Reggy era
frequentador assíduo de um casarão, aos fins de semana. Todos os sábados e
domingos, sem falta. Chegava sempre à tardinha, para jogar xadrez com um grupo
restrito de amigos. Levava o seu próprio jogo de peças, artisticamente
entalhadas em marfim e em pau-roxo, com peso na base e de perfeito equilíbrio.
Peças bem proporcionadas e acondicionadas no veludo de uma bonita caixa de
tampo marchetado e encerado, que carregava sempre consigo.
Reggy fazia
parte de um grupo fechado, quase que secreto, dez ou doze pessoas da alta
sociedade, que usavam roupas de fino talho e engomadas; paletós e calças de
risca de giz, camisas imaculadamente brancas, de mangas compridas e com
abotoaduras douradas. Ninguém dentre eles dispensava o chapéu preto, vistoso,
nem mesmo durante as partidas.
Além do culto
ao xadrez e da elegância no vestir, Reggy e seus amigos tinham em comum o
hábito dos cachimbos, de diversos modelos, que envolviam o salão de jogos em
uma densa e aromática cortina de fumaça. Eram poucos amigos, mais parecendo uma
confraria enxadrística; entre si, guardavam lealdade e discrição, seja no jogo
propriamente dito, seja em relação às particularidades e costumes de cada um.
Os jogos se
davam num casarão imponente, guarnecido de espessos e bem conservados móveis de
madeira, com mesas nas quais se achavam incrustados os escaques, alternados de
madrepérola e de ônix brilhante. O casarão era (quer dizer, ainda é, pois que
se conserva intacto até hoje) rodeado de amplo e arborizado quintal: um jardim
planejado, com variedades paisagísticas e com alamedas em diagonais cortando o
terreno, forradas com pedras portuguesas, ao estilo da Praça do Rossio, de
Lisboa (estilo que, depois, veio a ser adotado no calçadão de Copacabana, no
Rio de Janeiro). São alamedas graciosamente traçadas por entre as altas
palmeiras imperiais que vicejam ao lado das copas frondosas do arvoredo. Um terreno
imenso, enfim, que ocupa um quarteirão inteiro.
Reggy, era
solteiro e bem afeiçoado, morava com os pais. Tinha duas paixões na vida: o
xadrez, que jogava com maestria e só era derrotado em ocasiões especiais, e a atraente
Apolônia, sua amante, a quem fazia ardorosas visitas, com impressionante
assiduidade, nos fins de semana. Todos os sábados e domingos, sem falta. Mal
chegava ao casarão, jogava uma ou duas partidas, depois saía dali, furtivamente
e com a complacência dos amigos leais. Saía pelo portão dos fundos,
aproveitando o lusco-fusco, disfarçado em roupas simples, que para esse fim
deixava em uma cômoda, ao lado das mesas de jogos. Roupas que não eram do seu
uso diário e nem do seu estilo. Afundava na cabeça um chapéu tosco até quase os
olhos, para não ser reconhecido, e partia ao encontro da amada, pelo portão dos
fundos.
Bela abertura. Aguardo o meio jogo.
ResponderExcluirMeio de Jogo interessante, está vindo. Grande abraço, Tadeu, mestre dos mestres.
ExcluirÉ um privilégio poder curtir essas crônicas e, em especial, nesses tempos de quarentena. Sentimentos compartilhados que sensibilizam e que ajudam a nos tornarmos seres humanos melhores. O que me faz lembrar do "Amor nos tempos do cólera", lido faz uns 40 anos, e que me aflora à memória agora.
ResponderExcluirObrigado, Ezio.
Obrigado, Francisco Schwab, um grande abraço.
ExcluirCaríssimo Francisco Schwab, requintado e experiente enxadrista. Não me esqueço das suas aulas, através dos interessantes problemas que propõe. Grande abraço, caríssimo.
ResponderExcluirVocê nos transporta, com arte, a ambientes e comportamentos, colocando-nos frente a frente com as personagens de suas crônicas.
ResponderExcluirVou continuar meu passeio rss. Abraço.
Obrigado, Marilene. Saudades de você. Abraços e muita saúde.
Excluir