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Despretensiosos e singelos: é assim que vejo minhas crônicas e meus contos. As crônicas retratam pedaços da minha vida; ora são partes da ...

sexta-feira, 25 de abril de 2025

Crônica - 25 de abril

 

Das mesas em frente aos bares da Passarela do Álcool, em Porto Seguro, se avista um lindo mar esverdeado, em cujas águas calmas o olhar de quem o contempla navega livremente, até aos mais distantes limites que o imaginário pode alcançar. É um cenário perfeito para um gostoso fim de tarde de verão. O corpo queimado, com vestígios do sal das praias do Arraial D’Ajuda, a travessia de balsa pelo Buranhém. Um prato de lambretas ao molho vinagrete, uma cerveja gelada e a imaginação correndo solta, tudo na mais pura solidão em meio a hippies e descolados de todas as línguas.

No crepúsculo de 28 de fevereiro de 1986, surpreso, não pude pagar a conta do bar com cheque, pois, disse o proprietário, “não sei como vai ficar esse negócio de Plano Cruzado, de quantos zeros tem que cortar, essas coisas. Agora, pagamento só em dinheiro, porque o cruzeiro ainda está valendo”. Foi então que soube da novidade, o tal negócio do Cruzado. O resto é história: congelamento e tabelamento de preços, desabastecimento dos mercados, caça aos bois no pasto e outras insanidades mais. E o Sarney parando na entrada de Lençóis, para saudar a terra do Orígenes.

Paga a conta, nota sobre nota, fiquei ali mais um tempo, esperando o Jornal Nacional para saber o que tinha acontecido com o nosso país. Admirando o horizonte que se descortinava para o infinito. Logo ali depois da amurada, o longo e vistoso cordão, formado pelos recifes de corais, é brevemente interrompido como que de propósito, a permitir a passagem das escunas e outras pequenas embarcações. Um verdadeiro porto seguro.

Enquanto o noticioso global não vinha, meus pensamentos vagaram pelas terras lusitanas. Lembrei das léguas a nos separar, tanto mar, tanto mar; e também que é preciso, pá, navegar, navegar... Pelas narinas me entraram a inebriante maresia e um cheirinho de alecrim; egoísta, almejava um velho cravo para mim.

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Na versão original, Tanto Mar era assim:

 

Sei que estás em festa, pá

Fico contente

E enquanto estou ausente

Guarda um cravo para mim

 

Eu queria estar na festa, pá

Com a tua gente

E colher pessoalmente alguma flor

No teu jardim.

 

Sei que há léguas a nos separar

Tanto mar, tanto mar

Sei também quanto é preciso, pá

Navegar, navegar

 

Lá faz primavera pá

Cá estou doente

Manda urgentemente algum cheirinho

De alecrim

 

É como foi gravada pelo Chico, em Portugal. Por aqui, onde o cravo ainda havia desembarcado, a censura militar vetou a letra, que foi reescrita tal como conhecemos.

2 comentários:

  1. Me recordo dos dois fatos históricos: Plano Cruzado e Revolução dos Cravos.

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