. A partir do primeiro movimento, que
sempre compete às brancas, cada jogador vai realizando o seu lance e assim,
sucessivamente, o jogo vai se desenvolvendo até que surja um vencedor, quando
não for caso de empate. Esses movimentos, ou atos, unilaterais e
sucessivos, guardam (ou ao menos deveriam guardar) certa lógica entre eles; ou
seja, cada lance é realizado para refutar, ou para combater, o lance anterior.
Por isso é que a partida de xadrez é se desenvolve através de lances lógicos e
concatenados com os lances anteriores, conforme o plano de jogo – planejamento
– previamente realizado pelo jogador. Cada lance é realizado no tempo adequado,
que se abre após a realização do lance anterior, no espaço das 64 casas do
tabuleiro. Para a que a partida não reste enfadonha e interminável,
recomenda-se o uso do relógio, com o controle de tempo para a finalização da
partida. Os lances da partida não são analisados
apenas individualmente, de per si, senão que fazem parte daquilo que se
convencionou chamar de fase do jogo. Dito de outro modo, uma fase da partida é
caracterizada por um certo conjunto de lances – e assim encontramos três
grandes fases no enxadrismo: ABERTURA,
MEIO DE JOGO e FINAL DE JOGO. ABERTURA
DE JOGO: esta fase tem uma quantidade variável de lances, de lado a lado;
normalmente, é composta pelos primeiros três ou quatro lances da partida. Por
vezes, dois lances bastam para identificar a abertura, enquanto que, em outras
ocasiões, serão necessários seis ou oito lances para a sua caracterização,
principalmente quando consideramos as variantes teoricamente aceitas. A fase de abertura é considerada por
muitos jogadores como a mais importante da partida, pois é nesta fase que os
jogadores desenvolvem harmonicamente suas peças, dominam o centro do tabuleiro,
protegem o próprio rei, realizando o roque – grande ou pequeno. É certo que uma abertura deficiente,
aleatória e não previamente estudada, levará o jogador incauto a grandes
dificuldades, na maioria das vezes intransponíveis. Abertura errada nos conduz,
normalmente, à derrota. Dito isto, é de suma importância estudar
as aberturas e as suas variações, assim como, também, estudar as transposições,
ou seja, a passagem, de uma abertura para outra, conforme as reações do
adversário. Há manuais em profusão, ensinando os
princípios básicos da abertura de xadrez; assim é que estudamos várias delas:
Abertura dos Quatro Cavalos, dos Dois Cavalos, Abertura do Centro, Gambito do
Rei, Gambito da Dama, Abertura Espanhola (ou Ruy Lopes), Abertura Italiana (ou
Giuoco Piano), Caro-Kan, Abertura Siciliana, enfim, centenas de aberturas
diferentes e teoricamente estudadas pelos grandes mestres. Basicamente, devemos, nesta fase: a) evitar
a movimentação da mesma peça duas vezes, b) conquistar o centro do tabuleiro, c)
colocar em jogo rapidamente as peças maiores, d) realizar o roque o mais cedo
possível, e) preparar o domínio das colunas, f) assestar as peças, em harmonia,
na direção do rei adversário, visando ao xeque-mate. Para fins didáticos, passamos diretamente
aos comentários sobre a FASE DE FIM DE
JOGO, ou seja, aquela em que os jogadores efetuam os lances finais e
destinados ao encerramento do combate. Tal como ocorre com as aberturas, os
finais de partida também são teoricamente estudados, havendo um número sem-fim
de obras tratando desse assunto. José
Raul Capablanca, campeão mundial entre 1921 e 1927, afirmava que conhecer
os finais de partida é mais importante do que conhecer as aberturas: “deixe as
aberturas em paz e estude os finais”, dizia ele. Mas, convenhamos, a realidade
não é bem essa, afinal nem todos têm o talento inato do imortal cubano. De todo modo, devemos estudar os finais
de jogos, momento do jogo em que o rei tem papel muitas vezes decisivo, participando
ativamente do ataque fatal ao soberano adversário. Importante também conhecer:
a) a teoria do quadrado, nos finais de rei contra rei e peão; b) a teoria dos
triângulos, nos finais de rei e dois bispos contra rei; c) a teoria da oposição
dos reis, nos finais de rei e peão contra rei; d) os finais teóricos de torre;
e) os difíceis finais de rei, cavalo e bispo contra rei – enfim, uma série de
estudos que fazem a diferença entre uma vitória e uma derrota. Por último, a FASE DO MEIO JOGO, ou do JOGO
MÉDIO: ao contrário do que foi dito em relação às outras duas fases
mencionadas, aqui não vamos encontrar grandes teorias. O que manda, nesta fase,
são a experiência e a desenvoltura do jogador, que deverá conduzir suas peças
de modo harmônico em direção ao monarca adversário. Nesta fase o jogador deve lutar para
manter as boas posições adquiridas na abertura, confirmando o domínio do centro
do tabuleiro e evitando perder território. Também é necessário evitar a perda
de peças e de peões – a propósitos, eles, os peões, devem ser conduzidos em
linha, uns apoiando os outros. No meio jogo deve ser evitar o desmanche
do roque, que é o escudo protetor do rei; porém, caminhando para o final da
partida, sobremodo quando já ausentes torres e damas, o rei deverá ser conduzido
ao centro do tabuleiro, onde desenvolverá importante papel no controle daquela
delicada e imprescindível área. Em relação ao tempo, importante é administrá-lo com equilíbrio e razoabilidade. Nas aberturas, deve-se jogar mais rapidamente, sem muita perda de tempo, porque normalmente as aberturas são teóricas, já previamente estudadas. No final de jogo, também é possível jogar mais rápido – por vezes, é necessário jogar rápido, pela falta de tempo – lembrando que muitos finais que encontramos no cotidiano são finais também já teorizados, que acabamos, no mais das vezes, repetindo com certa facilidade. Já na fase de meio jogo, aí sim, dedicaremos mais tempo na análise das posições e na avaliação das peças. |
O processo é definido como uma relação
jurídica triangular, que se estabelece entre os três sujeitos do processo:
autor – juiz – réu, conforme as teorias do alemão Oskar Von Bülow,
tradicionalmente aceita nas escolas processuais brasileiras. Mas processo
também é sendo a prática de atos sequenciais lógicos e cronológicos que são
efetuados pelas partes para obtenção de um pronunciamento judicial (ou seja,
uma sentença). Esta
definição serve tanto para o processo de conhecimento quanto para o processo de
execução – naquele, o estado acerta relações jurídicas conflituosas e
duvidosas, dizendo de quem é o direito; neste, o estado realiza o direito posto
em um título executivo, praticando atos de força. O
conjunto desses atos também é chamado de fases, que vão se desenvolvendo até o
encerramento do processo. Para
o processo de conhecimento estão previstas as seguintes fases: postulatória,
providências preliminares, probatória (ou instrutória), decisória e cumprimento
de sentença). A fase postulatória
do processo é a fase em que as partes deduzem suas pretensões em juízo, ou seja, fazem seus
pedidos em relação ao bem de vida que pretendem obter da parte contrária. Nesta
fase postulatória estão compreendidos vários atos sequenciais,
como o protocolo da petição inicial, o juízo de admissibilidade feito pelo
juiz, a designação de audiência de conciliação ou mediação, a citação do réu, a
tentativa de autocomposição das partes, as respostas do réu (que pode contestar
o pedido e também deduzir pedidos em face do autor, através da reconvenção.
