O golpe das esmeraldas em Goiás
No começo do ano de 1977, uma notícia
caiu como uma verdadeira bomba na cidade: nossos dois jornais repetiram a
mesmíssima manchete, em edição extraordinária:
CAPATAZ É PRESO EM GOYÁS VELHO
Saiba tudo sobre o golpe das esmeraldas
O texto, também idêntico nos dois
jornais, dizia:
O
antigo e conhecido capataz, empregado do falecido Coronel Assis e se achava
desaparecido desde a morte do ilustre fazendeiro, foi preso na manhã de ontem
na antiga capital goiana, localizada no oeste do estado. O motivo da prisão,
conforme informaram as autoridades policiais ouvidas pela nossa redação, está
relacionado com as esmeraldas que foram roubadas no Casarão do Conde, por
ocasião da morte do Coronel Assis.
Após
denúncias apresentadas por um fazendeiro, a polícia descobriu que o capataz
havia se endividado com a compra de terras e de gado, naquela região; forçado
pelos credores, tentou saldar alguns compromissos através de um inusitado golpe:
ofereceu, em pagamento, vários lotes de esmeraldas brutas que, descobriu-se
depois, eram falsas.
As
investigações, segundo as mesmas autoridades, vinham se desenvolvendo em sigilo
há cerca de dois meses; desconfiado da quantidade de pedras preciosas em mãos
do capataz, um dos credores acionou a polícia goiana. Ontem, de posse de laudos
oficiais que comprovaram o golpe, foi cumprido um mandado de prisão nas terras
do capataz, que não reagiu à prisão.
Acreditamos
que esse fato poderá trazer reflexos para o caso, de grande repercussão e que
aqui entre nós ficou conhecido como “O crime do casarão”. No início de 1970, o Coronel
foi morto dentro de sua própria casa; o autor do crime, que até hoje não foi
descoberto, também roubou uma quantidade de pedras preciosas que eram do morto
– e tudo indica que as pedras preciosas roubadas aqui na cidade sejam
exatamente as mesmas que agora levaram à prisão do capataz.
A
esse propósito, aliás, lembramos aos nossos leitores que, na época do crime em
nossa cidade, o administrador, foi apontado como um dos suspeitos pela polícia;
todavia, apenas o caseiro do Coronel é que foi levado a júri popular naquele processo
e absolvido, em sessão movimentada, pela unanimidade de votos do tribunal de
júri.
Estava em minha casa quando li esta
notícia. E mal tinha acabado de ler estas linhas quando o telefone tocou. Era
meu amigo Guilherme:
- Já leu a novidade, meu caro? Perguntou-me
ele, sem se referir expressamente ao artigo do jornal.
- Sim, acabo de ler. Mas que coisa!
Inacreditável, não é mesmo, Guilherme?
- Pois é, rapaz. Que coisa louca é
essa? Me espera que eu vou dar uma passada por aí na sua casa, está bem?
Conversamos longamente sobre a
novidade estampada nos jornais.
- Essa notícia muda tudo, Guilherme.
Bem, claro, se for verdadeira, não é?
- Mas ela é verdadeira; confirmamos
agora cedo com a polícia de Goiás: o capataz está preso porque tentou passar
esmeraldas falsas no mercado goiano. Parece inacreditável isso, mas é a pura
verdade.
- Ora, então ele é o ladrão, só pode
ser. Quer dizer, mais do que isso: ele é o assassino do Coronel, concorda?
Guilherme estava pensativo. Mas
concordou comigo.
- Eu vim para cá pensando nisso
também. Mas, então, porque ele deixaria a própria camisa no local do crime. Por
que ele se denunciaria? Será que ele queria ser preso e nós não tivemos a
capacidade de compreender isso?
E continuou:
- E quanto ao horário do crime? Se o
relógio quebrado marcava o horário correto da morte, e tudo indica que sim, como
é que o capataz poderia ter viajado antes do crime? Tem algo de muito errado
nisso tudo, meu caro.
- Ou, então – disse eu – ele roubou as
pedras e depois o caseiro matou, como já foi cogitado anteriormente. Você se lembra
dessa hipótese, Guilherme?
- Sim, claro que me lembro. Essa era
uma das linhas que o delegado não quis levar em consideração.
Quer dizer, a novidade da prisão esclareceria
apenas parte do problema.
- Bem, temos que aguardar a vinda dele
para cá. Primeiro ele vai ter que responder pelo crime que cometeu lá; e aqui
ele vai ter que explicar como conseguiu as esmeraldas. Nós vamos tentar a
transferência dele, quem sabe a gente consegue isso. Vamos formalizar um
pedido, no mais tardar amanhã.
- Ou então – eu acrescentei – vamos
até lá. Vamos ouvir ele lá mesmo. Deve ser uma bela viagem.
Animado com a sugestão, Guilherme foi
incisivo:
- É, pode ser. Vamos?
Aproveitamos o encontro para colocar
as conversas em dia. Afinal, já há algum tempo que nossas tarefas impediam um
bate-papo mais descontraído.
Foi nessa oportunidade que eu o
lembrei de uma explicação que ele me devia, desde aquele domingo em que nossa
reunião foi interrompida pela notícia da morte do Coronel:
- Naquele dia você ia me falar sobre
moedas com boné, você se lembra?
- Ah! Sim, meu caro, me lembro. Essas
moedas também são peças interessantes para coleção. Nelas, o que ocorre é um
defeito de fabricação que deixa a cunhagem deslocada no disco de metal. Quer
dizer, a prensagem não coincide com o disco; uma parte do disco fica lisa, sem
desenho algum.
- Eu nunca vi isso.
- Sim, mas esse defeito existe: a
sobra no disco tem a forma de um boné, como que cobrindo a moeda.
- Legal, Guilherme.
Esse é mais um detalhe que eu tenho que observar – eu disse, finalizando a
conversa.
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