Os primeiros mugidos de gado eu ouvi quando menino, no Sítio do João Paccola, onde ia, todas as manhãs, buscar um litro de leite. Mugidos que me davam medo, me aterrorizavam: saia correndo, rapidamente. Não ficava para ver o boi, bastavam os mugidos. O gado tinha imponência e dignidade. Botava respeito, era reconhecido.
O boi está no
Acalanto, de Dorival Caymmi. Boi, boi da cara preta, pega essa criança que tem
medo de careta... Só eu velo por você, meu bem; dorme anjo, o boi pega neném. E
a criança dormia; sem sustos, mas respeitosa.
Maurício de
Nassau fez um boi voar pelos céus do Recife, quando o Brasil era Holandês e a
cidade se chamava Maurícia. Do que se aproveitou Chico Buarque para uma divertida
marchinha: Boi voador não pode! Qual é a do boi que voa? Boi não pode voar à
toa.
Boi e vaca. O
Boi Veludo, de Tião Carreiro e Pardinho, é um boi valente, indomável, com lombo
liso igual sabão, derruba o peão no chão! Vaca Estrela e Boi Fubá, de Pena
Branca e Xavantinho, formaram uma dupla inseparável:- foram companheiros até o cruel
destino.
Uma vaca
parruda ilustrou a capa de Atom Heart Mother, de Pink Floyd, disco onde tem o
melhor do rock progressivo. Uma vaca de divinas tetas, como a Vaca Profana,
quero seu leite todo em minha alma, cantada por Gal Costa.
Mugido bonito
tem em Vaqueiro Prevenido, sucesso na voz maviosa de Nilo Amaro e seus Cantores
de Ébano. Impagável: Múúúúúúú.... Eh! Boi, anda ligeiro, tá caindo uma garoa,
anoitecendo não quero ver gado à toa. Era um gado mais submisso. Vamos, anda
ligeiro.
Em Disparada,
Vandré e Theo de Barros foram impiedosos: prepare o seu coração para as coisas
que eu vou contar... E contaram! Impiedoso também foi Zé Ramalho, em Admirável
Gado Novo: lá fora faz um tempo confortável, a vigilância cuida do normal. Sem
tugir nem mugir.
Foi uma vaca
que, insolente, subiu os degraus do Palácio do Governo, no romance de Gabriel
Garcia Marques, O Outono do Patriarca. Vagou pelos salões vazios, revirou os
cômodos, comeu papéis e deixou seus estrumes pelo chão sem que ninguém lhe
desse importância. O Patriarca já não podia mais nada.
Nastassja
Kinski teve seu belo traseiro placidamente lambido por uma vaca, nas cenas
finais do comovente Tess, de Roman Polanski.
Parabéns mais uma vez Professor Ézio! Muito bom como sempre.
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