Enfim, são atos destinados à dedução das postulações das partes, com seus
pedidos e provas respectivas. Depois
encontramos a fase das
providências preliminares, em que
as partes exercem a bilateralidade do processo, cada qual complementando a
impugnação das pretensões adversas; é também nesta fase que o juiz faz o
saneamento e a organização do processo, corrigindo vícios formais que por
ventura se apresentam e estabelecendo os pontos sobre os quais as partes
controvertem, e abrindo a possibilidade da produção das provas respectivas. Mais
adiante encontra-se a fase
probatória, também chamada de
instrutória, em que as partes têm a oportunidade de produzir as provas com que
demonstrarão a existência dos direitos antes postulados. Na sequência, a fase decisória, em que o estado presta a tutela jurisdicional através de uma sentença,
que pode trazer a solução do conflito, outorgando o direito à parte vencedora,
ou sentença que pode encerra a cognição sem solucionar o mérito, o que ocorre
quando se verificam vícios processuais, ou formais, que não foram corrigidos no
tempo e modo previstos na legislação processual. É
também nesta fase decisória que as partes manuseiam seus recursos,
levando à decisão de primeira instância para as cortes revisoras, colegiadas,
de instâncias superiores. Finda esta fase, haverá a fase final do processo de
conhecimento, qual seja, o cumprimento
de sentença, que se faz necessário
quando o derrotado deixar de cumprir voluntariamente a obrigação posta na
sentença. Nesta fase a jurisdição atua para impor o cumprimento da obrigação,
inclusive com força policial, se for necessária. Esta
profusão de fases processuais leva a uma excessiva morosidade na prestação da
tutela jurisdicional – ao que se somam outros fatores, como o aviltamento da
máquina do judiciário, que sofre com a falta de servidores em número adequado e
com despreparo de uma parcela dos que atuam nas serventias, bem como com a
falta de locais adequados para realização das atividades forenses. Para
que essa morosidade não cause prejuízos irreparáveis para o jurisdicionado, há
a previsão de concessão de tutelas provisórias, sobretudo em situações de
urgência, em que o juiz está autorizado, mediante requisitos específicos,
proteger bens de vida liminarmente, ou seja, logo na abertura do processo. São
situações até certo ponto corriqueiras, mas que não podem aguardar o moroso
tramitar do processo, sob pena de a sentença futura ser inservível para a
reparação do dano conforme pretendido pelo autor. E, nesse caso, as fases
processuais são mais concisas, sumarizadas, o que permite soluções provisórias
imediatas. Em
relação às fases do processo de execução (em que, repita-se, o estado atua com
força de império para a realização de direitos e obrigações) encontramos
basicamente três fases: fase de
abertura da execução, com a
manifestação da pretensão executiva do polo ativo e a citação do devedor para
cumprimento da obrigação; depois encontramos a fase preparatória da
execução, que consiste na adoção de medidas coercitivas, como apreensão e
penhora de bens, aplicação de multas, etc., tendentes a obtenção do cumprimento
da obrigação e, por fim, a fase
de expropriação de bens, que se dá,
em última análise, com a retirada de bens do patrimônio do devedor para
satisfação do credor. Por
fim, uma palavra sobre os procedimentos especiais, que estão previstos no CPC e
também na legislação extravagante, ou seja, fora do código, que são utilizados
em situações especiais:- para cada pretensão, um procedimento específico,
único, que seja capaz de permitir o percurso necessário para a apreciação e
solução dos conflitos. Obviamente, em sendo especial o procedimento, especiais
serão as fases a serem percorridas, diferentemente do que ocorre com o chamado
procedimento comum – cujo caminhar da tramitação serve para conhecimento e
julgamento das ações em geral. Cabe ainda esclarecer as diferentes concepções que o direito processual empresta às expressões processo e procedimento: processo é relação jurídica, é o conjunto de atos, ou seja, é um conceito, uma abstração, enquanto que procedimento é o caminho que o processo percorre até a obtenção de um provimento jurisdicional – qual seja, a sentença. O procedimento a ser adotado, seja o comum ou o especial, é que determinará os caminhos que serão trilhados pela atividade jurisdicional. |
17. PLANEJAMENTO, ESTRATÉGIAS E TÁTICAS: o plano de ação e
execução dos atos
Uma partida de
xadrez não deve ser jogada aleatoriamente; antes, pelo contrário, o enxadrista
deve traçar um plano de ação e de condutas que serão adotadas no curso da
partida, levando em consideração uma série de fatores. Significa dizer que uma partida de xadrez
se desenvolve segundo uma estratégia
cuidadosamente estabelecida, previamente estudada, de maneira se evitar
aventuras e surpresas desagradáveis que, no mais das vezes, levam à derrota. Vários aspectos deverão ser considerados
pelo jogador, tais como: a) equilíbrio emocional; b) as aberturas e defesas
normalmente praticadas pelo adversário; c) as aberturas e defesas de sua
própria predileção; d) estratégia e tática; e) análise de posição; e) intensidade
do ataque e eventual busca de empate. Primeiro de tudo, há que se atentar para
os aspectos de ordem emocional. A cabeça da pessoa deverá se voltar
inteiramente para a partida, deixando de lado preocupações de qualquer outra
natureza. Há que se concentrar para o jogo, repassando mentalmente os
princípios e normas do xadrez, as estratégias que foram pensadas. Olhe para o
tabuleiro a sua frente e identifique as alas, as fileiras, as colunas, as
diagonais, o quadrado central, etc. Abalos emocionais certamente levam à
derrota, pois tiram a concentração necessária para o sucesso. O mesmo se diga
durante a partida, cujo desenvolvimento depende da atenção que o jogador
dispensa aos lances próprios e aos do adversário. Mesmo nas ocasiões em que se
faz um lance ruim, equivocado, a recomendação é não demonstrar arrependimento e
nem comentar sobre o erro: bem pode ser que o adversário não perceba. Uma atitude extremamente deselegante é a
batida da peça no tabuleiro, quando do movimento efetuado; alguns jogadores
usam deste artifício como forma de impressionar o adversário, tentando um abalo
emocional. Em suma, não se deixe impressionar pelas
atitudes do adversário e nem pelas reações da plateia. Concentração máxima é a
pedida certa. Krogius,
russo, grande mestre de xadrez e psicólogo, ensina em seu livro La Psicologia em Ajedrez que existem
basicamente dois tipos de jogadores: os de estilo combinatório e os de estilo
posicional. Os primeiros tendem a arriscar mais, fazem mais lances táticos e
sacrificam peças; os segundos jogam de modo mais sereno, buscando posições
sólidas no desenvolvimento das peças e seguem com mais rigor as estratégias. Dito isto, procure saber qual o estilo do
seu oponente, quais as aberturas e as defesas preferidas do seu adversário e se
prepare para enfrentá-lo. Em todos os níveis de disputas nós vamos encontrar
jogadores que adotam um ou outro estilo, que praticam tal ou qual abertura, que
se especializam nesta ou naquela variante. Nas competições de alto nível, entre
os grandes mestres, isso ocorre com frequência, havendo jogadores que se
especializam em determinadas aberturas e repetem-nas rotineiramente. Do mesmo modo, planeje com antecedência a
sua conduta, sobremodo quando jogar de brancas. Claro que a abertura pretendida
pelas brancas dependerá, sempre, das reações do jogador de pretas, mas isso não
impede o planejamento prévio. Tal como ocorre com os adversários, é bom se
especializar em algumas aberturas, treinando e aperfeiçoando as variações para
atuar conforme responda o adversário. Esse planejamento de jogo, esse plano de
jogo, enfim, todas as preparações para a partida levam ao que se denomina estratégia, que não pode ser confundida
com tática. Por estratégia se
entende o planejamento de jogo a ser desenvolvimento; consiste em decidir se
vai fazer um jogo posicional ou um jogo combinatório; se vai fazer um jogo
fechado ou aberto; se vai privilegiar o empate através de um jogo defensivo ou
se vai fazer um jogo em busca da vitória, com ataques e contra-ataques; se vai
fazer roque maior ou menor e, mesmo, se não vai rocar, se vai buscar um domínio
direto ou indireto do centro, etc. Enfim, a estratégia corresponde aos
objetivos de longo prazo, conforme o plano de jogo pré-estabelecido. Por tática se entende, de outro lado, a
prática de lances imediatos, momentâneos, com os quais o jogador atingirá as
metras planejadas inicialmente. Por vezes, será necessário sacrificar uma peça,
ou fazer um lance de espera, ou então retardar o roque, dentre outras
situações. Para saber se a estratégia adotada está
sendo cumprida e para melhor avaliar os lances táticos, o jogador deve fazer
mentalmente uma criteriosa análise da partida, seja avaliando as peças e
medindo as forças em confronto, seja avaliando a posição e harmonia das peças
sobre o tabuleiro. É uma análise sobre as forças
em jogo, conforme Eugênio
Znosko-Borovsky. O jogador deve saber, a todo instante,
qual é a correlação de força existente; tem saber se está com um peão a mais ou
a menos, tem que saber se tem mais ou menos peças que o adversário, tem que
saber se os pares de bispos ainda estão em jogo ou, então, se o bispo restante
é o de casa branca ou de casa de preta, enfim, tudo isso é de suma importância
para eventualmente alterar a estratégia ou continuar a emprega-la. Isso ocorre naturalmente conforme seja a
experiência do jogador, sem nenhuma dificuldade. A par dessa contagem, também é necessária
a análise de posição, que é bem diferente. Esta análise consiste na observação
de quatro pontos fundamentais: a) estrutura de peões; b) domínio do centro; c)
estrutura do roque; c) desenvolvimento e harmonia das peças. É uma análise de
tempo e de espaço, ainda segundo Eugênio
Znosko-Borovsky. Em relação aos peões, é importante
verificar se estão apoiados entre si, de modo a evitar que fiquem dispersos
pelo tabuleiro, uns adiantados, com pouca ou nenhuma defesa, e outros
atrasados, sem função no jogo; quanto mais agrupados, melhor. Também é necessário analisar o domínio do
centro, a partir das quatro casas centrais do tabuleiro; melhor posição adquire
quem mais efetivamente domina o centro, seja com pões, seja com as peças
maiores. Geraldo é a partir do centro que se disparam os ataques mortais ao rei
adversário. Quem tem o centro, tem vantagem. Outro aspecto a ser observado diz
respeito à estrutura do roque: por se tratar de um escudo protetor do rei, deve
ser mantido íntegro tanto quanto possível, para garantir a proteção do monarca.
Roque intacto é um sinal de superioridade. Por fim, a quarta análise a ser feita diz
respeito ao desenvolvimento e à harmonia das peças; verifique se as peças estão
convenientemente desenvolvidas, isto é, se foram coladas em jogo e estão
atuantes sobre o centro do tabuleiro e com ameaças ao adversário, fatores
indispensáveis ao sucesso da partida. Verifique, também, se as peças estão bem
colocadas e assestadas harmonicamente para um objetivo único. Com isso,
evitam-se ataques com peça única ou com poucas peças em relação às defesas
adversárias. Lembre-se: as peças devem atuar em conjunto, umas ajudando as
outras e todas direcionadas para o mesmo objetivo, sem dispersão. Essa análise tem que ser feita a todo instante, pois o quadro sobre o tabuleiro muda a cada lance, determinando reanálises seguidas e continuadas. De outro lado, é importante entender que nem sempre uma força maior, ou seja, uma quantidade maior de peças pode determinar a vitória. Tudo depende do conjunto e harmonia das peças, bem como da correção das análises feitas pelo jogador. |
O planejamento de uma ação judicial
começa já no instante em que o advogado atende, pela primeira vez, o cliente. É
de fundamental importância ouvir atentamente a narrativa dos fatos para daí
entender corretamente as pretensões do cliente. É preciso entender bem os fatos que foram
narrados porque é a partir deles que será compreendida a dimensão da lesão de
direito sofrida pelo cliente. Recomenda-se que seja feito um histórico desses
fatos, em pormenores, com a respectiva assinatura do narrador; visualizada a
ofensa, fica mais fácil estabelecer a pretensão a ser deduzida em juízo, em
conjunto com o cliente. Feito isso, o advogado passa à análise
das provas comprovarão os fatos alegados na petição inicial. Cabe sempre
lembrar que ao autor incumbe, salvo raras exceções, provar os fatos
constitutivos do seu direito (art. 373).
Quem alega, deve provar o que alegou. De nada adiante com excelente narrativa
de fatos e ótima fundamentação doutrinária e jurisprudencial, se houver a
adequada produção de provas. Não adiante apenas fundamentar, o essencial é
provar o que foi alegado. O próximo passo é a definição da ação
judicial a ser proposta, na qual será formulado o pedido de tutela que a parte pretende. O pedido (art. 322) nada mais é do que a
expressão do bem de vida que se quer ver protegido em juízo, com suas especificações
e quantidades; é ele que condiciona a atividade jurisdicional até a sentença
final. Há que se verificar, também, se a ação
tramitará sob o procedimento comum ou sob algum procedimento especial, seja o
da legislação codificada ou da legislação extravagante, fora do código.
Primeira se verifica se é o caso de algum procedimento especial; nada havendo
neste sentido, adota-se o procedimento comum. Em suma, o que não se admite é a chamada
aventura jurídica, a ação temerária, que estará fadada ao insucesso com
prejuízos para o autor. O ajuizamento da ação judicial deve ser fruto de
profunda reflexão, de correto planejamento para todas as suas fases, com vistas
à obtenção de uma sentença final favorável aos interesses do autor. Os documentos essenciais à propositura da
ação já devem vir anexados na petição inicial (art. 320); todavia, durante o
curso do processo, outras poderão ser produzidas, conforme cada caso. Quando se
tratar de prova oral, ou seja, depoimento pessoal ou oitiva de testemunha,
recomendam-se alguns cuidados especiais. O advogado cauteloso deve levar à
audiência um roteiro de perguntas que deverão ser feitas aos depoentes; não é
vergonha nenhuma preparar essas perguntas e, durante a audiência, acrescentar
outras que lhe pareçam necessárias. Costumeiramente, o juiz é quem pergunta primeiro
e só depois é que passa a palavra para o advogado. Na hipótese em que o juiz
faz uma pergunta que estava no roteiro do advogado, basta riscá-la, deixando de
fazê-la. Esse roteiro nada mais é do que um planejamento daquilo que vai ser
feito da audiência e evita o esquecimento de perguntas que são necessárias o
sucesso da causa. Isso vale tanto para as perguntas que
serão feitas para a parte contrária, no depoimento pessoal, quanto para as
testemunhas. Encerrada a coleta das provas, na mesma audiência será aberto
prazo de 20 minutos para os debates orais (art. 364); nessa ocasião, o advogado
poderá fazer um resumo, verbal, claro, daquilo que melhor foi produzido, em
termos de provas, em favor do seu cliente, a título de reiteração dos
argumentos e pedidos efetuados em juízo. Também nesse caso, o advogado cauteloso
deverá levar manuscrito com o roteiro da sua fala, nele acrescentando o que de
melhor foi produzido na audiência de instrução, de maneira a fixar na memória
do magistrado as boas provas que produziu no processo. Para que o advogado possa preparar esses
roteiros, tanto o de perguntas quanto o de debates orais, é necessário que faça
uma rigorosa análise de tudo quanto foi processado até então, de maneira a
eventualmente adaptar e reordenar o seu plano inicial de atuação. Aliás, essas análises devem ser feitas a
todo instante; mudanças de rumo vão ocorrendo com a contestação, com reconvenção
e com as provas produzidas peça parte contrária. Conforme as eventuais
alterações de rumo, igualmente deverá ser alterado o plano de atuação do
profissional, para a adaptação das estratégias. De outro lado, também temos lances
táticos no curso do processo, quer dizer, também praticamos lances inesperados,
conforme as diversas situações que se apresentam. Dentro da ideia de que tática nada mais é
do que a prática de ato isolado, de surpresa, dentro de uma estratégia
previamente traçada, concluímos que no processo também teremos atos táticos,
tal como ocorre no xadrez. Assim é que, conforme o desenrolar de uma
audiência, por exemplo, o advogado, já satisfeito com o depoimento das
testemunhas da parte contrária, que produziram provas em seu favor, poderá
dispensar o depoimento de sua própria testemunha, mormente quando sabe que ela
não tem segurança naquilo que vai falar ou pouco conhece dos fatos em debate. Justamente para não macular a prova que
lhe favorece, feita pelo adversário, num lance verdadeiramente tático,
surpreende a todos com a não produção da sua própria prova, dispensando de
depor a testemunha que antes havia arrolado. Ou, então, pelos mesmos motivos, deixa de
juntar um documento que antes se apresentava como essencial ou deixa de fazer
uma pergunta para a testemunha – enfim, são várias as possibilidades que surgem
levando ao que chamamos de lances táticos. Saindo um pouco da esfera processual,
estratégia e táticas são também úteis para os estudos de graduação e para os
concursos públicos, de um modo geral. Hoje em dia é comum, nos cursinhos
preparatórios, a montagem de verdadeiras estratégias de estudos, com
cronogramas elaborados sincronizando de conteúdo e de datas para cumprimento de
tarefas. O aluno recebe uma planilha que contém os conteúdos a serem estudados
e a carga horária que deve ser dispensada para o estudo respectivo, de maneira
que a preparação se encerre nas vésperas da prova. Outra
providência dos cursinhos, especificamente os preparatórios para concursos
públicos, o planejamento inclui alguns conteúdos conforme seja a composição da
banca examinadora. Por exemplo, sabendo que preside a comissão, o cursinho já
tem uma ideia do que vai ser perguntado na prova, e desse modo prepara o aluno
conforme as atuações e entendimentos esposados pelo examinador. Esse tipo de procedimento é altamente
criticável, porque permite a aprovação de concurseiros
bem preparados tecnicamente, mas sem qualquer vocação para o cargo a que
ascendem; são pessoas que buscam apenas e tão somente a segurança e os altos
vencimentos mensais do emprego público, sem a menor noção do que seja Justiça e
sem nenhuma preocupação com as graves questões sociais do país. Mas, enfim, é
uma realidade. Por fim, é claro que, por melhor que seja a estratégia adotada para os estudos, por vezes um lance tático pode ajudar muito, produzindo respostas de surpresa, conforme a percepção do momento. |
18. GEOMETRIA E CÁLCULOS:
as contas e as figuras geométricas, no xadrez e no processo
O xadrez é a
ciência dos números absurdos, alucinantes. Os matemáticos e estudiosos em geral
destacam que existem 400 possibilidades diferentes apenas para que os dois
jogadores realizem o primeiro lance da partida. Os dez primeiros lances podem
ser realizados de 165.000.000.000.000.000 (cento e sessenta e cinco
quatrilhões) de maneiras diferentes. Mas, enfim, esses cálculos e outros tantos ficam por conta dos matemáticos, não dos
jogadores. A estes cabem os cálculos mais sutis, embora não menos complicados.
Jogadores de excelência anunciam mates doze ou quinze lances antes de se
consumarem. Já vi casos de garotos de 14 anos encerrarem uma partida porque
previram mate em oito lances. Para isso é necessário calcular as
posições que as peças vão ocupar, obrigatoriamente, nos lances seguintes, lances
apenas imaginados pelos contendores, sem tocar nas peças. É um cálculo puramente
mental. Alguns treinamentos são recomendados para
aprimorar a habilidade de cálculo do jogador; a título de exemplificação, uma
das propostas é calcular quantos movimentos, no mínimo, serão necessários para
que o rei branco, a partir da sua casa inicial (d1), atinja a 8ª casa do
tabuleiro (d8), fazendo isso sem tocar na peça. Pense nisso, prezado leitor. Experimente, também, pensar na posição
que um cavalo pode alcançar depois de movimentado duas vezes; feito isso,
procure visualizá-lo três, quatro, cinco lances depois, sem tocar nas peças.
Para facilitar, lembre-se que o cavalo sempre se desloca para casa de cor
diferente da de origem. Assim é que são feitos cálculos no
xadrez, imaginando a posição das peças alguns lances à frente daquilo que se
apresenta no tabuleiro. Quem melhor e mais longe calcular, quem visualizar as
posições futuras com maior precisão, este por certo terá mais chances de
sucesso na partida. Mais um exemplo de exercício: quantos
movimentos devem ser feitos para que o cavalo branco, a partir da sua casa
inicial (f1), alcance, pelo caminho mais curto, a 8ª fileira do tabuleiro? Ou,
então: saindo da casa h1, quantas movidas faremos ao rei para que ele alcance a
casa h8? E se esse rei tiver que passar pela casa central do tabuleiro (casa
e4), quantos movimentos deverá fazer? Enfim, há uma série de cálculos a serem
efetuados pelo jogador de xadrez, em relação às peças e posições do tabuleiro.
Mas também é necessário equilibrar o uso do tempo para realizar as jogadas, de
modo a que o jogador não seja surpreendido com apuros no relógio para findar a
partida: quanto menos tempo para refletir, piores serão os lances executados. Com relação a esse tema, tempo, ritmo de
jogo, é bom ter em mente as jogadas para a fase de abertura e para a fase de
encerramento da partida, que são teóricas e previstas, em muitas situações,
pelos estudiosos. O jogador que conhece temas de abertura e temas de final de
jogo, por certo, leva grandes vantagens sobre o adversário. Quanto às figuras geométricas, em xadrez temos a oportunidade de estudar os
quadrados, os retângulos e os triângulos; a compreensão dessas figuras é de
vital importância para o sucesso na partida. O jogo se desenvolve sobre um tabuleiro
quadrado, que de sua vez é formado por 64 casas quadradas; dentro desse grande
quadrado, devemos ver o quadrado central, formado pelas casas d4, d5, e4 e e5:
quem primeiro dominar esse quadro e mantiver esse domínio, terá grandes chances
de vitória. Observe o diagrama abaixo: Conforme tema tratado e explicado em (http://xadrezslt.blogspot.com/2008/11/teoria-dos-finais-teoria-do-quadrado.html),
estando o rei fora do quadrado imaginário, impossível será impedir a promoção
do peão – e, nesse caso, impossível será, praticamente, impedir a vitória das
brancas. Entretanto, estando o rei preto dentro do quadrado, facilmente fará a
captura do peão branco, empatando a partida. Temos, também, os retângulos, formados
pelo território das brancas e pelo território das negras, assim como temos,
também, os retângulos formados pela ala do rei e pela ala da dama, conforme
exposto no capítulo 2, acima. Outra figura geométrica de suma
importância é o triângulo, cujo domínio é essencial para que, dentre outras
hipóteses, se dê mate ao rei adversário nos finais em que um rei e dois bispos
se defrontam com o rei solitário do oponente. Nesse caso, o mate se dará encurralando o
rei adversário numa das casas angulares do tabuleiro; para tanto, é necessário
que os bispos, coadjuvados pelo rei, venham reduzindo, a cada lance, o
triângulo de movimentação do monarca adversário, até que este se fixe numa das
seguintes casas: a1, a8, h1 ou h8. Experimente esse exercício e entenderá a
importância do domínio dos triângulos. Considere, ainda, que o movimento do
cavalo, sempre em forma de “L”, nada mais é do que a hipotenusa do triângulo
retângulo – ou seja, representa o lado maior, ou oposto, do triângulo
retângulo. Interessante, também, é notar que, em
xadrez, nem sempre o caminho mais curto de um ponto ao outro é uma reta: uma
curva, por vezes, exige o menor número de movimentos de uma reta. Para comprovar isso, basta considerar a quantidade
de lances necessários para que o rei, situado na casa h1, possa alcançar, em
linha reta, a casa h8; depois, compare o resultado fazendo esse mesmo rei passar
pelas casas e4 e e5, descrevendo uma autêntica curva até chegar à casa h8.
Verá, caro leitor, que serão necessários,
em ambos os caminhos, o mesmo número de movimentos, ou seja, sete. |
Ciências
jurídicas não combinam com cálculos. Costumamos dizer que juízes, advogados e
promotores não sabem calcular – a não ser os próprios vencimentos e, no caso
dos advogados, seus próprios honorários. É por esse motivo, aliás, que lançam
mão dos peritos, pessoas especializadas que fazem os cálculos mais complexos do
processo – os chamados cálculos matemáticos, que demandam o uso de fórmulas e
de equações que apenas os profissionais detêm. Pouco conhecidas são as funções do
contador (art. 524, § 2º) e do
partidor (art. 651), como auxiliares
do juízo e que funcionam como anexos do Cartório Distribuidor. Respectivamente,
têm a função de fazer, por exemplo, cálculos de custas judiciais e partilhas de
bens nas ações de inventário, nas situações especiais em que as partes
envolvidas no conflito não chegam a uma autocomposição sobre os temas citados. Mas,
nos casos de inventário e partilha de bens amigável, sem conflito de
interesses, caberá ao advogado efetuar a divisão dos bens deixados pelo
falecido, apresentando em juízo as quotas que caberão a cada um dos herdeiros,
com as avaliações respectivas, de acordo com o art. 630 e seguintes, do CPC. Tirando o exagero da afirmação antes
colocada, é claro que, no curso do processo, somos constantemente chamados a
calcular, sobremodos nós, advogados. Realizamos cálculos o tempo todo, desde
aqueles necessários para encontrar o valor da causa até aqueles destinados ao
pagamento do credor, nas execuções de título extrajudicial ou no cumprimento de
sentença. Assim é que calculamos: a) contagem de
prazos; b) contagem de custas judiciais para fins de verbas sucumbenciais; c) o
valor mínimo para alienação do bem penhorado; d) apuração de débitos, com
aplicação de juros de mora e de índices de atualização monetária; e) apuração
de honorários advocatícios; f) distribuição e pagamento de valores para os diversos
credores da execução – enfim, numa série de eventos somos chamados a calcular.
Sim, são cálculos simples, aritméticos, de menor complexidade, é verdade, mas,
em juízo, calculamos com muita frequência. O valor da causa, que é requisito
intrínseco da petição, é fixado pelo autor consoante as disposições do art. 292; nas ações de alimentos, por
exemplo, esse valor é encontrado ao se multiplicar o valor mensal pedido a
título de alimentos por 12. A finalidade do valor da causa, dentre outras, é
permitir a apuração dos valores devidos a título de custas judiciais, conforme
tabela progressiva dos tribunais: quanto maior o valor da causa, maior será o
valor das custas iniciais; esse elemento da petição inicial servirá de base
para, também, para apuração da verba honorária que o derrotado pagará ao
vencedor, conforme percentuais estabelecidos no art. 85. Outro cálculo, este bem simples de se
fazer, envolve a contagem dos prazos judiciais; conforme art 219, nos prazos processuais determinados em dias são computados
apenas os dias úteis, descartados os dias em que não houver expediente forense
por inteiro. A título de ilustração, o réu tem o prazo de 15 dias para
apresentar respostas à petição inicial, cabendo ao advogado administrar
corretamente o transcurso desse tempo, para evitar prejuízos ao seu cliente. Na fase de cumprimento de sentença, que é
a fase final do processo de conhecimento com sentença condenatória, ou no
processo de execução de título extrajudicial, o valor mínimo para alienação do
bem penhorado levará em conta o valor de avaliação, que é apurado pelo Oficial
de Justiça Avaliador (arts. 870 e
seguintes); já os pagamentos que serão efetuados para os credores da execução
serão feitos conforme a ordem estabelecida nos arts. 876, observadas as prioridades estabelecidas nos art. 964 e seguintes, do Código Civil
Brasileiro. Trata-se de tema de certo modo
controvertido e que exige uma série de cálculos por parte dos advogados, que
devem observar minuciosamente o valor apurado com a alienação do bem penhorado
para a correta divisão entre os diversos credores. Muitos cálculos devem ser
efetuados nesta fase do processo. Também exige cuidado especial dos
causídicos os cálculos que são feitos para apuração de débitos, havendo
necessidade de se computar aos valores históricos os juros de mora e os índices
de atualização monetária, conforme tabelas dos tribunais. Especialmente no que
diz respeito à liquidação de sentença (art. 524), caberá ao advogado do credor
calcular o valor devido pelo executado, instruindo a petição com o
demonstrativo de debito, que conterá o índice de correção monetária adotado, os
juros aplicados e as respectivas taxas, a periodicidade dos juros, dentre
outros requisitos dos incisos sob o art. 524, citado. Experimente acessar o site do TJMG – www.tjmg.jus.br – e clicar na aba
“atualização monetária” para encontrar as tabelas com os índices de atualização
de valores. Feito isto, basta multiplicar o valor histórico que se deseja
atualizar pelo índice do mês/ano de origem do referido valor: o resultado
obtido corresponderá ao valor atualizado. Em se tratando de valores periódicos,
como no caso das prestações alimentícias, esse exercício tem que ser repetido
para cada mês devido. Por fim, cálculo gostoso de fazer, é
aquele relativo aos honorários de sucumbência a que o advogado faz jus, de
acordo com as regras do já citado art.
85. Todos esses cálculos ficam a cargo do advogado da parte interessada –
mas caberá ao advogado ex adverso a
tarefa de conferir e corrigir esses cálculos, não havendo, pois, como fugir
deles. Embora esses cálculos, repetimos, sejam de
confecção simples, os profissionais das lides forenses não escapam à sua realização. Por fim, a título de figuras geométricas,
encontramos no processo um triângulo, que representa a relação jurídica formada
entre os três personagens do processo: autor – juiz – réu. Essa figura deve ser
vista deitada, para levar ao equívoco de que entre estes três personagens haja
alguma hierarquia ou sujeição. Na verdade, todos têm, entre sí e
reciprocamente, relações de direitos e de deveres, conforme as teorias do já
citado alemão Oskar Von Bülow. Essa relação jurídica triangular se forma com a citação do réu, que então passa a compor o polo passivo do processo. Antes do ato citatório, a relação jurídica é estabelecida entre autor e juiz, formando uma figura angular. |
19. PROCESSOS DE CRIAÇÃO: enxadristas e advogados fazendo
ciência
Nem todos percebem
que, enquanto viventes, temos o dever de legar para os nossos semelhantes ao
menos algumas contribuições para o desenvolvimento e aprimoramento das relações
sociais. Na medida de nossas possibilidades, temos que trabalhar para isso. Isso acontece em todos os ramos da
atividade humana. No xadrez, não poderia ser diferente. Há uma grande quantidade de jogadores que
passam pelo enxadrismo e pouco ou nada acrescentam para esta nobre arte. Não
deixam um estudo sequer, não criam absolutamente nada, nenhuma variante nova,
enfim, nem sequer divulgam adequadamente o xadrez – são pessoas que apenas
recebem do xadrez e nada dão em troca. Vivem do xadrez e não pelo xadrez; sugam
e nada dão em troca. Sem dúvida alguma, nessa leva encontramos
brilhantes jogadores, de altíssimo nível e capazes de vencer duros combates.
Têm seus méritos, ninguém haverá de negar. São, ou foram, profundos
conhecedores desta arte. De outro lado, todavia, encontramos
aqueles que deixam enormes contribuições para o enxadrismo, que estudam o
xadrez e aprimoram as aberturas e os finais de jogo, deixando obras relevantes
e inovadoras para a posteridade. Usufruem do xadrez e permite que o xadrez
deles usufrua também. Esses não são, necessariamente, grandes
talentos e nem sequer têm destaque no tabuleiro. São, muitas vezes, jogadores
limitados tecnicamente, mas que não se cansam de divulgar essa arte, esse jogo,
essa ciência – e, com isso, contribuem, anonimamente, para a sua eternização
entre os homens. Os primeiros estudos na área, de que se
te notícias, foram feitos por Lucena, no final do século XV. Logo depois
surgiram Ruy Lopez de Segura, padre espanhol que nos legou a Abertura Ruy
Lopez, até hoje muito usada. Os estudos e inovações vieram num crescendo desde
então: Alekhine, Averbach, Becker, Capablanca, Grünfeld, Kasparov, Edward Lasker,
Philidor, Rubinstein, Smyslov, Tchigorin, apenas para exemplificar, dentre as
milhares de contribuições deixadas. Dentre os brasileiros, merecem destaque
Herman Claudius van Riemsdijk (na verdade, nascido na Holanda e radicado entre
nós), D’Agostini, Gerson Peres e Joel Cintra, para ficarmos com os mais
difundidos. Virtualmente, há uma boa legião de divulgadores, como Rafael Leitão
e de Krikor Mekhitarian. A abertura é magistralmente tratada por
Idel Becker e pela dupla de professores Gerson Peres e Joel Borges. O primeiro
nos legou excelentes lições a respeito das ciladas que esta fase do jogo
reserva para os jogadores incautos, enquanto que os dois últimos deixaram
aprofundados estudos das variantes mais usadas das principais aberturas. São
livros imperdíveis e de fácil acesso. Eugênio Znosko – Borovski faz excelentes
estudos sobre o meio jogo, discutindo estratégias, táticas e análises de
tabuleiro. Kasparov e Smislov trataram do xadrez em
geral, em todas as suas fases; já Herman Claudius cuida especificamente dos
finais, numa complexa obra intitulada “Peões Mágicos – A teoria das casas
críticas nos finais de xadrez”. Yuri Averbach, Winkelman, Capablanca e
Lasker cuidam daquilo que talvez seja o que de mais fascinante existe no
xadrez, qual seja, a parte artística e criativa da modalidade. Krogius, que era psicólogo e enxadrista,
nos legou “La Psicologia em Ajedrez”, um bem cuidado estudo sobre o necessário
equilíbrio emocional do jogador.
E muitos outros, anônimos, fizeram, e
fazem até hoje, relevantes e diárias contribuições para o mundo enxadrístico. Pessoas
que tem pouca ou nenhuma projeção, que não aparecem para um público maior, mas
que se dedicam fielmente ao xadrez, ministrando aulas, ensinando as primeiras
lições, enfim, de um modo ou de outro, são pessoas importantes para o
desenvolvimento do mundo enxadrístico – doam-se para o xadrez sem pedir nada em
troca. |
O advogado não
é um mero aplicador das regras legais; na sua função diária de interpretar as
leis e pugnar pela realização da justiça, o advogado também cria o próprio
direito. A lei, propositalmente, tem dicção aberta
e está sujeita à interpretação; também é correto dizer que, por vezes, é também
lacunosa, incompleta. Nesse último caso, cabe aos operadores do direito criar
as regras faltantes que virão, ao seu tempo, integrar, ou colmatar, o
ordenamento jurídico. Um exemplo clássico da criação de regra
pela advocacia é a habilitação de crédito hipotecário nas execuções de
terceiros, em que o imóvel hipotecado sob os efeitos da penhora. Após acaloradas discussões por parte de
uma minoria doutrinária e jurisprudencial, ficou assentado, inclusive pelo STJ
– Superior Tribunal de Justiça – que o credor hipotecário tem o direito de
habilitar o seu crédito na execução de terceiros, fazendo isso apenas na
condição de credor e independentemente de mover execução própria do seu
crédito. A habilitação é um instrumento simples,
célere, justo e eficaz, com resultados amplamente positivos para todos os
partícipes do processo – juiz, exequente, executado, terceiro credor. No entanto, referida figura – a da habilitação
de crédito hipotecário em execução de terceiros – não estava prevista nas
regras legais das execuções, nem no CPC e nem na legislação extravagante, mas
passou a ser adotada nacionalmente após a criação dessa figura (e para essa
finalidade) pela prática da advocacia civil. Essa habilitação é feita por simples
petição nos autos da execução de terceiro, sem maiores formalidades. Por esta
petição se requer a habilitação propriamente dita, comprovando a existência do
contrato hipotecário, devidamente registrado no Cartório de Registro de
Imóveis, e do saldo devedor atualizado; ademais, a habilitação serve também
para que o credor requeira o exercício dos seus direitos de credor
preferencial, decorrentes do art. 1.422,
do Código Civil. Tal como já adiantamos, houve, na década
de 1990, uma série de questionamentos quanto a essa dinâmica, alegando, alguns
poucos, a ausência de regra legal que sustentasse esse ingresso abrupto na
execução de terceiro; sendo assim, diziam, o credor hipotecário deveria mover
execução própria e nela realizar a penhora do bem que lhe foi hipotecado. Essa absurda tese, felizmente, não
prosperou e já há duas décadas se acha perfeitamente superada. E com razão,
pois não seria de se admitir que a ausência de regra legal pudesse afastar os
direitos do credor hipotecário: até que ajuizasse a sua execução, citasse o
executado e promovesse a penhora, por certo o bem agora penhorado já teria sido
alienado na execução de terceiro – quer dizer, o credor hipotecário chegaria
tarde demais ao patrimônio do devedor e não realizaria o seu direito. Enfim, graças à insistência dos advogados
é que se consolidou a figura desta modalidade de habilitação de crédito nos
meios forenses. Com efeito, não poderia mesmo frutificar a tese dos juristas
que só aceitam o direito positivado e que colocam as regras formais acima da
realização dos direitos constitucionais. O advogado é essencial à administração da
justiça, consoante art. 133, da
Constituição Federal. Administração da justiça, e não apenas do direito, da
regra legal, posta e positivada. Seu papel perante a sociedade é muito maior do
que isso, competindo-lhe velar pelas garantias constitucionais e pelo estado
democrático de direito, em busca de uma sociedade igualitária, livre e
solidária. Entre o juiz e o advogado não há hierarquia de
qualquer ordem ou natureza, exatamente para que esses postulados
constitucionais sejam alcançados pela nossa sociedade. Nesse sentido, pois, o advogado tem que ser um ativo participante do processo de criação do direito e de realização da justiça. Limitar-se à mera utilização das regras que foram postas pelo legislador seria apequenar sua nobre e constitucional função. |
20. APONTAMENTOS FINAIS
Muitas são
as possibilidades do xadrez na seara educacional. Não bastassem as similitudes
com o Processo Civil, também são de se considerar as várias possibilidades no
ensino da geometria, com a ajuda dos ângulos, triângulos, quadrados e
retângulos que se formam nos vários segmentos do tabuleiro; também na área da
matemática, ao permitir a feitura de cálculos apenas cerebrais, sem o uso de
lápis ou papel, bem como raciocínio lógico para inúmeras variantes e linhas
possíveis para continuidade de partidas.
Alguns educadores têm usado o
xadrez como alternativa de educação física, em que os contendores fazem seus
lances e correm até um relógio, equidistante do tabuleiro, para acionar o
relógio para o adversário – e depois voltam correndo para efetuar novo lance.
Transpiração e raciocínio em simbiose. Professores da área de Administração
relatam a possibilidade de desenvolver nos alunos a capacidade de planejamento
das atividades, condição importante para o bom administrador.
Conheço diversos relatos de
pessoas com dificuldades de concentração, algumas com diagnóstico de TDAH, que
obtiveram sensíveis melhoras através das atividades enxadrísticas, em que a
concentração e a atenção no fazimento dos lances são de fundamental importância
para o sucesso no jogo. E, claro, com reflexos positivos no resultado dos
estudos formais, tanto nas graduações quanto no âmbito do ensino fundamental e
médio.
Não conheço absolutamente nada de
psicologia e, portanto, não posso me aventurar nesta área – mas já pude
perceber manifestação de possível ansiedade em jogadores que lançam as peças
além dos limites do quadrado a elas designadas, como que querendo rapidamente
desenvolver as peças; em outras pessoas, vi retraimento excessivo no movimento
das peças, colocando-as delicada e vagarosamente aquém da casa de destino, como
se a pedir licença para efetuar o lance.
Enfim, dentre tantas possiblidades,
procurei destacar, nestas singelas páginas, os auxílios que o xadrez pode
emprestar para o conhecimento e para a prática do Processo Civil – duas
intrincadas ciências que podem, de alguma maneira, se complementarem
mutuamente.
Ezio Frezza Filho é advogado inscrito na OAB/MG e Professor de Direito
Processual Civil da PUC Minas, campus Poços de Caldas, desde fevereiro
de 2001. Mestre em Constituição e Processo, pela UNAERP, de Ribeirão Preto, e
doutorando em Ciências da Religião, pela PUC Minas. Foi advogado da Caixa
Econômica Federal, onde trabalhou por 22 anos, 14 dos quais como advogado de
carreira. É enxadrista e escritor diletante.
FIM
Nossa! Não jogo xadrez mas seu trabalho ficou magnífico, em vista da clareza com que fez suas colocações. Parabéns!!!!! Abraço.
ResponderExcluirObrigado, Marilene. É uma cartilha singela, apenas para servir de incentivo aos estudos. Um grande abraço para você.
ExcluirProf. Ezio. Ficou excelente a apresentação. Parabéns.
ResponderExcluirObrigado, Mateus. Espero que goste das atividades que serão desenvolvidas. Grande abraço e obrigado pela visita.
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